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Reportagem: Evil Live 2024 - Dia 1 @ MEO Arena, Lisboa - 29.06.2024



Nos últimos dois dias de junho decorreu mais uma edição do festival Evil Live, na MEO Arena, a maior sala de espetáculos portuguesa. É de louvar que os fãs de metal e do rock mais pesado continuem a ter festivais desta envergadura. O primeiro dia desta edição ficou marcado por excelentes concertos das duas bandas mais acima no cartaz e por não ter tido imenso público, visto que muitas pessoas compraram apenas o bilhete diário para o segundo dia do festival, dia esse que teve casa cheia. No entanto, os fãs de Machine Head e de Slayer (Kerry King) que compareceram neste dia não se importaram com a sala não estar cheia e seguramente não saíram do recinto com as suas expectativas defraudadas.

O dia começou com o concerto dos nacionais Men Eater, um dos nomes mais proeminentes do sludge/stoner nacional, cuja carreira ficou em stand by durante mais de meia década, para depois regressarem no final de 2023 com o seu álbum homónimo. Esse novo trabalho serviu como pano de fundo para esta curta atuação, que recebeu os primeiros festivaleiros, ainda não presentes em grande número no recinto. "Multitude", um dos temas fortes do mais recente disco, iniciou bem este espetáculo de apenas quatro músicas, que não obteve grandes reações por parte dos presentes. A música da banda também apela mais à contemplação e apreciação do que a muito espalhafato exterior, resultando melhor num contexto mais intimista. Mike Ghost agradeceu no final a todos os que compareceram mais cedo.

A segunda banda do dia foram os japoneses Jiluka, que se autointitula de "electro gothic metal", mas cuja amalgama sonora se aproxima mais de um metalcore eletrónico. A sua sonoridade moderna agradou aparentemente a algum do público mais jovem que se encontrava presente, como demonstrado por alguns tímidos mosh pits durante esta performance de cinco músicas. Pela primeira vez em Portugal, este quarteto foi competente na sua proposta musical, que até tem alguma unicidade dentro da caixa estilística onde se encontra, mas que terá deixado algo indiferente a maioria dos presentes.

A acentuar ainda mais o ecletismo sonoro característico das edições do Evil Live, os festivaleiros tiveram direito a uma performance dos bem mais conhecidos Wolfmother, com o seu hard rock inspirado nos anos 60 e 70, com clara influência dos Led Zeppelin. Houve música para todos os gostos no Evil Live, e quando assim é, torna-se difícil agradar a gregos e a troianos, mas a performance enérgica deste power trio australiano contagiou e entreteve muitos dos presentes. Puro rock, sem artifícios nem pretensões de originalidade, foi o que os Wolfmother nos ofereceram, com os pontos altos a ficarem guardados para o final, devido a temas como "Victorious" e "Joker & the Thief".

Os Katatonia entraram em palco para dar início ao concerto mas voltaram a sair, retomando o espetáculo 15 minutos depois, devido a problemas técnicos. Longe de serem virgens a nível de atuações em concertos e festivais em Portugal e detentores de uma boa base de seguidores por cá, esta passagem não foi a melhor demonstração do seu peso melancólico. Tal deveu-se a diversos fatores: por não estarem mais acima no cartaz, logo não terem tido tempo para tocar mais temas; devido à qualidade do som não estar muito boa neste concerto; a escolha ba banda em basear praticamente metade da atuação em temas novos - quatro temas em nove -  ficando a faltar clássicos como "Teargas", "Evidence" ou "Soil's Song", que ajudariam a solidificar a boa prestação que tiveram. Relativamente a músicas emblemáticas, tocaram algumas como "My Twin", que Jonas Renkse afirmou ser o maior êxito da banda até à data, permitindo ao público cantar um pouco do refrão. As densas "Leaders" e "July" foram outros dos destaques do concerto, sendo que a segunda teve honras de encerramento da atuação.

Machine Head era claramente a banda que tinha mais fãs presentes no primeiro dia do festival e o entusiasmo por voltarem a ver o grupo norte-americano era evidente. Antes da entrada em palco do coletivo liderado por Robb Flynn, muitos dos espectadores já gritavam "Machine Fucking Head". A paixão fervorosa do público português pelos Machine Head foi demonstrada do princípio ao fim, ao responder com empenho a todas as solicitações de Robb Flynn - que continua a ser um animal de palco - um frontman que sabe como ninguém incentivar uma plateia. A receptividade foi tão grande a todos os temas tocados pelo quarteto que os fãs quase esqueceram as ausências de temas obrigatórios como "Old" ou "Aesthetics of Hate". Até um tema menos consensual - mas que funciona bem ao vivo - como o single "Is There Anybody Out There?", foi recebido de modo efusivo pelo público. Do último álbum, tocaram apenas uma poderosa "Choke on the Ashes of Your Hate" e a orelhuda "No Gods, No Masters". De resto, o que aconteceu foi um desfilar de clássicos de todas as fases da carreira da banda: "Imperium", "Ten Ton Hammer", "Now We Die", "Locust", "Darkness Within", "Bulldozer", "From This Day", "Davidian" e "Halo". O repertório do grupo de Robb Flynn é imenso e não é difícil construir uma setlist forte que leve os fãs ao rubro, como aconteceu neste concerto. Nem o fato de a formação que acompanha Flynn neste momento não ser tão forte impediu muitos apreciadores da música de Machine Head de comparecerem e fazerem a festa.

Muitos desses fãs de Machine Head foram para casa após o fim da atuação do quarteto, o que se notou numa sala que já estava longe de estar cheia e que ficou um pouco despida para a atuação do lendário Kerry King, que veio ao festival apresentar o seu álbum de estreia a solo. Os que ficaram, principalmente os fãs de Slayer, não se terão sentido defraudados por uma atuação poderosíssima, resultado quer da performance de King, quer dos músicos de luxo que o acompanham. Phil Demmel, ex-guitarrista da banda que subiu ao palco anteriormente e antigo membro dos Vio-lence, dispensa apresentações, assim como Mark Osegueda (Death Angel), um dos melhores vocalistas de thrash metal e claramente uma excelente escolha. Isto para não falar que Kerry King continua a fazer-se acompanhar pelo baterista Paul Bostaph, seu companheiro nos Slayer durante vários anos. Menos conhecido é o baixista Kyle Sanders (Hellyeah), que, a título de curiosidade, é irmão do bem mais conhecido Troy Sanders (Mastodon). A banda baseou a sua atuação principalmente no álbum de estreia de Kerry King, tendo tocado uma dezena de temas do mesmo. As músicas soam a uma continuação do que os Slayer já andavam a fazer nos últimos álbuns, o que é bom para os fãs. Apesar de não serem todos fantásticos, há alguns temas bem acima da média e que soaram mais potentes ao vivo. "Trophies of the Tyrant", "Toxic", "Crucifixation" e "From Hell I Rise" destacaram-se pela positiva, enquanto "Two Fists" e "Rage" aborreceram tanto ao vivo como no álbum. Mas há que dar tempo para o mítico guitarrista lançar mais um ou dois álbuns e construir o seu repertório a solo, de modo a não haver fillers nem uma dependência de clássicos de Slayer para agradar ao público. "Disciple", "Chemical Warfare", "Raining Blood" e "Black Magic" foram os clássicos dos Slayer tocados nesta noite, para contentamento dos fãs da icónica banda de thrash metal. "Repentless" também foi apresentado, soando como um tema emblemático, apesar de recente. O porta-voz do grupo foi Mark Osegueda, que comunicou algumas vezes com os espectadores, agradecendo a todos pela paixão, energia e por perceberem o metal. Antes de terminarem o concerto com "From Hell I Rise", o vocalista referiu também que a banda não podia imaginar um sítio melhor para terminar a sua tour. Uma palavra de apreço para Kerry King, que decidiu não pendurar as botas após o término dos Slayer e continua a gravar e a tocar música para os fãs.


Texto por Mário Santos Rodrigues
Fotografia por Paulo Jorge Pereira
Agradecimentos: Prime Artists