Noite de Halloween é sempre especial, e para ser ainda mais, só mesmo na companhia de boa música pesada. E foi isso que os metaleiros fizeram, um êxodo até à Sala do Incrível Almadense para se refastelarem ao som dos Moonspell, acompanhados pelos Thragedium.
Por volta das 19:30 já havia fila para se entrar na Sala de Almada, evidenciando que seria uma noite muito ansiada por todos, ou não tivessem sido vendidos todos os bilhetes possíveis. As portas abriram à hora combinada e em pouco tempo a Sala ficou quase cheia.
21:00 e entraram os Thragedium em palco, e iniciaram com “Desagregação”, a primeira faixa do seu novo álbum ‘Lisboa depois de Morta”. Seria esperada uma atuação em torno dos temas desse mesmo trabalho. Seguiram-se “Lucefécit” e “O Pacto”, ambas com uma sonoridade de Doom ou Death/Doom, com andamentos bastante arrastados e distorcidos, mas acima de tudo muito atmosféricos. No caso do tema “O Pacto”, ouviram-se influências da música do médio oriente, que enriquecem imenso o som da banda. No palco para além dos quatro artistas apresentou-se um quinto elemento, um figurino mascarado de modo igual ao ser presente na capa do álbum - colorindo a atmosfera musical gerada pela banda.
Momento alto com o tema “The Adorer”, com uma intro acústica que se adensa em algo Death/Doom, com uma energia criada pelos artistas que se propagou pela Sala, hipnotizando todos os presentes que se entregam ao som atmosférico produzido por este fantástico quarteto musical. Outro momento forte foi a participação do Pedro Oliveira dos Sétima Legião, no tema “Um Mal Necessário”, música onde se ouve uma riqueza eclética em termos de som.
Terminaram com “Pretérito Imperfeito” e com o single “Nations Fall”. A primeira levou-nos para algo mais tribal na introdução, que depois ramificou num som rico, com instrumentos acústicos no fundo, porém sempre com os pés assentes no Doom. A última é Doom por toda a parte, com uma tensão criada no início, acompanhada com um riff de guitarra com um tremolo que nos fez viajar pelas terras sombrias musicais destes mestres da música atmosférica.
Falando com alguns metaleiros presentes ficou claro que havia muitos que tinham vindo mais cedo para assistir à banda, e que se relembram dos seus trabalhos mais antigos. A sua sonoridade está bem alicerçada no Doom Metal, com intrusões bem encaixadas de Folk e de música tradicional de diversos países, e com uma voz no range do gutural relembrando bandas de Death/Doom, alternando para sussurrar, que no conjunto converge num som bastante atmosférico criando uma mística coadunada, na perfeição, com a decoração e presença no palco. A banda não pisava os palcos há 20 anos, no entanto quem tivesse assistido teria visto uma coisa completamente diferente, havia um à-vontade no palco de quem sempre fez isto, talvez para alguns artistas tocar ao vivo seja como andar de bicicleta.
22:20 e as luzes apagaram-se, começou “Lunar Still” e entraram em palco Aires Pereira, Hugo Ribeiro, Pedro Paixão e Ricardo Amorim, e atrás projetado no ecrã Fernando Ribeiro a cantar a introdução da música. Seguiram diretamente para “The Southtern DeathStyle”, depois para “Lickanthrope” e ainda a cover de Isham Jones “I’ll See You in My Dreams”, três temas bastante ‘góticos’ que seria exatamente o que se esperaria numa noite de Halloween. Destaque para estes dois últimos temas por não serem tão habituais, profetizando que poderiam surgir mais surpresas.
Dois dos pontos altos da noite foram os clássicos “Vampiria”, que Fernando avisou que só é tocada em ocasiões especiais, e como tal a noite de Halloween é sem dúvida um desses momentos, e “Opium”. O público vibrou como se não houvesse amanhã, conhecendo as letras de cor e não as escondendo de forma alguma. Entre esses dois clássicos foi ainda tocado “Malignia”, que foi igualmente bem recebido pelos metaleiros que aproveitaram a deixa para o headbang coletivo.
Almada foi apanhada pelo terramoto dos Moonspell com “In Tremor Dei”, tema do álbum temático ‘1755’. Fernando ao desafiar o público pôde testemunhar a sala em peso a cantar o refrão consigo, com uma enorme felicidade no final do tema e agradeceu a todos os presentes por terem vindo até Almada esgotando a sala.
Seguiram para “Night Eternal”, talvez o tema mais pesado da noite e com um dos melhores solos de guitarra do Ricardo, “In and Above Men” e “From Lowering Skies” com um solo de bateria do Hugo a ligar as duas canções do álbum ‘Antidote’.
Mais um momento alto da noite, Fernando avisou que iriam tocar uma música que já não era tocada há muito tempo “The Future is Dark”. O tema foi escutado com muita atenção no Incrível Almadense e de modo pavloviano todos mostraram à banda que ainda assim também sabiam a letra desta. Sendo um tema que detém um excelente riff de baixo do Aires e ainda um dos solos de guitarra mais melódicos da banda. E ainda houve outro tema também não tocado há muito tempo, “Let the Children Cum to Me”, com uma critica tão clara num tema tão negro, feita no ano 1997 mas que infelizmente ainda se encontra demasiado atual. Entre esses temas foi tocado ainda “Em nome do Medo”, onde a legião de fãs voltou a provar que estudou a lição e que sabe a letra, auxiliando a banda.
Mais um clássico do álbum ‘Irreligious’, a música “Mephisto”, e como tinha sido habitual, os fãs vibraram energicamente com os clássicos e começaram a cantar descontroladamente. Depois foi tempo para um tema do EP ‘Under the Moonspell’ de 1994 “Tenebrarum Oratorium (Andamento I / Erudit Compendyum) (Interludium / Incantatum Oequinoctium)”, música que demonstra a sonoridade inicial mais crua da banda, ainda antes de terem lançado o ‘Wolfheart’. A plateia adora os temas velhos, novos, clássicos ou experimentais, o que queriam era mesmo absorver a dimensão musical deste enorme grupo do Metal nacional. Neste tema foi possível vislumbrar a versatilidade artística de Pedro, onde tocou guitarra e teclado durante o tema.
Seguiram-se os agradecimentos e avisaram que faltavam duas músicas para terminar. A receita foram os dois temas clássicos, de fecho um pouco já habitual, “Alma Mater” e “Full Moon Madness”, esta última em formato de encore. Ao tocar a primeira, a plateia perdeu as estribeiras e, ainda que modesto, houve tempo para mosh pit e crowdsurfing. No segundo tema, ao ouvir o primeiro acorde na Telecaster do Ricardo, começaram todos a uivar, mostrando novamente o profundo conhecimento e lealdade para com a banda. E claro, Fernando foi buscar duas baquetas para auxiliar o Hugo na fase final da música, como nos têm habituado, culminando num fecho épico.
Terminado o concerto, a banda anunciou um concerto na Altice Arena, no dia 26 de outubro de 2024, com a Orquestra Sinfonietta de Lisboa, portanto avistou-se logo uma noite memorável para daqui a quase um ano. Esta é sem sombra de dúvida a melhor forma de fechar a atuação.
Moonspell é sinónimo de Metal português, são talvez a banda que mais exportou o nome do país em nome da música pesada e a sua influência a nível nacional é inegável. A sua música cruza gerações e mantém-se sempre atual, carregando consigo enormes clássicos que os metaleiros sabem de cor e salteado. A sua sonoridade com espinha dorsal no metal gótico leva atrelada outras influências, tornando o seu som rico e com várias texturas sonoras. Concertos como este fazem-nos sempre sair da sala com um sorriso na cara. O público sentiu-se na necessidade de absorver acusticamente, e muito atentamente, cada faixa produzida por estes cinco maravilhosos artistas, cantando todas as músicas, e mostrando que carrega a banda ao peito. A banda por sua vez mostrou que tem um amor forte por todos os fãs, e entregou a melhor música que podia ser tocada ao vivo numa noite tão importante como esta.
Se é ou não tradição existir concerto dos Moonspell na noite de Halloween pouco importa, mas na verdade o que os metaleiros querem é que se repita todos os anos, pois noites como esta serão sempre épicas e motivo para repetições.
Texto por Marco Santos Candeias
Fotografia por Joana Alexandra
Agradecimentos: Free Music Events