Os Cradle of Filth acabam de lançar um álbum ao vivo “Trouble and Their Double Lives”, pela Napalm Records, enquanto os fãs aguardam ansiosamente pelo próximo álbum de estúdio da banda. O novíssimo álbum duplo ao vivo apresenta os temas favoritos dos fãs, duas faixas bónus e duas músicas totalmente novas. O Dani Filth conversou com a Metal Imperium sobre o novo álbum ao vivo, a colaboração com o Ed Sheeran e o concerto da banda em Portugal em agosto, na 14ª edição do Milagre Metaleiro Open Air.
M.I. – Olá, Dani. Como estás?
Estou bem, obrigado.
M.I. - Quando a banda começou, imaginavas que os Cradle sobreviveriam três décadas no mundo da música?
Acho que nem pensamos nisso, até nos podemos ter imaginado a tocar para grandes audiências e a ter uma carreira longa mas não, a resposta é não.
M.I. - Como foram estes 31 anos de Cradle of Filth?
Incríveis. Tivemos muitos altos e baixos, como em tudo, mas talvez mais altos. Já vimos o mundo centenas de vezes. Sim, tem sido criativo. Todos os tipos de coisas aconteceram e, se eu escrevesse sobre isso, encheria uma infinidade de livros. E não parece que já se passaram 30 anos, passou muito rápido.
M.I. - Quão excitante é tua vida como músico? É tudo o que imaginamos: muito dinheiro, festas e glamour?
Às vezes é muito aborrecida, porque temos muitos tempos mortos. Vamos gravar um álbum, daqui a uma semana e meia. Na verdade, antes ainda vamos a Las Vegas tocar num grande festival, voltamos e começamos assim que aterrarmos. Isso vai demorar cerca de quatro meses, porque não temos fins de semana de trabalho no estúdio. Portanto, deves imaginar que fica um pouco repetitivo. Mesmo as tournées podem ficar entediantes também. Há muito tempo de inatividade. Lembro-me de uma frase famosa que adoro, não me lembro quem a disse, mas é assim: “Vocês não me pagam para fazer concertos. Eu faço-os de graça! Vocês pagam-me para ficar sentado em hotéis e aeroportos durante muitas horas”. Sim, eu faria concertos de graça, apenas me paguem para ficar sentado.
M.I. - Mas as pessoas “normais” também têm vidas repetitivas, sabes? Quero dizer, muito mais chatas que a tua, provavelmente!
Bem, define normalidade! (risos)
M.I. - Como surgiu a ideia de lançarem mais um álbum ao vivo? É uma forma de manter os fãs entretidos enquanto esperam por material novo?
É um album! Ponto final. Na verdade, ganhou vida própria, não o decidimos fazer. Foi apenas uma circunstância do atraso que o Covid forneceu. Isso também significou que o nosso último álbum com a Nuclear Blast foi adiado por um ano, por causa da pandemia, não pudemos andar em tournée, por isso não fazia sentido lançá-lo, só fazia sentido adiar o seu lançamento. E a transição da Nuclear Blast para a nossa nova editora Napalm aconteceu um ano depois também. Como tínhamos algum tempo de inatividade e tivemos uma ligeira mudança na formação, decidimos que com os novos membros, faríamos um reset na escrita. E, o que quer que tivéssemos, colocamos no disco ao vivo também, porque eram temas curtos. Tínhamos uma grande seleção de músicas que cobriam todo o espectro de álbuns dos Cradle. Portanto, foi algo circunstancial porque não percebemos que o nosso engenheiro ao vivo tinha gravado tudo o que tínhamos feito nos últimos quatro/cinco anos. E foi sugestão sua transformá-lo num registo ao vivo. Quero dizer, se planeássemos com antecedência, provavelmente teríamos gravado um concerto, não o teríamos feito desta forma. Escolhemos as melhores performances e o nosso engenheiro de estúdio entregou-as de uma forma que as faz soar concisas, coesas e empolgantes.
M.I. - Ok, eu ia perguntar, como foram selecionadas as faixas, mas acabaste de dizer que escolheram as melhores!
Bem, acho que ele estava à procura de temas explosivos, sabes, boas atuações, boas reações, boa energia. Foi tudo tirado da mesa, mas tivemos que manipular um pouco o som, obviamente, para ter qualidade para ser tocado em CD e plataformas digitais, etc. Foi assim que fizemos. E depois sentamo-nos para garantir que tudo estava na ordem certa. Quer dizer, o trabalho mais difícil era mesmo satisfazer a nossa lista porque os critérios eram bastante brutais. Não há nenhum tema repetido do álbum ao vivo anterior porque, apesar do intervalo de 21 ou 20 anos, eles ficam bem um ao lado do outro numa prateleira de uma loja de discos, se é que ainda existem. Também tinha que ter temas favoritos lá.
M.I. - Mas há uma faixa repetida nos dois álbuns ao vivo: “Born in a Burial Gown”. Por quê? É o teu favorito?
Sim. Isso aconteceu, mas não sei porquê! (risos)
M.I. - Achas que este álbum ao vivo dá aos novos ouvintes uma boa ideia da evolução sonora da banda ao longo dos anos?
Quero dizer, esta é uma experiência ao vivo. Queríamos soar vivos e enérgicos, sem dubs. Não sei se há procura de discos ao vivo. Não sei se toda a indústria da música mudou um pouco em relação a isso, e não sei se são tão populares quanto eram, talvez por causa de todo o meio digital... as pessoas têm acesso aos discos sempre que querem, e isso fez perder um pouco de magia. Não seguimos o plano de lançar discos ao vivo, acho que contornamos os desastres inevitáveis. E acho que uma nova faixa de estúdio em cada lado do álbum duplo também funciona. O álbum parece estar a ter uma boa receção e servirá como um bom espaço reservado para as futuras produções de estúdio.
M.I. – Dizias que não sabes se há procura de álbuns ao vivo. Como vão as vendas? Tens alguma ideia?
Bem, não sei, mas nas tabelas da Amazon estamos bastante bem. Temos recebido um bom feedback das pessoas. A Napalm tem feito um ótimo trabalho na imprensa, por isso estou a falar contigo. Estou a fazer imprensa há cerca de um mês, com 16, 20 entrevistas por semana. Eles estão a fazer um bom trabalho. Parece estar a funcionar e o principal, e mais importante, é que os fãs estão a gostar. E mesmo que sejam apenas os fãs a gostar, basicamente fomos bem sucedidos na nossa missão.
M.I. - Tens alguma ideia se os vossos fãs ainda compram cópias físicas ou se apostam mais nos formatos digitais hoje em dia?
Não faço ideia. Terias que questionar a editora sobre isso.
M.I. – “She is a Fire” e “Demon Prince Regent” são as duas novas faixas. São uma amostra do que os fãs podem esperar do som do próximo álbum?
Sim. Bem, não necessariamente o mesmo. Temos uma nova formação, novo som, mas não drasticamente diferente. Eu diria que é uma representação justa, definitivamente.
M.I. - Mencionaste que o novo álbum terá uma vibe de “Dusk and Her Embrace”. Importas-te de falar mais sobre isso?
Estamos a chegar perto da data de gravação e diria que é tematicamente uma espécie de “Dust and Her Embrace” misturado com “Midian”. Tem uma vibração, esse tipo de elemento sombrio e fantástico. Vai ser muito assustador.
M.I. - Vocês estão prestes a começar a trabalhar no novo álbum. As letras já estão todas escritas?
Não, não todas, talvez 80%. Tenho algumas músicas. Tenho tempo com elas, porque não me quero apressar para as terminar. E está tudo bem.
M.I. - És o letrista principal. Quanto tempo demoras a escrever uma letra completa? Quero dizer, elas são bastante elaboradas.
Sim, escrevo todas as letras. Não sei, às vezes, demoro bastante, outras vezes vêm naturalmente, não consigo ditar essas coisas. Pode ser frustrante para um escritor em geral. Podes estar um mês e não fazer nada, não conseguir pensar em nada. E outras vezes fazes tudo em dois dias. Não podes simplesmente dizer: “Ok, na próxima semana vou trabalhar no novo álbum!” e estarás a fazer outra coisa porque simplesmente não funciona assim... apresentas ideias, estruturas, vibrações, atmosferas e histórias e o tipo de música que as pessoas podem ouvir por um longo período de tempo. É como um quebra-cabeças. Às vezes demoras muito tempo para o fazer, outras vezes fazes isso num dia.
M.I. - Mas estais a preparar um álbum conceitual?
Bem, tudo o que os Cradle fazem é baseado num conceito. Não é como “Cruelty and the Beast”, é mais como “Midian”. É uma coleção de músicas, tematicamente estão ligadas. Mas não é um conceito, não sei se algum dia voltaremos a fazer isso. É muito difícil escrever assim, porque é preciso escrever uma história completa, não apenas uma coleção de canções, sobre um tema que a maioria das pessoas atribui a um disco conceitual. Com isto pode dizer-se que sim, todos os nossos álbuns são baseados em conceitos.
M.I. - Diz-me, a tua colaboração com o Ed Sheeran é um tema quente nos dias de hoje e gerou um grande debate online e acredito que, provavelmente, não seria algo que considerasses fazer há duas décadas, mas, felizmente, agora estás mais velho e os fãs de metal também estão mais sábios e parecem ter a mente mais aberta hoje em dia e tudo é possível. Por que gostas de fazer o que pode “chocar” os fãs?
Bem, eu gosto do casamento de extremos, da justaposição, daí todas as colaborações anteriores que fiz com os Bring Me the Horizon, Twisted e 69 Eyes, só para citar alguns.
M.I. - Sim, mas não são tão comerciais...
Eu conheço o típico fã de black metal o suficiente. Mas gosto da justaposição, do casamento de extremos. Eu gosto do Ed, ele é um dos maiores artistas do mundo. Estamos a fazer uma música com ele e ele toca guitarra acústica. É uma música séria para uma instituição de caridade. Acho que vai surpreender muita gente! E eu gosto de ultrapassar limites. Não gosto que me digam o que fazer. Outra razão para fazer isso é exatamente essa… os fãs de metal são uma comunidade dividida de qualquer maneira. Não me interpretem mal! As pessoas do metal são leais, mas são leais apenas às suas bandas. Não importa o que digas ou faças, haverá um milhão de pessoas a dizer “Tu não és tão bom quanto fulano e sicrano” o tempo todo. É um género musical muito dividido. E esta é a minha maneira de antagonizar essa divisão e as pessoas ou vão gostar ou odiar, mas nunca vão mudar. Mas o bom é que, no final das contas, será por uma boa causa.
M.I. - Para que instituição de caridade é?
Não posso falar sobre isso.
M.I. - E quando sai? Podes dizer-nos isso?
Não sabemos. Começaremos a mistura do tema amanhã e falta mais ou menos uma semana para terminarmos a mistura, porque vamos entrar em estúdio e vamos a Las Vegas fazer um concerto. Esperamos lançá-lo no final de agosto, início de setembro. Mas tem que passar por muita administração e contribuições, tem que envolver a rádio, a caridade dá muito trabalho.
M.I. - Ok, então como é que Zoe Marie está a integrar-se na banda?
Os dois novos membros são fantásticos. Eles dão-se muito bem, isso é uma parte muito importante de estar numa banda... entender a teologia e o funcionamento da criatividade e ser capaz de integrar e contribuir conforme o esperado. Também têm que ser boas pessoas. Sabes, nós temos um sentido de humor um pouco distorcido, e eles precisam de ser divertidos, amorosos e atenciosos. Há muitos atributos e a Zoe e o Donny têm-nos. Eles são humanos realmente adoráveis e damo-nos muito bem. Apesar de ter tido inúmeras mudanças de formação no passado, somos uma comunidade muito unida. E isso ficou demonstrado na nossa tournée recente, com os DevilDriver, porque o Dez é o nosso empresário e partilhámos equipa e produção e parecíamos mesmo uma família.
M.I. - OK. Vocês virão a Portugal este verão. O que é que os fãs podem esperar que toquem? Uma mistura de faixas de todos os álbuns ou concentrar-se-ão principalmente no novo álbum ao vivo?
Não! Vai ser uma mistura. Vai ser um bom festival, um bom set. Definitivamente tocaremos muitos temas favoritos dos fãs. Serão temas que tocamos na primeira vez que tocamos em Portugal. Obviamente, haverá algumas músicas novas também. Provavelmente faremos um set extenso. Sempre reavaliamos e revemos os sets e garantimos que tocamos o que os fãs querem ver, os seus favoritos.
M.I. - Ok, Dani, muito obrigado pelo teu tempo. Espero que vocês se divirtam muito em Portugal em agosto. Tens uma mensagem final que gostarias de partilhar com os fãs?
Sim, muito obrigado por serem fãs da banda. Temos afinidade com Portugal, pois foi o primeiro país a aceitar os Cradle no início da banda, o primeiro país fora do território nacional. O nosso primeiro espetáculo no estrangeiro foi em Penafiel e, a partir daí, fomos aí mais três ou quatro anos. Estávamos sempre em Portugal. Houve uma infeliz reviravolta nos acontecimentos a certa altura, mas Portugal está sempre muito próximo dos nossos corações. É bom voltar aí e tocar. A última vez que tocamos aí, acredito que foi em 2018 ou 2019. Tivemos uma pandemia de dois anos no meio, mas ainda é bom. Apareçam no festival! De qualquer forma, estou muito ansioso.
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Entrevista por Sónia Fonseca