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Entrevista aos Cradle of Filth


Em novembro, Portugal prepara-se para receber novamente os britânicos Cradle of Filth. Conhecidos mundialmente pelas suas performances energéticas e envolventes, e por combinarem talento musical com letras profundas e uma presença em palco de tirar o fôlego, a banda tem acumulado sucessos e tornou-se uma referência no underground. O concerto do dia 24 de novembro, no LAV em Lisboa, promete ser um espetáculo inesquecível, com produção de alta qualidade e uma seleção de temas que vai desde os clássicos até os mais recentes êxitos, garantindo agradar tanto aos fãs de longa data quanto aos novos admiradores. A expectativa é alta, e os bilhetes estão a vender-se rapidamente, comprovando a grande popularidade da banda no país. A Metal Imperium não podia deixar passar em branco a oportunidade de conversar com o Dani Filth sobre este evento. 

M.I. – Olá, Dani! Estás totalmente recuperado da digressão australiana?

Sim, acho que sim, mas ainda tenho padrões de sono irregulares.


M.I. - A banda tem estado muito ativa e o frenesim ao vivo vai continuar até ao final do ano. No próximo mês vão realizar um concerto especial old school e serão a atração principal do Damnation Festival. O que nos podes contar sobre isto? Significa que só vão tocar músicas antigas?

Certo, sim. Na verdade foi uma surpresa para nós, porque o promotor decidiu que era isso que queria e depois contou-nos. Tendo em conta que estaremos a fazer uma digressão de seis semanas pela Europa e que tínhamos uma setlist diferente na Austrália, significou que tivemos de aprender um monte de coisas novas, mas, sim, essencialmente significa material desde o primeiro álbum até ao “Nymphetamine”.


M.I. – Vocês virão a Portugal no dia 24 de Novembro com a “By Order of the Dragon Tour”. A banda ainda está a promover o último álbum “Existence is Futile”? Ou têm feito um set especial durante este tempo todo?

Não, temos tocado uma variedade de músicas do nosso catálogo. Tocamos três músicas de “Existence is futile”, principalmente na Austrália, uma vez que não íamos lá desde o lançamento do álbum. Tocámos “She is a fire” do álbum ao vivo, mas o resto do material era basicamente de “The Principal of evil made flesh” em diante.


M.I. - A setlist da digressão “By the order of the dragon” será diferente da setlist da digressão “Necromantic Fantasies” que estavam a fazer no início deste ano? O que vai mudar na setlist de uma digressão para outra?

Claro! Bem, não me consigo lembrar de imediato, para ser sincero, mas é uma setlist completamente diferente. Abrange toda a nossa carreira! Queremos manter os nossos fãs felizes e sabemos que temos muitos fãs em Portugal que estão lá desde o momento em que tocámos pela primeira vez em Penafiel. Foi incrível! Portanto, há material de todo o nosso catálogo.


M.I. - Atualmente, qual é a tua música favorita para tocar ao vivo? Porquê?

Penso que é “She is a fire”! Gosto muito desta música, gosto muito de tocá-la. Ainda não tocámos o nosso novo single que sai no dia 22, mas iremos tocá-lo em Portugal. Adoro a música, mas ainda não a ensaiei, para ser sincero. A única vez que realmente a canto é quando estou a ouvir o álbum e de resto foi quando a gravei.


M.I. - Há uma publicação nas redes sociais da banda com uma nova capa que diz 22 de outubro. Será este finalmente o tão aguardado single com Ed Sheeran?

Não, não, não! Isso acontecerá numa data não revelada…


M.I. - …falámos em maio do ano passado e disseste-me que a faixa seria lançada uns meses depois, mas já lá vai mais de um ano… Porquê o enorme atraso?

Sim, estávamos a fazer muitas digressões, o Ed lançou um álbum e o seu manager queria que atrasássemos o single durante algum tempo. Depois ele decidiu lançar dois álbuns no ano passado, um dos quais foi uma surpresa, por isso mexeu com tudo. Além disso, não queríamos lançar o single por conta própria para não ofuscar o nosso próximo álbum ou qualquer uma das digressões, por isso vamos lançá-lo numa data não revelada.


M.I. - A capa online é do single ou do novo álbum? Qual é o nome do single?

O single chama-se “Malignant Perfection”.


M.I. - Estar em digressão tem sido um obstáculo para vocês lançarem o novo álbum?

Fazermos muitas digressões pode ser um obstáculo não para lançar o disco, mas para gravá-lo, finalizá-lo e, uma vez que se atrasam as coisas, aí é preciso encaixar tudo numa determinada ordem. Não pode ser algo tipo “Oh, acabámos o álbum, vamos lançá-lo amanhã”. Tem de ser catalogado, tem de ir para a editora, a editora tem de o inserir na agenda de lançamento. Creio que o álbum será lançado no final de março, início de abril, e será precedido por três singles, um dos quais será lançado no dia 22 de outubro.


M.I. - O que nos podes contar sobre o novo álbum?

É muito difícil falar sobre o novo álbum. Digo que é difícil, porque, neste momento ainda falta algum tempo para ser lançado. Mas representa Cradle of Filth em 2024, é rápido, é pesado, é cativante, é tudo isso. Há tanta coisa a acontecer que é difícil descrevê-lo. Há muito que desisti de tentar descrever um novo álbum. As pessoas vão perceber a ideia dos três primeiros singles e depois poderão decidir-se quando o álbum for realmente lançado. É uma progressão para Cradle of Filth, é uma continuação de onde estávamos em “Existence is futile” com um aceno distinto aos registos anteriores, tem um toque de “Dusk”, de “Midian” e de tudo entre esses dois e depois.


M.I. - Portanto, é uma fasquia bastante elevada para os fãs mais velhos que provavelmente estão ansiosos para ouvi-lo!

Bem, não é “Dusk and her embrace”. Tem sentimento, tem vibração! Não se podem recriar álbuns antigos, porque foram passados ​​numa época específica, foram influenciados por coisas específicas que aconteceram em torno desse disco. Estávamos em 1996, era uma época diferente, um mundo diferente, uma mentalidade diferente, músicos diferentes. O que o torna tão distinto é que é um álbum que vale por si só. É como “Reign in blood”, é como “Power Slave”. Nunca replicaram “Power Slave”! Depois, os Maiden fizeram “Somewhere in Time”, que é um álbum distintamente diferente de “Power Slave”. “South of Heaven” foi um álbum distintamente diferente de “Reign in Blood”. Lembro-me de o Tom Araya dizer “Não esperem “Reign in blood 2”. Este é um novo álbum!”. Pessoalmente prefiro “Reign in Blood” mas é essa a minha preferência e as bandas gostam de se reinventar e, mesmo que não gostassem, é um produto do tempo, do temperamento, da situação, da influência… muitas coisas influenciam um álbum! Se tentássemos replicar um álbum, por exemplo, se voltássemos atrás e tentássemos fazer o “Cruelty and the Beast”, não sairia igual por todas as razões que referi e seria um pouco complicado. É como quando as pessoas tentam fazer black metal e usam os DarkThrone como ponto de referência. Quer dizer, algumas pessoas adoram, mas outras dizem “Isto não está a avançar a cena de forma alguma, é apenas uma homenagem”.


M.I. - A única coisa que se mantém igual é a tua escrita fabulosa. Como consegues escrever tantas faixas excelentes? O que te inspira?

Bem, mais uma vez, é influência externa. Sou um ávido leitor. Sou a única pessoa da banda que vive em Inglaterra neste momento. Temos um baixista escocês, dois membros que vivem na República Checa e dois membros que vivem na América. Temos uma crença comum, gostos muito semelhantes e a inspiração pode vir da natureza, música, filmografia, muitas emoções sinceras e baseiam-se no nosso lugar no mundo, nos nossos sistemas de crenças, nas nossas influências. Obviamente que tem um elemento muito gótico, porque somos todos grandes fãs da estética gótica. Sim, é sombrio porque essa é a natureza da banda, mas somos tão prolíficos como os Moonspell, por exemplo. Olha-se para o repertório deles e “Sin/Pecado” é muito diferente do “Wolfheart” ou de qualquer outro. Sempre progrediram... Quer dizer, fizeram o disco sinfónico sobre o terramoto bastante diferente do “The butterfly effect”, que foi baseado num romance. Sim, estão em constante evolução e a fazer grandes discos, sabes? Eram metal gótico a certa altura, depois endureceram, tentaram todas as coisas diferentes e o mesmo se aplica aos Cradle of Filth. Vemo-los como os nossos Irmãos Lusitanos, nossos Irmãos Lobos. Acho que os nossos caminhos têm uma trajetória semelhante ao longo dos anos e eles são provavelmente a banda com quem temos feito mais digressões ao longo dos anos, por isso pensei que era uma boa referência, já que és portuguesa. Somos irmãos deles!


M.I. - És mais experiente, mais velho e mais sábio e acho que as coisas são mais fáceis e, provavelmente, não ficas tão stressado!

Não diria que foi fácil escrever nenhum disco… Acho que é mais difícil hoje em dia, porque quando começámos éramos muito únicos em relação à nossa postura, ao nosso som. Obviamente que tínhamos elementos de várias outras bandas que vieram antes de nós, mas agora muitas pessoas seguiram os nossos passos, existem consideravelmente mais géneros diferentes... Nem sei quantos géneros existem agora! Há tanta coisa, especialmente depois da pandemia, quando todos perceberam “sim, podemos continuar a fazer o nosso trabalho agora” e, de repente, tinhas toda esta enorme quantidade de discos que foram escritos durante o tempo de isolamento e das pessoas ansiosas por voltar ao trabalho. Também é muito difícil agora porque este é o álbum 14, isto sem contar com dois EPS, discos ao vivo, best of, material bónus. Compreendemos o nosso próprio caminho e seguimo-lo mas, obviamente, tendo isso em mente, também temos um critério que está na essência de como fazemos a nossa música, não iríamos lançar de repente uma secção de reggae muito profunda, simplesmente não está na nossa natureza. Temos muitos elementos, temos heavy metal tradicional, temos banda sonora, temos música clássica, death, black, grind, percebes? Os Cradle sempre tiveram vários estilos musicais diferentes e tornámo-nos um híbrido ou quimera desses vários atributos musicais, mas, no fundo, os nossos fãs esperam um disco dos Cradle of Filth. Esperam experimentação, sim, mas não esperam tanto que seja incompreensível e que digam “Oh, não acredito que isto seja Cradle of Filth! O que estão a fazer?". Portanto, existem parâmetros… embora sigamos apenas os nossos próprios passos, também temos de estar de olho não só no passado, mas também nos nossos fãs.


M.I. - Talvez seja por isso que a diferença entre álbuns está a aumentar lentamente?! Costumava ser dois anos.

Bem, isto é porque a pandemia atrapalhou e atrasou um álbum em três anos e meio e nós decidimos lançar uma versão remix de “Cruelty and the Beast” que deu muito trabalho e depois um disco ao vivo, um disco duplo ao vivo com duas faixas novas e depois houve outros pequenos projetos pelo caminho, como colaborações com a música do Ed Sheeran. Começámos a gravar este novo álbum em junho de 2023, mas passámos diretamente de uma parte da gravação para os festivais de verão, depois fizemos as nossas férias anuais de duas semanas, porque as pessoas têm família e é uma forma de descomprimir e recarregar baterias, e depois andamos em tournée durante oito semanas, depois passamos mais algumas semanas a gravar, depois o nosso produtor teve um bebé, veio o Natal, depois gravámos durante mais seis semanas, depois fomos em digressão durante um mês, e foi isto… aconteceram coisas!! O próximo disco sairá muito mais rápido agora que temos uma formação estável... a ficar ainda mais estável agora que a Zoe, a nossa teclista, se vai casar com o nosso guitarrista. Temos um novo, digo, novo management, mas já os temos há cerca de cinco anos, mas chegámos ao ponto em que está tudo muito bem oleado, temos muitas pessoas boas a trabalhar para nós, estamos um bocadinho mais maduros, por isso chegámos ao ponto, como banda, em que podemos escolher o que queremos fazer e não temos necessariamente de fazer todas as digressões que nos são propostas.


M.I. - Que personagem te inspirou desta vez? É um álbum conceitual?

Não! Quer dizer, tem um conceito vago como a maioria dos nossos álbuns, o “Midian” é um deles, mas as pessoas também o consideram como um disco conceitual. Conceitual, sim, em certo aspeto, mas não cronologicamente, como “Cruelty”, “Darkly Darkly”, “Godspeed” ou “Damnation”, isto não quer dizer que não o façamos no futuro, mas, no presente, estamos bastante confortáveis ​​a escrever álbuns que não são assim tão complicados. Estamos a concentrarmo-nos em escrever muitas músicas cativantes e, quando digo cativantes, não significa necessariamente que sejam alegres, são pesadas, muito rápidas, algumas delas muito complexas, outras não, algumas são mais simplistas, mas com esta nova formação temo-nos concentrado em escrever as melhores músicas que conseguirmos. Quando se escreve um álbum conceitual, ficamos um pouco presos no conceito porque tudo tem de encaixar no seu lugar, é como uma história com capítulos e, às vezes, é difícil tornar a história credível e compreensível sem a complicar. Quando fazes discos conceituais completos, toda a gente espera que faças outro, tal como o King Diamond.


M.I. - Vocês são perfeccionistas e querem que cada álbum seja perfeito, mas como conseguem isso se não param um minuto? Como é possível escrever um álbum com uma agenda tão preenchida?

Depende. Normalmente podemos ter algumas ideias para onde queremos que a música vá, mas, geralmente, não escrevo as letras até estarmos satisfeitos com a estrutura da música. É assim que eu faço, é mais fácil para mim, é mais fácil para os músicos, mas pode funcionar ao contrário. Se conseguirmos duas ou três músicas e começarmos a dar um tema e uma cor ao álbum, posso revisitar as músicas e dizer “malta, quero mudar isto, isto e isto” e este tipo de experimentação estende-se até ao estúdio. Podemos estar em estúdio e mudar algumas músicas que escrevemos como gospel nos últimos 12 meses. Todo o processo é para tornar as coisas cada vez melhores e demoramos bastante tempo no estúdio, porque queremos procurar a perfeição, queremos sair de lá felizes. Com a mistura acontece o mesmo… vais ter uma mistura padrão, vais embora, vais viver com isso, voltas e dizes “Tomei notas! Isto precisa de mudar e isto também!” e o produtor diz tipo “sabem que mais?! Quero limpar um pouco esta guitarra! Quero rolar isto, alterar alguns balances, isto é conflituoso com isto, precisamos de retirar algumas keys, precisamos de mais keys aqui”! É um processo complicado e que, provavelmente, pode ser feito pela inteligência artificial em cinco minutos, mas somos músicos reais, pessoas reais com aspirações e ideias reais, queremos escrever um bom álbum, não apenas algo que é feito à toa, gastamos tempo nisso, é algo nutrido...


M.I. - A IA assusta-te de alguma forma?

Muito! Apavora-me! Um amigo meu é programador informático, de topo, escreve código para jogos de computador e mostrou-me um programa onde se pode fazer uma música em cinco minutos, dizendo que tipo de estilo se quer, que tipo de tema, que tipo de letra, como é a banda e isto não é só com a música, isto é válido para tudo na vida, está a substituir as artes muito rapidamente. As pessoas podem passar um ano a fazer uma pintura a óleo e a IA pode fazê-lo literalmente em poucos minutos, mas não tem alma, sabes?! É regurgitação, porque, essencialmente, tudo o que faz é pesquisar na net e pegar em partes minúsculas de muitas coisas, como código, e recriar depois...


M.I. - Bem, Dani, muito obrigado pelo teu tempo! Queres deixar uma mensagem final aos fãs que vão estar presentes no concerto em Lisboa?

Vai ser um concerto incrível, é sempre! Temos um grande cartaz, muito diversificado, muito teatral, muito cinematográfico. Temos um grande espetáculo, grande presença em palco, grande equipa, grandes luzes, grande set list! Não tocámos em Portugal tanto quanto queríamos! Creio que das últimas vezes que tocámos aí não foi em salas, fizemos festivais. Lisboa ocupa um lugar que nos é querido, pois foi a casa do segundo espetáculo que tocámos em Portugal. Nós fechámos ou fecharam a loja da Virgin Music, que ficava na praça da cidade ou onde quer que fosse, há anos, para que pudéssemos fazer uma sessão de autógrafos lá, passámos lá algum tempo a comer, a divertir-nos nas férias e ficamos com os Moonspell. Quer dizer, Lisboa é um lugar profundamente importante para nós e é um lugar onde não estivemos o suficiente, por isso torna-o ainda mais especial! Claro, é uma longa viagem, não vamos de avião, vamos no autocarro da digressão, por isso torna tudo ainda mais importante, é um daqueles concertos em que se pensa “Pah! Lisboa é daqui a alguns dias” e fica-se muito entusiasmado com isso. Sabemos que o concerto vai correr bem, os bilhetes estão quase esgotados, por isso estamos ansiosos por voltar, tocar para os nossos fãs, encontrar amigos e divertirmo-nos muito!


M.I. - E também podiam tocar no Porto!!

Podíamos, mas só tocamos onde o nosso agente faz reserva e se ele disse que, desta vez, não podíamos ir ao Porto, que os locais não estavam disponíveis, é nisso que temos de acreditar, porque obviamente ele quer ganhar dinheiro e quer fazer concertos onde houver disponibilidade. Se não tocamos no Porto, haverá uma razão para isso, mas também deixa a oportunidade de voltar ao Porto e fazer um concerto, talvez no próximo ano!

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Entrevista por Sónia Fonseca