Os Airforce são uma banda profundamente enraizada na New Wave of British Heavy Metal (NWOBHM), com membros que testemunharam e ajudaram a moldar essa era dourada do metal. Com Doug Sampson (ex-Iron Maiden) na bateria e Chop Pitman na guitarra, a banda manteve-se fiel às suas origens, lançando álbuns que captam a essência do heavy metal clássico.
Agora, com Acts of Madness, lançado recentemente, os Airforce apresentam um regresso poderoso após cinco anos sem um novo álbum de estúdio. Entre desafios inesperados, como a pandemia e a trágica perda do seu produtor, a banda conseguiu transformar adversidade em criatividade, trazendo um trabalho que mistura o peso característico da NWOBHM com uma abordagem mais cinematográfica e atmosférica.
Nesta entrevista exclusiva com Lino, vocalista da banda, exploramos a sua entrada nos Airforce, a evolução da sonoridade do grupo, as inspirações por trás das letras e os desafios enfrentados durante a produção do novo álbum. Além disso, falamos sobre a receção dos fãs, a experiência de tocar ao vivo e o que o futuro reserva para esta banda que continua a honrar o espírito da NWOBHM.
M.I. - Antes de mais, como é que surgiu a oportunidade de entrares para a banda? Como conheceste os outros membros? Eras fã da banda?
Toda a situação surgiu quando a minha banda de tributo aos Iron Maiden em Portugal (Iron Beast) foi convidada para tocar no mítico bar “Cart & Horses” em Londres, bar esse onde os Iron Maiden deram o seu primeiro concerto.
Após o concerto, fui abordado pelo Chop Pitman, guitarrista dos Airforce, que me convidou para fazer uma audição para integrar os Airforce.
Passado algumas semanas regressei a Londres, fiz a audição e fui logo adicionado à banda, eles supostamente tinham mais candidatos, mas desmarcaram as audições.
Em relação à banda, apenas conhecia o baterista, Doug Sampson, porque como fã de Maiden, sabia que o mesmo havia tocado no primeiro álbum de Maiden, o “Soundhouse Tapes”.
M.I. - Sempre quiseste pertencer a uma banda deste género musical? Quais são as tuas referências/influências musicais?
Sim, sempre quis pertencer a uma banda de Heavy Metal, alias pertenci a algumas em Portugal, mas sem grande sucesso.
As minhas influências desde o início sempre foram os Iron Maiden e Queen, mas com o passar dos anos fui me convertendo ao Power Metal e ao Progressive Metal/Rock, mas a minha base sempre será o Heavy Metal clássico.
M.I. - A diferença de idades não foi importante na decisão de te juntares aos Airforce?
Sinceramente nunca pensei nisso, sabia que eles estavam todos na casa dos 60 anos, mas com isso também teriam mais experiência, pelo que aceitei o convite e não me arrependo.
M.I. - Acts of Madness marca o vosso primeiro álbum de estúdio em cinco anos e saiu há poucos dias. O que inspirou este disco e como é que a banda evoluiu desde Strike Hard?
Este álbum teve um parto difícil, entre a morte do nosso produtor e a perda das gravações devido a essa morte, tivemos de nos reagrupar outra vez e gravar muito do material perdido. Depois claro, sofremos a pandemia e ainda mais difícil se tornou.
Em termos de inspiração, da minha parte, houve mais liberdade para melodias vocais e escrita de letras, pelo que puxei a banda para fora da sua temática mais “bélica” para uma temática mais cinematográfica e de horror, a qual eles adoraram, pelo que no próximo álbum serei eu o letrista de todo o álbum.
M.I. - Como é que Acts of Madness se compara em termos de som e composição?
Em termos de som este álbum diferiu um pouco do anterior, pois tivemos um novo produtor que tinha uma visão e sensibilidade diferente, e segundo sei, exigiu bem mais dos músicos.
No meu caso, não exigiu muito pois gravei as minhas vozes em Portugal, no estúdio do Alex Vantrue, e só alterei algumas linhas vocais já na fase de pré-produção.
A composição foi praticamente a mesma, a banda cria a espinha dorsal da música, depois enviam-me para Portugal, crio ou canto a letra e debatemos métricas, melodias, cortes, e quando estamos satisfeitos a música fica completa.
M.I. - Qual foi a principal força motriz por trás dos temas e letras deste álbum? A escrita das letras é feita por algum membro em particular ou todos contribuem? A saúde mental parece ser um tema habitual
.
Não tínhamos nada em mente para as letras antes de começarmos a compor, todas as músicas são gravadas com letras “fictícias” apenas para termos a ideia da métrica, depois cada um escreve letras nas músicas de sua autoria ou com a qual sente mais ligação.
Em relação aos temas, poderá dizer-se que eu escrevo mais temáticas de sobrenatural e o resto dos músicos escreve sobre variados temas (Guerra, saúde mental, filmes etc…).
M.I. - Podes contar-nos sobre o processo de composição e gravação? Abordaram-no de forma diferente desta vez?
A única abordagem diferente foi mesmo as exigências e ideias do produtor, de resto trabalhamos da mesma maneira.
Normalmente, no processo de composição, quem traz a ideia tem a última palavra a dizer, mas normalmente o Chop Pitman ou o Tony Hatton enviam-me a música quase completa e eu tenho a liberdade para criar melodias e harmonias vocais e letras.
M.I. - Houve algum desafio ou avanço específico durante a produção de Acts of Madness?
Tirando a morte do nosso antigo produtor e o Covid, tudo correu normalmente.
Demoramos um pouco mais devido a tours com os British Lion e também com as Girlschool e Alcatrazz.
M.I. - O álbum está a ser descrito como um grande regresso. O que é que o torna especial no cenário atual do heavy metal?
Sinceramente, a única coisa especial é mesmo ser genuíno. Existem inúmeras bandas a tentar reproduzir o som da NWOBHM, sendo que para nós a composição nunca saiu dessa era, uma vez que 75% da banda tem mais de 65 anos.
M.I. - Jezz Coad ajudou a concluir o álbum após a perda das gravações originais. Como foi trabalhar com ele novamente depois de tantos anos?
A banda já conhecia o Jezz há muito tempo, tendo o mesmo trabalhado com a banda no álbum “Judgment day”. Em relação a mim, a única diferença é que ele dava mais atenção às harmonias de voz, exigindo nuances diferentes.
M.I. - Os singles Among the Shadows, Westworld e Cursed Moon mostram diferentes facetas do álbum. Como é que estas músicas refletem a direção geral de Acts of Madness?
A nossa escolha dessas músicas foi somente e apenas por serem as que achamos mais “fortes” para serem singles, no entanto elas também dão a conhecer uma roupagem mais “nova” que o Jezz quis colocar no som da banda.
M.I. - Acts of Madness é descrito como uma obra que aborda tanto as lutas quanto as vitórias. Há alguma faixa que representa esse espírito de forma especial?
Creio que as pessoas têm respondido bem à “Among The Shadows” e à “Westworld” o que polariza a nossa opinião, pois são músicas com temáticas bem opostas. No entanto acho que a regravação da música “Heroes” tem um significado especial, pois a banda sempre quis essa música com a minha voz.
M.I. - O videoclipe de Cursed Moon foi lançado recentemente e é um single poderoso. Podes contar-nos a história por trás dele? Qual foi a visão criativa? Essa música define o tom do restante do álbum?
A história é bem simples, escrevi a letra na perspetiva de uma pessoa amaldiçoada pela Licantropia, pois quando o Tony me enviou a música para criar as harmonias e letras, foi mesmo a primeira coisa que me veio à cabeça. A música soava a algo noturno, primal.
M.I. - Depois de tantos anos, e apesar dos anos de atividade, este é apenas o terceiro álbum da banda. Sabes porquê? O que é que ainda motiva os Airforce a compor e tocar?
O que aconteceu entre o início da banda em 1986, o seu fim, e em 2016 o seu renascimento, foi mesmo a vida pessoal dos músicos, algo que acontece à maior parte das bandas. No entanto, eles sempre quiseram voltar a tocar, e foi mesmo a pressão dos fãs de Iron Maiden que forçou a banda a iniciar atividades outra vez.
M.I. - Acts of Madness é dedicado a Pete Franklin. O que esperam que os ouvintes sintam ao ouvir este álbum em sua memória?
Bem, quem conheceu o Pete Franklin sabe bem que ele era uma pessoa íntegra, um músico excecional ( Dirty Deeds) e um fã de Airforce, e várias músicas do álbum foram gravadas com ele. Como ele deu várias ideias na direção da composição, não poderíamos deixar de lhe atribuir o valor por tudo o que fez pela banda.
M.I. - Este álbum tem o teu cunho pessoal? Há influências portuguesas presentes?
Este álbum tem mais letras e harmonias e ideias minhas que o anterior. Mas interessante que perguntas isso, pois o nosso futuro álbum em que já estamos a trabalhar, vai ser conceitual e criarei todo o conceito, pelo que existirão algumas partes da História de Portugal.
M.I. - Com o lançamento de Acts of Madness, vocês já estão confirmados no festival Harder Than Rock, na Croácia. Os fãs podem esperar uma tournée para promover o álbum? Há outros festivais ou países onde estão particularmente entusiasmados para tocar? Há planos para tocarem em Portugal em 2025?
Infelizmente para tocar em Portugal não, mas o nosso manager está focado em promover algumas tours este ano com outras bandas do nosso estilo.
M.I. - Recentemente tocaram na Movistar Arena, em Bogotá. Como foi a experiência de tocar para os fãs de metal sul-americanos e como é que eles reagiram ao novo material?
Foi espetacular. O público do Sul da América é realmente diferente, cerca de 10.000 pessoas sempre a apoiar. Tivemos boa reação, pois no final ficamos sem merch nenhum, esgotamos tudo.
M.I. - Qual é a vossa música favorita para tocar ao vivo, e porquê?
Band of Brothers, porque todos os fãs cantam a música em uníssono e torna-se uma experiência surreal.
M.I. - Para ti, como membro, qual foi o momento mais louco ou memorável que já tiveram em tournée?
Para mim, talvez as noites todas que passei a conversar com o Steve Harris dos Iron Maiden, sobre vários assuntos incluindo histórias antigas de Iron Maiden.
Fizemos 4 tours com os British Lion e após os concertos as duas bandas juntavam-se sempre no camarim a conversar e a beber, uma experiência que se vai repetir certamente.
M.I. - Os Airforce estão profundamente enraizados na NWOBHM, um movimento que teve uma influência duradoura no metal. Como veem a evolução do género e onde acham que a banda se encaixa no cenário atual?
O estilo teve algum ressurgimento há alguns anos, e louvo isso, mas ninguém consegue reproduzir um estilo melhor do que quem realmente o experienciou. Quando eles me enviam músicas fico sempre surpreendido pela sinceridade das mesmas.
M.I. - O que diferencia os Airforce de outras bandas da NWOBHM que ainda estão ativas hoje? Acham que estas bandas estão a fazer jus ao legado da NWOBHM?
Talvez o facto de não termos tocado muitos anos, o que nos da mais vitalidade agora que voltamos e temos menos responsabilidades extra banda. Eu sou o único que trabalha nesta banda, eles já estão todos reformados, por isso têm mais disponibilidade para tocar e fazer tours.
M.I. - A banda tem atraído diferentes gerações de fãs de metal. Notaram alguma mudança no público dos vossos concertos?
Em conversa com os outros membros da banda, eles confidenciaram que realmente notam que já existe mais diversidade de idades no público, o que os deixa muito felizes. Mas este som agradará sempre mais a quem realmente cresceu quando este estilo era maior.
M.I. - Se tivesses de descrever Acts of Madness em apenas três palavras, quais seriam?
Antigo, provação e orgulho.
M.I. - O que o futuro reserva para o Airforce além deste álbum? Já estão a pensar nos próximos passos?
Um novo álbum no horizonte e algumas propostas de tours com nomes bastante grandes dentro da cena.
M.I. - Muito obrigada pelo teu tempo e disponibilidade. Tens uma mensagem final para os leitores da Metal Imperium?
Se gostam de Heavy Metal da era NWOBHM, ouçam os Airforce e apoiem os músicos que após 40 anos ainda tocam por prazer. Obrigado pelo apoio.
For English version, click here
Ouvir Airforce no Spotify
Entrevista por Sónia Fonseca