Oliver Nikolas Schmid, guitarrista e letrista da banda, conversou com a Metal Imperium, sobre o álbum e o seu processo. Como começou o processo criativo, como ele descobriu a voz do Julian, a tournée com os Mono Inc., as suas bandas góticas favoritas e muito mais.
M.I. - Saudações, Oliver. Obrigada pela tua gentileza em responderes a algumas perguntas a respeito deste espetacular álbum! Como é que estás, primeiro que tudo?
Obrigado por nos receberem!
M.I. - Antes de mais, o vosso álbum saiu no dia 26 de agosto, através da Steamhammer/SPV. Fresco, gótico, apaixonante. Chamaram-lhe “How To Shroud Yourself With Night”. É a continuação do álbum de 2019 “Bleeding The Stars”. Foi difícil escrever segunda parte do seguimento, sem soar igual? Quão desafiados se sentiram?
Quando eu começo a escrever músicas, isso quase que abre as portas do inferno para o meu eu interior – é sempre um processo difícil escrever músicas para mim, porque se uma melodia é boa, mas não quebra o meu coração em pedaços, e não não a uso. Ela tem de me tocar tão profundamente, de me deixar de joelhos, para entrar no álbum e isso é sempre um processo difícil para o meu eu interior. Dessa vez a pressão apareceu e atrapalhou-me. Tirou-me o sono. Finalmente, estamos no caminho certo e estava lá, a pergunta diária: é hoje o dia para escrever algo especial? Contudo, não podes forçar isso porque acabas no perfecionismo e a pensar demais nas coisas. Todo o artista tem de travar esta batalha. À medida que a pessoa se torna mais bem-sucedida, o sucesso torna-se um predador. Quase fui devorado por ele. De certa forma, cada álbum decide sobre a existência contínua de uma banda. Podemos superar os números das vendas anteriores? A editora estende o contrato? Receberemos boas ofertas de concertos? Todas estas perguntas passam na cabeça de todos os artistas e acho que as pessoas não estão realmente cientes de que a cada disco que não é ouvido, comprado ou ouvido através de streaming, uma banda morre. Eu comecei esta banda por admiração à banda de Doom do Reino Unido, os Paradise Lost. Lembrei-me da época em que os descobri e pensei nos dias em que andávamos juntos em tournée e nos encontrávamos em festivais. E assim, os primeiros riffs de “Wall Of Gloom” foram escritos. Esta música é uma homenagem à banda e aos nossos começos e uma torna-se a outra.
M.I. - “How To Shroud Yourself With Night” tem mais emoção e podemos ouvi-la. O Christopher também fez um bom trabalho. O que te inspirou a tua criatividade? Alguma coisa nos teus assuntos diários? Poderias partilhar connosco, por favor?
Tudo começa sempre com guitarras. Tenho uma família grande e uma casa muito modesta. Tive de esvaziar o meu estúdio de gravação para a criança número 3, e o único lugar para eu descansar, era no quarto de banho, em frente à banheira. Eu fechei-me lá dentro, agachei-me em frente à sanita, com o meu iPad e a minha guitarra. Espero que essa informação não seja a minha ruína na tua review (risos)! Alguns meses depois, comecei o processo de escrita. Eu já tinha um monte de ideias de músicas prontas que teriam sido uma aposta segura e não teria de arriscar. Mas eu não queria um álbum que não surpreendesse ninguém, que não correspondesse às expectativas e não incomodasse ninguém. A minha ideia para o disco, era exatamente o oposto, deveria surpreender, deveria perturbar, deveria emocionar. Porque isso é arte e arte é coragem! Esse foi o caminho.
M.I. - Os temas de cada música estão relacionados: o desejo de ser invisível para o mundo e não lidar com ele e com o mundo externo. Porquê este tema? O que é que te fascina nele? O ambiente místico que o cerca é o que te intriga?
Em primeiro lugar, o título. Quando o Christopher apareceu com ele, fiquei simplesmente deslumbrado. Ficar envolto pela noite, é uma ideia muito sombria e também funcionou muito bem com as minhas demos, que na maioria das vezes tinham um som muito Doom. Quando a escuridão te rodeia por um longo tempo, ela torna-se uma característica tua, não é mais o desconhecido, mas parte de quem tu és. Quando se vê a noite como beleza, o medo também se desvanece. O verdadeiro tema do álbum é o desejo de desaparecer, de ser invisível e não teres de lidar mais contigo mesmo e com o mundo exterior. É sobre sombras, sobre escuridão e objetos místicos que combinam o poder único do nada.
M.I. - Muito melancólico na noite escura. Como é que escreveste a música? Algumas músicas têm alma própria, como o Frankenstein, mas de uma forma positiva. “A Cloak Woven of Stars tem uma melodia incrível, “A Lengthening Shadow” tem variedade, “The Curtain of White Silence” leva a um determinado território.
Muito obrigado pela descrição! Eu diria que desta vez cruzamos as fronteiras dos géneros. O GothCore já nasceu? Senão, algumas música poderiam ser o projeto. Uma tempestade de emoções, a porta para outro mundo. Lembro-me de ler comentários no YouTube sobre os primeiros singles como "Eu sinto que a música pega na minha mão e diz que está tudo bem: “Eu vou guiar-te " ou "Isto é vida" ou "Se algo pudesse atingir o coração, só poderia ser assim!”. O álbum é a prova de que ainda é possível inventar algo novo, surpreendente e diferente. É algo muito especial, incomparável para nós, que foi criado aqui. Chama a atenção. É uma montanha-russa de sentimentos. Está a construir uma ponte entre os Lacrimas e o futuro. Deixamo-nos à deriva e posso dizer com orgulho que não fizemos as coisas porque eram fáceis - mas porque eram difíceis. Para resumir: É como aproveitar a chuva. Há pessoas que sentem a chuva e outras só se molham. Este álbum é para os ouvintes que sentem a chuva!
M.I. - É o segundo álbum com o Julian, que é um cantor maravilhoso! O gajo é um camaleão! Consegue cantar tudo. De que forma é que ele te ajudou desta vez no álbum?
Absolutamente! O Julian também é um animal no palco. Ele deu-nos uma nova vida. Ele é tipo um "Homem-Aranha". Melhor, „Venom“ por causa das lentes brancas que ele usa sempre nos vídeos, e isso encaixa melhor (risos)! Ele salta sobre as barricadas e vai diretamente para a plateia, começa um moshpit, recebe arranhões e cortes, sobe as amarras e é simplesmente um cantor e pessoa maravilhosa. Mas tudo começou durante as sessões para o álbum “Bleeding The Stars” em 2018. Lá, eu ouvi o que o Julian pode fazer com a sua voz. Fiquei espantado, porque ele pode simplesmente cantar qualquer coisa. Alto, profundo, gritante, gutural. Esta oportunidade deu-me a liberdade de escrever como estava a minha cabeça, sem pensar se o cantor aguentaria ou não. Agora que o álbum está finalizado, dá a sensação de que juntamos três géneros diferentes! Quando acompanhas uma banda por um longo período, tudo soa familiar e, às vezes, focas-te mais nas semelhanças do que no impacto real de uma música. Seguimos a pergunta: O que eu quero deixar para trás se este for o nosso último álbum? A “Unseen” é uma das respostas e, provavelmente, o riff mais pesado que eu já fiz. Há 10 minutos, ensaiei a música em casa sem um amplificador, apenas com uma guitarra e esse riff principal é tão pesado, que certamente não é algo que tocarias junto a uma fogueira (risos). Esta é a música que eu mal posso esperar para tocar na plateia.
M.I. - A atmosfera gótica está muito presente. Gostas deste estilo de música? Se sim, quais bandas?
Sim, eu concordaria. Mas sabes que estamos a falar de um período de 29 anos agora. Andas em tournée, conheces outras bandas, outras pessoas, outros países, envelheces e tudo isso influencia-te e à tua arte. Começou com os The Cult e Sisters Of Mercy, em tournée conhecemos os The 69 Eyes e eu era o gajo que estava lá e assistia a quase todos os concertos deles. Esta é uma influência que levarás para casa...
M.I. - Vocês têm uma agenda preenchida, já que andarão em tournée com os Mono Inc., uma banda bem conhecida dentro da comunidade gótica na Alemanha, em festivais e serão cabeças de cartaz. Fala-nos mais sobre a tournée.
A tournée com os Mono Inc. foi muito fixe. Estes gajos e a equipa deles foram muito amigáveis. Sentimo-nos muito bem-vindos e gostamos de cada concerto que fizemos juntos. A nossa tournée como cabeças de cartaz acabou e tivemos momentos muito divertidos, stressantes, muito trabalho, risos, surpresas agradáveis e desagradáveis, alegria, suor, amizade e todo o caos maravilhoso que vem com andar em tournée.
M.I. - A banda tem quase 30 anos. Como é que se sentem? Pretendem comemorar?
Sim, queremos lançar um álbum ou EP de 30 anos. Quatro músicas já estão prontas. Depois tocar em alguns festivais. Nós apenas nos deixamos surpreender com o que o ano nos trará, como sempre.
M.I. - Obrigada mais uma vez pela tua gentileza! Desejas partilhar alguma palavra com os fãs portugueses?
Muito obrigado pelas ótimas perguntas. Obrigado por ouvirem, fazerem o download e comprarem o nosso novo álbum. Portugal está no nosso top 20 de ouvintes no Spotify, por isso espero que haja uma hipótese de nos vermos no próximo ano. Fiquem em segurança, abraços, Oliver Nikolas Schmid, Lacrimas Profundere.
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Entrevista por Raquel Miranda