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Okkultist - "O.M.E.N." Review


Todo o mal e dano. Assim conjura a primeira e homónima faixa do álbum O.M.E.N., em latim, "Omnis Malum Et Noceo", numa abertura ambiente e eclesiástica, que apesar de longa, nos faz imaginar uma nuvem avassaladora de pragas bíblicas a aproximar-se mais rápido do que aparenta, dando lugar a chuvas de fusão impiedosa de Death com uma pitada de Black Metal.

Segue-se "Death to Your Breed", com os vocais secos da fundadora Beatriz Mariano, riffs poderosos e blast beats de Eduardo Sinatra que rapidamente abrem caminho para o delicioso cheirinho de solo do pré-produtor João Corceiro, só para voltar à carga logo de seguida. Mais um solo se apresenta, desta vez do co-fundador Leander Sandmeier, sempre com o baixo de David J. Rodrigues a puxar por uma narrativa escura e sobrenatural. Se a ideia era a materialização de uma intenção maléfica, assim aconteceu. A estética, produção negra e growl das profundezas do inferno de Beatriz, parecem a encarnação de pura maleficência infernal, enquanto a lírica é perfeitamente inteligível.

Gostaria de salientar aqui "Thy Blood, Thy Flesh, Thy Sacrifice", uma faixa rasgada, direta e agressiva q.b., que não se poupa nos solos nem nas alusões a caminhos da mão esquerda, como o videoclip procura retratar isso mesmo - blasfémia sensual e luxuosa. Aliás, em termos de vídeos, a qualidade é excelente em todos e a produção/edição de som não fica atrás - limpa e sólida de tal maneira que o ouvido consegue discernir cada elemento isoladamente, sem esforço, sem retirar o peso e a brutalidade que interessa sempre manter por conferir a alma que se pretende na música. Neste aspeto, gostei especialmente de "Death to Your Breed" num ritmo acelerado.

"Crimson Ecstasy" vem fechar O.M.E.N. com palavras de ordem sangrentas, riffs diretos e bateria sem meias medidas, após uma abordagem curiosa de "Sixpounder", cover de Children of Bodom e tributo a Alexi Laiho, na qual a ausência do teclado da versão original fez com que ficasse perfeitamente alinhada com o restante material do álbum, tudo em rejúbilo carmesim.

No geral, diria que está uma peça bem conseguida e alinhada, interessante a nível de composição, diversa a nível rítmico e vocal, albergando bons músicos e invocado uma imagem negra e agradável aos ouvidos mais tenebrosos. 

Há ainda que mencionar um facto importante, voltando (será?) a "Crimson Ecstasy", à qual se segue um "bold move" que, gostando ou não, há que louvar a audácia: a faixa oculta - 5 desesperantes minutos numa escuridão de silêncio, antes de mais um pedacinho de ambiente insidioso para, agora sim, finalizar a obra.

Pelas palavras de Beatriz acerca da intenção de O.M.E.N., o objetivo era de alguma forma instigar no ouvinte a força para atingir a transcendência da depressão avassaladora para a elevação espiritual, usando a dor como veículo. Tudo isto através da espiritualidade do oculto. Gosto disto. Gosto muito disto.

No entanto devo finalizar com um apontamento mais pessoal, talvez um pouco purista... mea culpa! 

Visto que os Okkultist focam o ocultismo, ou o próprio nome assim leva a pensar, gostaria de ver um maior aprofundamento do tema. Como tantas outras bandas que dançam em volta das fogueiras das ciências das sombras e caminhos da mão esquerda, este é um ponto muito sedutor para mim, ao qual raramente resisto a fazer toda uma autópsia e escrutínio (tal como estou prestes a fazer) pelo tanto que o tema me fascina. Nessa questão, e nessa questão apenas, este álbum não me satisfez. Analisando outras bandas que exploram o mesmo conceito ou temática, e dando o exemplo de uma banda que considero equiparável a Okkultist a nível de construção criativa/tema, Behemoth e as suas líricas crípticas, observamos que a produção estética, tanto dos álbuns quanto da performance ao vivo, composição, sonoridade e ambiente se unem de forma intrínseca e indissociável da mensagem, revelando aprofundamento de práticas ocultistas. Se formos tão longe quanto devemos ao apreciar uma obra de arte e o processo criativo de artistas que investem na exploração destes temas, rapidamente constatamos que vão além do que os visuais e o som comunicam, ou até mesmo as palavras de ordem e afirmação. No caso que uso como exemplo, o letrista impregna crenças e práticas factuais, muitas vezes ao pé da letra, de obras como "O Livro da Lei" da Thelema e "A Chave Menor de Salomão" da Goetia, ou até a óbvia inspiração em obras historicamente importantíssimas como "Paradise Lost" de John Milton. Este nível de diligência, lado a lado com toda a restante potência que os Okkultist entregam, são o meu ponto fraco e teria sido o 10/10. 

Então, e volto a salientar que é a minha preferência pessoal, quando vejo e ouço uma tempestade ameaçadora, fico com a expectativa de que no "eye of the storm" vá encontrar um núcleo mais rico ou concreto. O O.M.E.N. trabalha a materialização de um ocultista empoderado, mas não foca o como, o porquê nem o de acordo com quê que prega todo o mal que maravilhosamente carrega na mão esquerda. Apenas por essa razão não dou maior cotação a um álbum que, em todos os outros aspetos, considero bem conseguido; tem força, técnica, criatividade e empenho e, precisamente por isso, a falta daquele 5º elemento de solidez e profundidade, ou até talvez apenas uma maior clareza no conceito que decidiram explorar, me pesa por considerar tão importante quanto todo o resto. 

Contudo, este é apenas o segundo álbum, se não contarmos com o EP lançado em 2017, Eye Of The Beholder, e O.M.E.N. pode ser apenas uma abertura para uma narrativa mais concreta! Será?? Vamos ter de aguardar para ver, ouvir e sentir que mais estes bruxos das sombras estão a preparar e se me vão fazer engolir sapos nesta minha… implicância de “geek”. Honestamente, espero muito bem que sim! 

Nota: 7.9/10

Review por Alexandra Crimson