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Reportagem: Vagos Metal Fest (2º Dia) @ Quinta do Ega, Vagos 04.08.2023

Para o segundo dia na capital do metal esperava-se um dia mais ‘calmo’, bastava olhar para o cartaz.

A primeira banda do dia tem sempre uma tarefa hercúlea, e desta vez ficou para os Viciously Hateful. Uma banda de Hardcore vinda diretamente da Margem Sul, e nos primeiros minutos remeteu-nos logo para bandas como Suicidal Tendencies. Apresentam-se com 2 vocalistas, e a combinação das suas vozes e estilos distintos encaixou que nem uma luva. Tocaram temas do seu EP Trust None como “Face the Truth” e “Born Hateful” e ainda o seu single mais recente “Eye for an Eye”. Bom hardcore e com forte mensagem nas letras. Já se viam alguns adeptos de mosh, ainda que poucos, pois ainda era bastante cedo, e a noite passada foi ‘pesada’.

A segunda banda do dia foram os portugueses All Against, para mostrar o seu som que circula entre o Thrash e o Groove. Abrem com “Declaration of War” e “Rebelião” do álbum deste ano, e viaja-se um pouco atrás até 2021 com “Sociedade Hostil”, esta última carregada de critica social. Apresentaram-se a Vagos e seguiram para “Mass Murder Policy” e “The Day of Reckoning”, e neste último tema ficou oficialmente aberta a época de mosh pits e crowd surfing, e novamente os seguranças não resistiram à tentação e entregaram-se. O grupo terminou a sua prestação com “Free in Chains”. Carregado de crítica nas suas letras, apresentaram uma mistura perfeita entre Thrash e Groove alternando entre: velocidade e violência (Thrash) para o mosh; peso e desaceleração (Groove) para o head bang.

Os franceses Lecks Inc vieram mostrar o seu metal industrial, com muito espírito de música experimental. A estética em palco relembrou o Black e o Death, mas a sonoridade fez-nos lembrar Marilyn Manson, com um componente de eletrónica muito forte. Foram bastante comunicativos, e escolheram a língua espanhola para se dirigirem ao Vagos.

Depois foi altura para o metal sinfónico dos portugueses Glasya, com um ligeiro atraso. Entraram ao som de música épica, vaticinando auspiciosamente o que seriam os próximos 25minutos, e com “From Enemy to Hero” abriram oficialmente o concerto. Prosseguiram para “Battle for Trust” e “Within the Sandstorm”, esta última com uma intro que nos remeteu para música pérsica. Fecharam a sua passagem pelo palco Hidromel Lucitanea com “Heaven’s Demise”, e o tempo aperta e acaba ser cortado o som nos momentos finais do tema. Os ‘Epica lusitanos’, ou ‘Nightwish portugueses’, ou então apenas Glasya, pois esta banda tem uma identidade própria e bem vincada, apesar das suas fortes influências. Contam com uma soprano de luxo, que ilumina a musicalidade já rica pelos restantes 6 membros.

Ouviu-se nos speakers “Spirit Crusher” dos Death, servindo de aviso que era então altura para Death Metal. Vindos dos Arizona, a nossa companhia era então os Gatecreeper. Abriram com “Sweltering Madness”, com uma intro em que é impossível não abanar a cabeça. Passou-se para “Puncture Wounds”, “Ruthless”, “Craving Flesh” e “Starved”, e até aqui pôde-se atestar que a banda toca Death Metal, porém com muitas intercalações de Doom, recorrendo a diversas escalas cromáticas criando uma atmosfera assustadora. “Caught in the Treads”, “From the Ashes”, “Rusted God”, “Patriarchal Grip” e “Desperation” foram apresentadas e contagiaram os metaleiros que se entregaram ao mosh e ao crowd surfing com uma vitalidade inesgotável. Fomos para “Barbaric Pleasures” e “Sick of Being Sober” e era notória a influência de bandas de Death mais clássico, tanto no som como na indumentária, onde se vêm os membros com t-shirts de Autopsy e Obituary. Fecharam com a ‘quente’ “Flamethrower”. Esta foi uma estreia em solo português muito bem conseguida por parte da banda americana, que nos entregou um Death Metal moderno de inspiração no movimento old school americano, com umas pitadas fortes de Doom e uma presença que nos remete para o Hardcore. Demonstraram boa energia e foram muito interativos. Avisaram que terminaram um novo álbum e voaram diretos para cá, pelo que podemos esperar novidades brevemente.

 A legião de fãs dos Seventh Storm foram-se manifestando ao longo da tarde, usando orgulhosamente as t-shirts da banda. A banda conta com uma base de fãs que entra e saí do metal, para ir a outros géneros, cativando seguidores continuamente. Entraram com “Pirate’s Curse” e terminaram a música alterando astutamente a letra para “We are Alive Vagos”. Prosseguiram com “Haunted Sea” e “Gods of Babylon”, e nestes temas é possível presenciar o rol de influências encapsuladas pela banda, sendo que nesta última verificou-se o esforço no espetáculo visual. “Inferno Rising” e “Seventh” foram apresentadas, e a atuação finalizou com a emblemática “Saudade”, onde os presentes entoaram alegremente o refrão. Já se contava com uma pequena viagem pelo seu álbum Maledictus, onde foi possível escutar uma sonoridade bastante rica e diversificada, do gótico, ao black, passando pelo rock mais melódico.

‘Nós somos os Tara Perdida! Os punks vieram ao Vagos? Desta é que não estavam à espera!’ e foi assim que os incomparáveis do Punk Rock nacional se dirigiram, a partir do Palco Sulimevilla. Abriram com “O que é que eu faço aqui”, uma certa ironia na escolha deste tema. “Um dia de cada vez” foi a segunda música, que pertence ao álbum de 2015 Luto, e aqui foi notória a energia em palco da parte da banda, por outro lado a plateia estava tímida. ‘O punk é power e vocês estão com medo! Os metaleiros estão com medo do Punk Rock’, foi dito pelo vocalista em jeito de provocação, e para quebrar o gelo a banda tocou o riff introdutório da “Raining Blood” dos Slayer, e é aqui que as atenções se viraram para o palco. “Sentimento Ingénuo” foi o terceiro tema, que em 2007 foi single. Passaram para “Realidade (Não sou de Ninguém)” e aqui iniciaram-se os moshes à moda do Punk, sendo que no final o público entoou ‘Tara Perdida’ – estava feito, os espectadores foram conquistados pela banda. Os Tara Perdida passaram para “Jogar de novo e arriscar” e “Baril”, em que nesta última foi feito o pedido para se fazer uma ‘Rodinha’, e os fãs realizaram um Circle Pit muito 'jeitoso', tal era a energia que irradiava do palco para a assistência. Houve um momento de animação com “Batata Frita”, onde os metaleiros e punks fizeram um circle pit ao ritmo da canção, e repetiu-se até que estes últimos acertassem no timing. “Acreditar (Força de Libertação)” foi o próximo tema, e no final voltaram as provocações, desta vez veiculado pelo riff “Enter Sandaman” dos Metallica. “Quanto mais eu grito”, “Fizeram-se Amigos”, “Desalinhado” e “Nasci Hoje” foram os seguintes, e finalizaram com “Dono do Mundo” e “Bairro de Alvalade”, ficando ainda a tocar nos speakers “Lisboa” enquanto abandonavam o palco. Os Tara Perdida surpreenderam todos, com uma excelente energia e com um vocalista carregado de carisma, que levou a que todos se unissem em nome da música e da diversão. Podiam questionar-se, ou até duvidar, no entanto, estes artistas provaram ao que vieram. A banda tem muita história e cruzou gerações, e prova disso foram as dezenas de t-shirts existentes no recinto, envergadas por público de diferentes idades. É caso para dizer que sim, os punks foram a Vagos, e que os metaleiros foram ver os Tara Perdida.

Em seguida foi tempo de voltar ao palco Hidromel Lucitanea, para regressar ao metal através das Nervosa. O quarteto do Brasil entrou com tudo “Seed of Death” foi o tema escolhido para abrir a noite, e seguiu-se “Perpetual Chaos”. A vocalista Prika Amaral foi sempre bastante comunicativa e agradeceu sempre que a banda finalizou um tema. Encaminhámo-nos para “Death!” e “Masket Betrayer”, sendo que crowd surfing e mosh pits estavam ao rubro, é Thrash que Vagos quer, e as Nervosa entregam-no de boa vontade. Prika dedicou o próximo tema “Kill the Silence” a todos os que já sofreram um qualquer tipo de abuso na sua vida, e ainda tocaram “Kings of Domination”. Mudaram de afinações e arrancaram para “Genocidal Command”, uma faixa bem rápida, sendo que Prika avisou que estava a gostar do moshpit, mas que queria ainda mais, e os metaleiros aquiesceram ao som de “Venomous”. Tempo ainda para “Guided by Evil”. Os mais conhecedores da banda sabiam que o final dos concertos ficaria sob a alçada de “Endless Ambition” (primeiro single com esta nova vocalista) e “Under Ruins”. Música muito frenética, pesada e com muita mensagem por de trás de cada letra – em suma o que se quer do Thrash Metal. A língua facilitou a comunicação, que foi bastante bem recebida pelas centenas de aficionados do metal.

Os cabeças de cartaz para este dia eram os Ugly Kid Joe (UKJ), o que causou alguma perplexidade entre os admiradores do festival. Ouviu-se “Sin City” de AC/DC e estava lançada a tónica do espetáculo, vai ser Rock. Às 23 horas começaram com “That ain’t Livin’” do novo álbum de 2022, Rad Wings of Destiny. A plateia estava muito mais reduzida do que nos concertos anteriores, os metaleiros fogem de telecasters, assim como o diabo foge da cruz. A canção seguinte foi “V.I.P.” do álbum Menace to Sobriety, e a energia do vocalista Whitfield Crane foi inegável, saltou por todo o lado, e correu em torno dos colegas que foram tocando. Passaram para “Neighbor”, a primeira música do primeiro álbum, e apesar de ainda reduzida, a plateia, com ajuda de Whitfield cantou o refrão, sendo que talvez a banda ainda fosse a tempo de conquistar Vagos. “C.U.S.T” foi a seguinte música e no final o frontman apresentou a banda, tendo pedido ainda que todos olhassem para a lua, que sorrateiramente se elevava majestosamente pela noite, algo de profético talvez. Passam para “Jesus Rode a Harley”, “Panhandlin’ Prince” e “Come Tomorrow”, viajando de 1995 a 1992. Whitfield foi pedindo que a plateia o acompanhasse com palmas, e foi interagindo com o público ao longo da viagem pela discografia da banda. O grupo regressou ao trabalho mais recente com “Dead Friends Play” e também ao EP Stairway to Hell, de 2012, com “No One Survives” e “Devil’s Paradise”. Passaram por 2015 com “Bad Seed” e voltaram às origens com “So Damn Cool”, altura em que o frontman avisou que era o dia de aniversário da namorada do guitarrista Chris Catalyst (que está a substituir Dave Fortman), sendo que então, em uníssono, Vagos em peso cantou “Happy Birthday” – pouco a pouco foi-se quebrando o gelo. “Cat’s in the Craddle”, a cover de Harry Chapin, imortalizada pela banda no seu álbum de estreia, e imortalizado pelas dezenas de telemóveis dos festivaleiros que reconheceram facilmente a melodia – momento de isqueiro (ou lanterna do telemóvel). Regressaram ao EP de 2012 com “I’m Alright” e ao novo álbum através de “Failure”, e nesta última o guitarrista Klaus Eichstadt, em tom de brincadeira, afirmou que o tema era sobre a sua vida amorosa. Seguiu-se “Milkman’s Son”, onde é possível sentir algum peso na música, e os metaleiros sucumbiram à vontade de fazer crowd surfing, ainda que forma modesta. Manteve-se a mesma tónica com “Goddamn Devil”. Depois foi o momento alto do show: a cover de “Ace of Spades”, com ajuda no baixo pela palheta de David Ellefson! Este foi o catalisador que todos precisavam, o público descontrolou-se e abriu um MEGA CIRCLE PIT. Todos vibraram ao som deste mítico clássico dos Mötorhead, e em simultâneo perdoaram os UKJ. É o som que une metaleiros e rockers. É o som que cruza gerações. Avançou-se para o último tema da noite, e aquele que é o mais emblemático da banda: “Everything About You”. O moshpit continuou fortíssimo e vertiginoso, e os que não se atreveram a entrar entoaram o refrão da música. Apesar de não ter tido a audiência esperada de um headliner, a energia inesgotável de Whitfield, bem como seu jeito natural de entertainer, tiveram imenso valor, e foram conquistando terreno, paulatinamente. Vagos, à primeira vista, não parece o público-alvo dos UKJ, mas no fundo bastava uma pequena faísca para contagiar o ambiente festivo dos presentes. Oxalá “Ace of Spades” tivesse sido tocado mais cedo, e todo este concerto poderia ter sido muito melhor. A banda aparentou ter gostado de ter passado por cá, tendo terminado com a poderosa frase “Portugal Fucking Rules”.

Os espanhóis Megara apresentaram um palco com uma decoração que nos remeteu imediatamente para o Halloween e para a temática de horror. Coadunando-se na perfeição com a intro de entrada escolhida: a cantiga infantil de Freddy Krueger. Arrancaram com “Esclava del Aire” e passaram para “Saturno” e foi manifestamente visível a energia da vocalista que não parava. Seguiram-se as primeiras interações com Vagos e decidiu-se consensualmente que a língua espanhola seria o canal de comunicação da noite. “Bienvenido al Desastre” foi tocada e a vibe da banda foi de festa e diversão, parecendo estar a divertir-se profundamente. Com a canção “Involución” a estética converteu-se ao cyber punk com uns toques de eletrónica a servir de melodia de fundo, e a entrada de bailarinas vestidas com trajes de utopia futurística, que culminou num enorme grito da vocalista. Atreveram-se  depois a trazer uma balada, intitulada “Almas”, o que arrefeceu o ambiente. Uma pena, pois começava a aquecer. A eletrónica retornou com “Estanque de Tormentas”, e a sonoridade remeteu-nos levemente para algo mais rock industrial. Tempo para 2 malhas mais recentes do grupo, “Hocus Pocus”, apostando imensamente no espetáculo visual, e a seguinte com imenso ritmo “Oxígeno”. Momento para um solo de bateria enquanto são percorridos alguns temas pop mais contemporâneos. A canção “Arcadia” remeteu-nos novamente para algo mais industrial, continuando a aposta no espetáculo visual. “Náufrago” e “Heroes” foram as próximas músicas. Findam a sua estreia no Vagos com “Truco o Trato” fechando assim o ciclo estético de Halloween. A sonoridade é rock, todavia passeou-se abertamente pela eletrónica e pelo pop. Os Megara apostaram muito no espetáculo visual, comprovado pela decoração, indumentária e coreografia. Rosa e preto por todo o lado. Apesar de o grupo ter sido muito energético e muito comunicativo, não cativaram os festivaleiros, e muitos nem quiseram espreitar a musicalidade dos espanhóis. O pós-festa ficou sob alçada do DJ Izzy com a companhia de António Freitas e Miguel Gaspar.

Amanhã, teremos o último dia, e como tal o povo de Vagos vai dar tudo com certeza. 

Texto por Marco Santos Candeias 
Agradecimentos: Amazing Events