A noite de Sábado passado, no Feijó, foi iluminada musicalmente por duas excelentes bandas do Metal Nacional. Os protagonistas da noite foram os Ruttenskalle, numa onda mais Death Metal Old School de inspiração claramente vincada na cena de Estocolmo do final dos anos 80. Que se fizeram acompanhar pelos Black Flare com o seu Heavy Metal Clássico, surfando uma distintiva onda do NWOBHM (New Wave of British Heavy Metal).
Abertura de portas foi dada pelas 21 horas, contudo, só passado algum tempo é que foi possível começar a vislumbrar alguns potenciais candidatos para a audiência. Só que estes preferem agrupar-se no pátio, à entrada da sala do Hollywood Spot, dado que está muito fresco no exterior, e estes metaleiros sabem que a noite vai ser quente.
Apresentam-se e deixam o recado que vieram para mostrar “Um Heavy Metal assim pesado” e arrancam para o 3º tema da noite “Fire and Blood”. Nesta música não dá para não ouvir Iron Maiden nas entrelinhas: é o ritmo guitarrístico pela mão do Nuno que se metamorfoseia numa melodia sublime, aliado ao galopar estonteante das notas do Warwick de 5 cordas de Antim e a majestosa bateria de Luís que pinta o fundo desta densa paisagem melodiosa. Os fãs manifestam o seu agrado, e o vocalista agradece a todos por estarem ali, apesar do calor que se faz sentir. Seguem para a 4ª canção da noite “Above and Beyond” e colam de imediato a 5ª “By My Sword”. Esta última é um misto sonoro: por um lado é um martelar de um baixo que em tudo soa a Steve Haris; por outro lado é um riff de guitarra que nos leva para a 1ª wave de Black Metal, sob o som de bandas como Venom ou Bathory.
Antim avisam-nos que seguir-se-ão as
duas últimas da noite, mas que depois “Vem aí alto concerto”, elevando, dessa
forma, a fasquia de todos os presentes. A penúltima da noite é “Hunters Moon”
em que a melodia inicial nos relembra, subtilmente, a “Holy Diver” do grandioso
Dio. Esta incrível prestação, pela banda lisboeta, culmina no som “Bending the
Will”, que é o primeiro tema do álbum, uma forma bastante simbólica de fechar a
sua atuação. Relembrar que é a única música que tem um videoclipe. Terminam às 22:37 horas,
deixando todos com vontade para mais.
Uma banda que nos permite viajar
pelo Metal mais clássico. Fica patente que respiraram Judas Priest e Motorhead, e que transpiram Iron Maiden por todos os poros. Nuno com uma guitarra que parece
querer passar despercebida, porém paulatinamente cria a atmosfera conspícua que
converge para um solo super melódico – que nos remete para NWOBHM. Antim e a forma
como martela o baixo com os seus dedos, que parecem relâmpagos, que se
assemelha a uma mistura de Steve Haris (tecnicamente) e Lemmy Kilmister (na
atitude de frontman). Luís super competente e enérgico na bateria, que suporta
toda a banda, longitudinalmente, ao longo do brilhante concerto.
Os Ruttenskalle iniciam às
23h13, com uma sala um pouco mais bem composta. Fumo começa a ser difundido
pelo palco, e entra uma intro fantasmagórica – a atmosfera horripilante está
criada, o mote está lançado. Esperam-se temas do seu álbum “Skin’em Alive”, de
2021, no entanto brindam o Hollywood Spot com o seu novo tema “Flesh”. A música
que encapsula tudo o que é Death Metal: os cantos guturais que trespassam
através dos tremolos rasgados das guitarras duplas e pelos blast beats afiados.
Voltam aos palcos sem baixista, ainda assim, como já tinham mostrado, no Barreiro há uns
dias, isso não os faz abrandar.
Fogem de imediato para a 2ª da
noite “Time do Kill”. A sonoridade da banda é como revisitar o Death de Estocolmo.
Mostram uma intro de guitarra fria e melancólica, no entanto, progride para um riff
avassalador e penetrante pelas mãos de Jorge Matos e Tiago Rocha; um misto de
canto gutural grave e gritos estridentes amalgamados na perfeição, evidenciando
uma excelente técnica e versatilidade da parte do vocalista António Gonçalves; a
bateria de Paulo Soares que nos magnetiza ao longo de todo o tema, sempre
bastante afincada e dedicada.
“Vamos lá, boa noite” e é assim
que o vocalista António se dirige à plateia no Feijó, aproveita para apresentar
todos os membros da banda, e para agradecer a todos os presentes, e aos Black Flare
dizendo “Grande som”. Fecha esta primeira intervenção da noite com a notícia
que o primeiro tema da noite poderá ser lançado, oficialmente, muito brevemente.
A 3ª da noite seria “Rotten God”
com uma dedicatória muito especial da parte da banda, atendendo aos eventos a realizar
muito futuramente. Riff muito acelerado casado com uma bateria fenomenal, que
se difunde num break down lúgubre que nos coloca involuntariamente numa
adoração ao headbanging. Olhando para a sala é incrível, parece que viajamos
até a um bar underground em Estocolmo no início dos anos 90. Seguidamente tocam
a “Anal Ride” que inicia com uma linha de guitarra “lenta” e suja que se densifica
tanto no peso como na velocidade, sempre acompanhado por uma bateria eximia. Somos
brindados com um clássico solo de Death Metal, pela Jackson de Jorge, bastante
ritmado que serve de pináculo à tensão criada por todo o riff.
António questiona o publico se
todos estão a gostar, e recebe um uníssono sim (à moda de Cristiano Ronaldo). Prosseguem
para “Feast of the Dying Sluts”, e os artistas demonstram uma tremenda
concentração em palco, todavia, concomitantemente viajam pela sua própria arte,
altamente convidativa – e todos na plateia seguem para o interior deste foguetão
pintado em tons de música pesada. Jorge e Tiago dispõe-se frente a frente
evidenciado uma colossal sinergia e um invejoso companheirismo. A energia da
banda é pegadiça e todos vibram. O ponto final da música é dado por um perfurante
“AHHH!” – puro Death Metal.
Nova interação com o povo metaleiro,
e António mostra a sua boa disposição entoando “A Minha Casinha” dos
Xutos&Pontapés. E é isto que se quer numa banda e num frontman, bom humor e
energia. Regresso ao Metal com “Dead Man” e se tínhamos dúvidas bastava ouvir
os incríveis tremolos nas guitarras duplas e os blast beats acutilantes, com o bónus
de um pouco de tapping. Sem delongas iniciam a “Buried”, e novamente, com uma melodia
deveras soturna, criando uma atmosfera com peso sentimental, que rapidamente é trocado
por peso musical, ou não fosse o António em pleno palco entregar-se ao
headbanging.
“Carnage in the Fog” é a seguinte,
e a banda não se cansa de tentar cansar os espetadores, repetidamente entregam
ritmos frenéticos munidos de peso sonoro, só que estes metaleiros vieram
preparados para uma noite de ferro (metal) e fogo (calor). A noite na Margem
Sul é aqui no Hollywood Spot, e quem procura emoções fortes, pela mão da música
pesada, não precisa de procurar mais – Feijó é o lugar certo.
“E tudo o que começa tem que terminar, e vamos para a nossa última música” é o que nos diz o frontman dos Ruttenskalle. Olhando para a cara de desânimo de todos os que estavam para lá do palco, percebe-se que se queria mais música. Em pleno palco consegue-se negociar, e vão tocar mais 2 músicas. “Fucked With My Knife” é entregue vigorosamente, com um som que roça aquilo que poderia ser o 3º spin-off de Nihilist.
A última da noite seria uma repetição
da “Rotten God”, só que desta vez a banda entrega-se ainda com mais energia. Tremolo
picking que nos hipnotiza, e os pratos da bateria que nos acordam, e o ciclo
repete-se freneticamente. A banda vai com tudo, sabia-se que isto seria o final porque os
artistas estavam a exalar toda a sua vitalidade neste último tema. O concerto
finaliza com um muito sentido “Obrigado”. O concerto terminou à meia-noite em
ponto, pondo assim o ponto final à noite gloriosa que tinha cessado, através da
música – e que forma de terminar um Sábado.
Uma banda para todos os fãs do Death
Metal, em particular a onda mais Old School, com enfoque nas bandas Escadinavas,
mais concretamente Estocolmo. Perfeitos na técnica e na execução em palco. São
bastante atmosféricos em termos de som, o que se coaduna perfeitamente com a
decoração do palco. A sua energia em palco só consegue ser superada pela sua
boa disposição e afiado sentido de humor. Parecem contar já com uma certa legião
de fãs, pois existiam muitas caras já vistas no último show, no Barreiro.
Uma viagem de Londres a Estocolmo, sem nunca tirar os pés do Feijó – que passeio musical nesta noite de Puro Metal.
(ver mais fotografias do evento, aqui)
Texto por Marco Santos Candeias
Fotografias por João Paulo Neves
Agradecimentos: Hollywood Spot - Estrelas do Feijó