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Entrevista aos Katla


Encharcados em tristeza e revestidos por uma atmosfera esmagadora, os Katla são uma força em ascensão na cena europeia do doom metal. Vindos da Dinamarca, a banda cria composições expansivas que combinam post-rock, sludge e doom progressivo numa experiência emocional e cinematográfica. O seu álbum de estreia pela Napalm Records, *Scandinavian Pain*, é uma jornada monolítica por temas como depressão, vergonha, ganância, culpa e o fim do mundo — tudo envolto em melodias assombrosas e uma sonoridade esmagadora.
Nesta entrevista exclusiva, os Katla falam sobre as inspirações por trás de “Scandinavian Pain”, as lutas pessoais e sociais que alimentam a sua música e os desafios de traduzir o seu som intricado para um ambiente ao vivo. Se gostas de doom que é tão introspetivo quanto colossal, esta é uma conversa que não vais querer perder.

M.I. - O nome Katla faz imediatamente lembrar o vulcão islandês, mas outras bandas também usam esse nome. O que vos atraiu a ele, apesar das associações existentes?  

Rasmus - Estamos bem cientes das outras bandas que usam esse nome. O nosso vem de um livro infantil sueco de Astrid Lindgren, “Os Irmãos Coração de Leão”. Há um vilão na história que controla um dragão chamado Katla com uma corneta encantada. E nomeámos a nossa banda em homenagem a esse dragão.


M.I. – “Scandinavian Pain” é a vossa estreia com a Napalm Records. Assinar com eles influenciou a criação do álbum?  

Rasmus - De modo algum. Já tínhamos criado “Scandinavian Pain” antes mesmo de sabermos que íamos assinar com a Napalm.


M.I. - Como surgiu o contrato? Enviaram demos para editoras ou a Napalm abordou-vos? 

Theis - Aconteceu através da nossa agência de booking, a Napalm Events. O nosso agente viu-nos atuar num festival na Dinamarca há cerca de dois anos. Ele gravou um vídeo de 13 segundos do nosso concerto e enviou-o para a Napalm Records, a dizer: "Vocês precisam de assinar com esta banda." E foi assim que o contrato aconteceu.


M.I. - O álbum explora temas como depressão, culpa e manipulação religiosa. Como é que uma música como “Taurus” se encaixa nessa narrativa e por que foi escolhida como o primeiro single?  

Theis - “Taurus” foi, na verdade, a primeira música que escrevemos juntos depois de eu entrar para a banda. Inicialmente, era para ser um single independente, apenas para mostrar que os Katla ainda estavam ativos. Mas depois de assinarmos com a Napalm, eles adoraram a música e insistiram que fosse o primeiro single. Não nos opusemos, mas foi a editora que tomou essa decisão. Gostamos da música, é pesada e apresenta novos aspetos dos Katla, funcionando bem como aperitivo para o que está por vir no novo álbum.


M.I. – “Taurus” tem uma atmosfera crua e melancólica, mas o videoclipe é humorístico e exagera estereótipos nórdicos — barbas, bebida, vida rural. O que inspirou esse contraste?  

Rasmus - Queríamos evitar o típico vídeo de metal escandinavo — floresta, corpse paint e tudo mais. Em vez disso, inspirei-me muito na banda americana Red Fang, que faz videoclipes divertidos e cativantes. Queríamos algo totalmente diferente do que as pessoas esperariam.


M.I. - E o que se passa com os carros estranhos no vídeo? 

Rasmus - São cabin scooters. Conseguimos um patrocínio para o vídeo. Chamámo-los de “Beelzewheels”, “Hell Rider” e “Paul Rudd” — porque adoramos estéticas satânicas e malévolas, mas também o Paul Rudd. Ele é engraçado e simpático, o que combina com o nosso lema: "Amor e Satanás."


M.I. - Como surgiu a participação do Ole, dos Afsky, em “Taurus”?  

Rasmus - Ele é um grande amigo meu e partilhamos o mesmo espaço de ensaio. Foi uma colaboração fácil, e achámos interessante incluir um vocalista de black metal numa faixa de doom metal.


M.I. - Acham que algumas pessoas podem interpretar mal o humor no vídeo de “Taurus” e ficar desiludidas?

Theis - Talvez, mas o público dinamarquês percebe imediatamente. O humor faz parte dos nossos concertos ao vivo, por isso o vídeo reflete quem somos em palco.


M.I. - Como foi o processo de gravação do álbum? Abordaram a produção de forma diferente em relação aos trabalhos anteriores?  

Theis - Sim. Tomámos muitas decisões-chave antes de entrar no estúdio, garantindo que as estruturas das músicas estivessem definidas para podermos focar-nos apenas na interpretação.


M.I. - O que vos inspirou a abordar temas como depressão, culpa e manipulação religiosa?  

Rasmus - Os Katla sempre foram críticos da religião organizada, mas desta vez aprofundámos como a religião pode reprimir sentimentos pessoais. O título “Scandinavian Pain” também reflete a culpa que muitos escandinavos sentem sobre as suas próprias dificuldades mentais, sabendo que há pessoas no mundo que sofrem muito mais, que há fome e morte. Estar numa parte privilegiada do mundo torna mais difícil lidar com essa consciência.


M.I. - O cão negro na capa do álbum é um símbolo forte, frequentemente associado à melancolia e maus presságios. O que inspirou essa imagem? 

Rasmus - O cão negro tem dois significados: no folclore inglês, é um presságio sinistro, e Winston Churchill usou-o como metáfora para a depressão. Achei que era um símbolo poderoso para “Scandinavian Pain”.


M.I. - O fotógrafo Nikolaj Bransholm contribuiu para os visuais do álbum. Como surgiu essa colaboração?  

Theis - Ele é nosso amigo e um fotógrafo muito talentoso. As fotos na igreja foram espontâneas — alguém que trabalhava lá convidou-nos a entrar. Correu tudo na perfeição.


M.I. - Que emoções esperam que os ouvintes sintam ao ouvir “Scandinavian Pain”?  

Rasmus - Não temos expetativas definidas. Cada pessoa interpreta à sua maneira. Mas se alguma letra sobre saúde mental ressoar com alguém, esperamos que essa pessoa procure ajuda.


M.I. - Aqui no sul da Europa, diz-se que os escandinavos são mais deprimidos devido à falta de luz solar. Acham que isso é mesmo verdade?  

Theis - Sim. Estatisticamente, é verdade. Há até um termo para isso, "depressão de inverno". A Dinamarca é considerada o país mais feliz do mundo, mas tem um dos maiores consumos de antidepressivos.


M.I. - Como descrevem “Scandinavian Pain” em três palavras?  

Theis - Pesado, melancólico e cru.


M.I. - Quando virão a Portugal? 

Theis - Esperamos que muito em breve! Tínhamos uma tour planeada para Espanha e Portugal, mas acabou por não se concretizar.


M.I. - Que mensagem gostariam de deixar para os vossos fãs?  

Theis - Sejam fiéis a vocês mesmos e não tenham medo de sentir. A dor faz parte da vida, mas pode ser transformada em algo belo. Obrigado por nos ouvirem, esperamos que este álbum vos toque de alguma forma.

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Entrevista por Sónia Fonseca