The Troops of Doom traz não apenas uma tremenda formação musical devido aos seus membros, mas também é uma banda que mantém ainda aquela fórmula da velha guarda de death, thrash e black metal.
A Mass to the Grotesque (2024) foi lançado em 31 de maio e já atingiu o ranking de topo nas principais listas de Metal Hammer e muito mais, colocando esta banda brasileira no mesmo nível de Kerry King e Darkthrone. Com um tempero de Sepultura, conversamos com Jairo “Tormentor” Guedz sobre este novo álbum, a colaboração com Dan Seagrave, a satisfação de trabalhar com a Alma Mater Records e muito mais.
Jairo permitiu-nos viajar de volta ao passado, àquela era de ouro do metal, e trazer as suas influências e dos seus amigos da banda para este novo fantástico disco.
M.I. - Como descreverias a tua experiência em trabalhar com o Fernando, da Alma Mater Records?
Desde o início, quando entramos para a Alma Mater Records, ponderamos duas coisas: a primeira consistia numa editora pequena e que não tem um casting de centenas de bandas. Uma editora que ainda está à procura de bandas, firmar parcerias no mercado, e isto foi muito importante na nossa escolha. Os The Troops of Doom são uma banda nova, embora com a vasta experiência e currículo dos membros. Nós queríamos uma editora que não fosse muito grande, senão seríamos mais uma banda. Queríamos crescer junto com a editora. Estudámos algumas propostas e até mesmo do Brasil. Porém, o Fernando fez-nos a melhor proposta.
A segunda tem a ver com o facto de o Fernando ser um estudioso das bandas brasileiras, é um apaixonado pelas bandas dos anos 80 do Brasil e, sobretudo, pelo casting das bandas da Cogumelo Records. Além disto, de todas as editoras que falaram connosco, o Fernando era o único que era músico. Além de uma estratégia empresarial, ele tem um pensamento no que é ser um músico. Isto fez toda a diferença para nós. Ele deixa-nos à vontade, para trabalhar, gravar, não impõe nenhuma regra estabelecida pela editora e conhece a realidade das dores e sucessos das bandas quando trabalhamos com as editoras.
M.I. - Um álbum que traz boas recordações do thrash/ death metal dos anos 80 e 90. Porém, também conseguimos uma pequena fórmula de black metal?
Sim! Esta fórmula ou tempero do black metal vem muito da influência do Marcelo Vasco, o nosso guitarrista, bastante renomeado no mundo da música e já fez capas de álbuns. O Marcelo tem uma influência muito grande dentro do black metal. No meu caso, eu sou de uma geração acima do Marcelo, tenho 11 anos a mais do que ele e o meu black metal é mais na onda de Venom e posteriormente Bathory. Já o Marcelo é diferente, ele conhece bem mais aquele black metal da escola norueguesa e Escandinávia. Um dos projetos dele chama-se Pátria e comporta uma banda de black metal, basicamente uma banda de estúdio e que fazem poucos shows, embora um pouco em pausa agora devido ao The Troops of Doom.
Ele está muito mais dentro do black metal do que eu. Gosto bastante, dou uns toques na música e na parte lírica, mas é algo mais da responsabilidade do Marcelo, pelo que discutimos os riffs pelo WhatsApp. A opinião dele é muito importante, visto ele manifestar a sua opinião nas partes mais de black metal e que têm mais coesão. Portanto, sim, temos aquela pitada de black metal no novo disco.
M.I. - A capa desenhada por Dan Seagrave remete-nos para uma banda de death metal da velha guarda. Qual a razão da escolha desta capa e em trabalhar com o Dan?
O Dan é um sonho meu, quando eu pertencia aos Sepultura. Há mais de 40 anos que sigo o seu trabalho. Nunca tive a oportunidade nem dinheiro que merecesse uma capa dele. Cada artista tem a sua própria assinatura e o Dan, inglês que julgo que vive no Canadá, também tem uma assinatura muito própria daquelas bandas de death e thrash dos finais dos anos 80 e meados dos 90, como por exemplo Dismembered e Entombed.
Desde que criámos os The Troops of Doom, sempre nos focamos nessa possibilidade de realizar uma capa com o Dan. Felizmente, e graças ao budget oferecido pelo Fernando, conseguimos colaborar com o Dan. Demos-lhe total liberdade para trabalhar. A única coisa que lhe pedimos na capa foi que esta tivesse uma tonalidade mais azul. Não queríamos mais tons quentes de vermelho, laranja e amarelo. Assim, ele fez isto de forma majestosa e, pela primeira vez, esta capa não tem o demónio que vem dos Sepultura, Bestial Devastation. O demónio já não é o protagonista na capa e o Dan entendeu a linguagem deste novo disco ao colocar um demónio pequeno na frente, como se fosse uma estátua de pedra.
Algumas pessoas até nos questionam que o nosso som é diferente dos Sepultura. Existe uma certa independência dos Sepultura e o Dan conseguiu perfeitamente captar isto. Adorei a ideia, pedi para usar cores azuis e a inscrição de um templo com itens ritualísticos ou xamânicos.
M.I. - “Dawn of Mephisto” foi dirigido pelo André Moraes. O vídeo alude-nos a uma banda de metal dos anos 80. Uma vez mais, a banda a seguir o lema de Make Metal Evil Again?
O vídeo foi uma direção do André Moraes, ele trabalhou na captação do som na bateria, guitarras e voz em Porto Alegre. Posteriormente, enviamos tudo para o estúdio Morrisound Recording e fizemos a parte da mistura.
Aproveitámos que estávamos em Porto Alegre e realizamos o vídeo “Dawn of Mephisto”, a tocar no meio da floresta. O André tem uma direção muito grande com o cinema, sobretudo o cinema brasileiro. Também chegou a trabalhar com os Sepultura, no álbum Dante XXI. Assim, conseguimos trabalhar com ele visto estarmos todos no mesmo estúdio, com a banda toda junta. Cada um de nós mora num estado diferente. Por exemplo, eu moro a 1500 km do Marcelo e a 600 km do Alex, o nosso vocalista. Estamos separados geograficamente, desde Rio de Janeiro até Minas Gerais. Quando nos encontramos é para fazer concertos e alguns ensaios. Aliás, até chegamos a ensaiar online todos os dias.
M.I. - “Chapels of the Unholy” conquistou o 14º lugar na MetalH ammer, ao lado de Kerry King e Darkthrone. Mais do que justo, qual a sensação de partilhar o trono do metal com outros músicos de renome?
Estamos um pouco assustados no bom sentido. Recebemos a nota 90/100 numa revista japonesa. É raríssimo, pois eles são extremamente exigentes e ficamos assustados, inclusive com a Metal Hammer, nomeadamente com essa eleição.
Ficámos assustados, mas também muito felizes. Somos uma banda nova com um trabalho novo, embora tenhamos um background musical bom. Acho que vamos sendo conhecidos aos poucos e a satisfação, para já, tem sido positiva. Vamos em Agosto em tour pela Europa. Não é a melhor época para viajar, mas foi o que conseguimos. Falei com algumas parcerias e vamos realizar alguns concertos, mais de 20 shows dentro de um mês e termina dia 25 de Agosto no Milagre Metaleiro, em Portugal.
M.I. - A faixa “Venomous Creed” aponta-nos para uma sonoridade mais doom metal com uma cadência lenta e pesada. Podemos afirmar que este álbum é mais experimental do que Antichrist Reborn (2022)?
Eu julgo que sim. É um disco bem mais experimental. Temos músicas de 8 minutos e 2 minutos de introdução até à entrada da voz. A faixa “Venomous Creed” tem aquele toque de doom, muito parecido com Black Sabbath.
Sem dúvida, há um grande fator de experimentalismo bem maior do que nos trabalhos anteriores. Trouxemos toda a nossa influência do death, thrash e black metal e neste disco conseguimos viajar um pouco dentro das nossas raízes. Eu cheguei a colocar um pouco além do death e do thrash que tanto aprecio, o Marcelo também com trabalhos de guitarra mais elaborados. É uma evolução natural, no qual temos espaço para fazer algo mais de doom ou stoner.
Ao compor o disco, percebemos que todas as músicas são rápidas com alguma agressividade. Por isso, escolhemos fazer uma música mais arrastada com aquela pegada de doom metal.
M.I. - Se The Troops of Doom, tivesse sido fundada naquele período áureo de Sepultura, Sarcófago, Ratos do Porão e Dorsal Atlântica, mantinham a mesma sonoridade musical de hoje em dia ou seria diferente?
Eu acho que seria bem próxima. Eu falo com os meus colegas de banda todos os dias e descobrimos, principalmente eu e o Marcelo que somos os compositores, que temos as mesmas influências de há 30 anos. Absorvo coisas mais novas de 2000 até 2010, mas eu sou fã da velha guarda.
As bandas que eu ouço e a minha forma de compor são as mesmas que eu usava há uns anos. Eu acordo e fico com vontade de ouvir o disco Hell Awaits (1985), dos Slayer. Quero ouvir Metallica mais antigo, Kreator, Possessed, etc. O Marcelo e o Alex também partilham da mesma ideologia de bandas dos anos 90.
Quando começo a compor e a tocar uma música hoje, eu recordo-me da minha pessoa há uns bons anos atrás e julgo que faria o mesmo tipo de som, caso os The Troops of Doom fossem daquela época.
M.I. - Muito obrigado pela partilha de informação! O que recomendas para os nossos leitores ouvirem?
Eu não me recordo do nome, mas recomendo um disco que achei impressionante para as pessoas que gostam de Jazz. Algo elaborado e ao mesmo tempo fora da caixa. Descobri na semana passada da filha do ator do Will Smith. Todas as noites tenho escutado o disco dela. Musicalmente, este novo disco é um autêntico grito de liberdade a toda a indústria fonográfica.
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Entrevista por André Neves