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Entrevista aos Sodom


Se regressarmos a 1992, o heavy metal teve alguns interessantes lançamentos nessa altura. Os Sodom, parte da infame liga Teutonic Thrash Metal, lançaram provavelmente o seu álbum mais experimental, combinando poderosos riffs de guitarra, rápidas batidas com a voz crua e áspera do Tom.
Tapping the Vein vê a sua luz 32 anos depois com uma edição de colecionador definitiva para os verdadeiros “sodomaníacs”. Um álbum marcado pela animosidade dos membros da banda, pela saída de Witchhunter, mas também por ser a primeira aparição de Andy Brings, com quem a Metal Imperium teve a oportunidade de conversar.
Não apenas uma homenagem ao ex-baterista, assim como um grito de guerra solicitado por todos os fãs que queriam ver o disco Tapping the Vein depois de tanto tempo, incluindo neste lançamento alguns arquivos interessantes.

M.I. - De todos os discos, qual o motivo em reeditar o álbum Tapping the Vein?

Basicamente, todos os outros álbuns dos Sodom foram reeditados, de uma forma ou de outra. Todos, até por exemplo o M-16 teve lançamento em box set, e tudo foi lançado em edição especial, mas o Tapping the Vein ainda não tinha sido lançado. O vinil original tem preços astronómicos online. Além disso, os fãs perguntavam sempre quando é que o álbum seria lançado ou se teria um segundo lançamento. Para os fãs, Tapping the Vein é um álbum clássico, como por exemplo o Agent Orange.
Como banda, não dá para planear ou antever isso. Os fãs decidem o que mais gostam e, obviamente, Tapping the Vein é um álbum importante para todos os “sodomaniacs”. A BMG entrou em contacto connosco e queria fazer uma reedição do álbum, mesmo sem a minha participação e a do Tom, mas seria melhor se participássemos. Possuo um enorme arquivo de fotos, vídeos e todas as recordações dos Sodom. O Tom e eu estávamos ansiosos para compilar isto tudo.
Tapping the Vein foi o meu primeiro álbum. Eu era muito jovem, ainda no liceu, quando entrei na banda. 32 anos depois, fazer isto novamente, parece que estou de volta com os Sodom, mas ao mesmo tempo não. Estou a trabalhar com Tom e os fãs estão muito contentes com o lançamento do álbum. Também estamos muito contentes, porque este não é apenas um bom álbum, mas também uma história muito emocional. Os antigos membros da banda já não se falam, mas o Tom e eu ainda nos damos bem. É definitivamente uma ótima coisa que finalmente esteja a acontecer para toda a gente.


M.I. - Em 1992, eras o novo guitarrista, mas a nível emocional e pessoal, como estava a banda após o quinto álbum?

Essa é uma pergunta muito boa. Entrei nos Sodom em novembro de 1991 e, claro, os Sodom já eram uma grande banda. Eu era um estudante no liceu e de repente estava numa banda profissional.
Fui contactado por um grupo de pessoas mais velhas e experientes do que eu, mas que de certa forma se distanciaram umas das outras. O Tom e o Chris já não eram melhores amigos. Quando o sucesso chega, os negócios tomam conta e nem sempre é diversão, cerveja e festas como antes. Começas a perceber a banda como um negócio, e é aí que as coisas começam a mudar. Foi quando eu vim para a banda. Eu fui o elo de ligação que manteve os Sodom unidos por mais um ano. Mesmo não sendo amigos, profissionalmente o Tom e Chris trabalhavam muito bem juntos. Eu fui o tipo certo na hora certa que chegou e queria muito aquilo. Eles ainda queriam provar que eram uma banda relevante de thrash metal, sem qualquer tipo de compromisso e sem seguir nenhuma tendência.
Emocionalmente, para mim foi uma acentuada curva de aprendizagem. Foi a minha primeira vez num estúdio, em tour, num autocarro com outros doze tipos. Adaptei-me muito rapidamente, mas em relação à higiene pública com outros homens não é a mesma coisa do que viver em casa dos pais.


M.I. - Podemos afirmar que depois de Agent Orange e Better Off Dead, este é o álbum experimental com loucos riffs e uma produção mais pesada?

Eu adoro o álbum Better Off Dead, especialmente porque foi o primeiro álbum dos Sodom que eu realmente ouvi.
Inicialmente, nunca fui fã da banda, mas Better Off Dead convenceu-me de que esta é realmente uma ótima banda. Por outro lado, este álbum foi bastante problemático para os fãs obstinados, porque não é rápido nem super brutal. Os fãs de Sodom, naquela época e até hoje, sempre desejaram coisas mais brutais. Talvez tenha sido uma decisão consciente voltar ao lado brutal da banda, mas posso dizer que simplesmente aconteceu.
Eu trouxe isso para cima da mesa; as verdadeiras guitarras do punk rock e as coisas reais. Não tínhamos um plano original, apenas adveio da inspiração. Além disso, eles queriam provar uma coisa: se Tapping the Vein fosse mais suave, precisávamos ir na direção acertada, para um lado mais brutal.


M.I. - Esta também foi a última produção com o Chris. Consideras que reeditar o álbum é uma homenagem ao Witchhunter e à sua memória?

Sem dúvida! É muito triste que o Chris tenha morrido há 16 anos e não esteja aqui para comemorar isto connosco. O final foi triste e não terminamos bem.
Este é ainda um tema difícil para eu falar abertamente. Agora que estamos mais velhos, aquele problema podia ter sido tratado de forma diferente, mas naquela época só tínhamos um martelo ou uma chave de fenda, e isso não é o suficiente para resolver o problema. Esta é uma homenagem ao Chris, eu fiz o remix, porque ele sempre foi uma parte integrante da história dos Sodom. Este é o seu último álbum como membro oficial e foi lançado em dezembro de 1992.
Foi um ano muito intenso, criamos este álbum muito interessante que as pessoas gostam até aos dias de hoje. Tenho muito orgulho de homenagear a memória do Witchhunter, pois também fiz parte dessa época.


M.I. - Para muitos, 1992 foi o ano de ouro do death metal. Temos Deicide – Legion; Cannibal Corpse – Tomb of the Mutilated; Bolt Thrower – The IV Crusade. Podemos dizer que Tapping the Vein poderia fazer parte desta listagem com um pouco de influências de death metal?

Poderíamos dizer isso, mas eu diria que não é verdade. Todos esses álbuns que mencionaste, eu nunca os ouvi. Eu sei que existem, mas nem eu, nem o Tom, nem mesmo o Chris ouvíamos death metal. Nunca fui um fã de death metal, nem sei nada sobre os Bolt Thrower. 
Naquela época eu ouvia Skid Row, Faith No More, Ugly Kid Joe e muito thrash metal. O Tom é mais velho do que eu, por isso eu tinha mais contacto com Agent Steel, Metal Church, Nasty Savage, Slayer, Anthrax, Overkill, Bad Brains, Septic Death, todo o tipo de coisas antes do death metal.
O único disco de death metal que possuo hoje em dia é Death – Scream Bloody Gore. Porém, quando este álbum foi lançado (1987), o termo death metal ainda não existia. Quanto às influências do death metal no Tapping the Vein, sinceramente não sei. Talvez seja porque o Tom canta num registo mais grave. Além disso, Tapping the Vein não pode ser um álbum de death metal, porque para death metal tens que afinar a guitarra e o baixo bem baixo, e o nosso álbum está numa afinação padrão.
Se as pessoas acreditam que este é o álbum de death metal dos Sodom, é ótimo. Acho que é o álbum azul dos Sodom, por causa da capa. Os Beatles têm um White Album; Metallica, um Black Album; o dos Sodom é um Blue Album.


M.I. - O álbum será lançado no dia 15 de novembro com LP triplo, CD duplo, um media book e uma cassete com um show ao vivo em Tóquio, em 1992. Definitivamente a verdadeira edição de colecionador!

Sim. Decidimos abordar isto com a mentalidade de que estamos a realizar isto apenas uma vez. Este deve ser o melhor, o último e único lançamento da versão definitiva.
Não planeamos fazer isto nos próximos 10 anos, a menos que haja uma grande procura a solicitar outro lançamento. Queríamos lançar a edição definitiva. Na verdade, revemos todos os nossos arquivos, foto após foto. Cheguei a trazer bolo, o Tom trouxe café e passamos horas intermináveis ​​a analisar fotos e vídeos.
Eu já tinha todas gravações ao vivo. Graças a Deus tínhamos a litografia original da capa. Também queríamos dar destaque à música. Não queríamos colocar um relógio souvenir dos Sodom ou uma caneca de café, apenas para tornar o disco mais caro. Os Sodom vêm da classe trabalhadora e queríamos que esta edição definitiva fosse acessível, embora o custo de vida de hoje tenha mudado muito. Isto é apenas a música, a história, as fotos e a banda. Mesmo que não tenhas dinheiro para comprá-lo, podes ouvi-lo no Spotify. A promotora perguntou-nos se queríamos manter este disco fora do Spotify e dissemos que não. Todos deveriam ter a oportunidade de ouvi-lo.


M.I. - O media book destaca os vossos melhores momentos do álbum. Tens algum mau momento que gostasses de partilhar?

Houve vários momentos, mas houve um momento que me matou: foi quando percebi que o Tom e o Chris já não eram amigos. 
Depois de dois meses na banda, um dia de manhã, fui para a nossa sala de ensaio e a porta estava aberta. O Tom e Chris já estavam lá dentro e ouvi-os a gritar e discutir um com o outro. Tentei ficar em silêncio o máximo que pude, porque fiquei bastante chocado.
Eu ouvia-os e, assim que a discussão acalmou, abri a porta e fingi que acabara de chegar. Tive que processar isto tudo primeiro e até conversei com o gerente mencionando que ouvi uma conversa e perguntei qual era o problema ali. Ele disse que a relação deles não é já não era a melhor. 
Houve alguns momentos na tour em que Chris estava a tocar que, para mim, estragaram o nosso desempenho em palco. Ainda hoje, o desempenho é o mais importante. Tens de deixar o teu ego de lado, os teus problemas no camarim, mas a tocar ao vivo tens que ser profissional. Claro, toda a gente comete erros, eu não sou perfeito, mas o Chris trouxe os seus problemas para o palco e pisou o risco. Eu era o tipo novo, mas também um punk e responsável por mim mesmo. Se estragas o concerto, eu vou falar contigo, e não vai ser uma conversa agradável. Viajamos pela Europa e Japão, no mesmo ano que terminei o liceu e, embora o bom supere o mau, tive de confrontá-lo.


M.I. - Vocês celebraram o vosso aniversário de 40 anos de carreira. Sem dúvida, a banda teve os seus altos e baixos. Qual é o ingrediente secreto para continuar a produzir incríveis discos?

O principal seria o Tom e sua voz. Ele é o capitão, mas o capitão depende de como a tripulação rema. Às vezes a tripulação encontra-se mais fraca, mas o barco avança sempre. 
A questão é que 42 anos após a fundação da banda, ainda estamos fortes, saudáveis ​​e com pujança e não vejo por que razão eles não podem continuar por mais 10 anos. Pela primeira vez vemos músicos de bandas de metal extremo a envelhecer. Isso não acontece com músicos de jazz, visto o metal exigir muito mais fisicamente. Os Slayer pararam por um motivo, o Tom Araya já não consegue fazer mais isto, mesmo que eles deem um concerto aqui e acolá.
Sodom, Kreator ou Destruction estão constantemente em tour. O Tom tem 61 anos, portanto o thrash metal está a envelhecer pela primeira vez junto com os seus protagonistas. Esperemos apenas que todos estejam em boa forma nos próximos 20 anos, para nos divertirmos mais. O principal fator é o vocalista e a sua voz. Se isso mudar, tudo mudará. Bom ou mau, o navio dos Sodom continuará a navegar.

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Entrevista por André Neves