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Entrevista aos Morte Incandescente



Formam um dos projetos em que confluem duas das personagens maiores do underground mais negro nacional. Morte Incandescente é o nome que reúne Nocturnus Horrendus e Vulturius. Entre ambos estão, entre outras, bandas como A Forest of Dreams, Concilium, Cunnilingus, Decayed, Irae, Kommando Baphomet, Scum Liquor, Viles Vitae, Nukke, Coldness, Corpus Christii, Maldito, Nox Inferi, Son of Cain, Storm Legion. À beira de celebrarem os vinte anos, lançaram em 2021, «Vala Comum», novo álbum de estúdio que apresentam agora em Portugal, através de dois concertos no Porto e Lisboa, com os espanhóis Velo Misere. 25 de Março no Metalpoint e 26 de Março no Side B, em Alenquer. A Metal Imperium esteve à conversa com ambos os protagonistas.

M.I. - Qual a razão de voltarem agora com um disco?

Vulturius: Não pensamos muito nisso. É quando calha. A orientação leva-nos a isso. O próximo pode ser daqui a um ano, dois ou três.
Nocturnus Horrendus: Não nos apercebemos que tinham passado tantos anos desde «...o Mundo Morreu»
V: Gravamos o split com Illum Adora, pelo meio. Entretanto tínhamos uns ensaios que até perdemos e acabamos por nunca gravar.


M.I. - Nem de cabeça recuperam essas malhas?

V: Tinha gravado os ensaios, para depois aperfeiçoar e perdi o cartão de memória com isso.


M.I. - Cruzam-se em vários projectos, quando decidem que uma composição é para Morte Incandescente (MI)?

NH: A nossa química é tão diferente uma da outra que quando nos juntamos, automaticamente começa a sair MI. Quando começa a sair um bocadinho da cena, que já aconteceu algumas vezes. O Vulturius começa a fazer um riff que é muito Irae, eu aponto e digo para dar um jeito. É raro acontecer, normalmente sai logo algo de MI.
V: Às vezes pode ser um riff tipo Irae, ou um riff Corpus Christii. Na sala de ensaios temos aquela química de MI e acho que o que conta mesmo ali o estado de espírito em que entramos que sai mesmo aquilo, sem destoar.
NH:  Acho que já sabemos o que contar, um com o outro, logo temos o mindset para o que tem de ser feito. Este álbum tem algumas diferenças, porém.


M.I. - O facto de terem diversas experiências, com vários grupos, ajuda a perceberem qual é o espaço de cada um, não é?

V: Claro, é normal. Cada um tem as suas ideias, somos amigos e respeitamo-nos. MI existe antes de Irae, é mais antiga.
NH: Temos experiência, nós os dois, a tocar em Storm Legion. Nessa altura ainda não estávamos bem familiarizados um com o outro. Já passaram vinte anos e já nos conhecemos melhor um ao outro do que conhecemos algumas namoradas.


M.I. - Descrevem este disco dentro do Old School Black Metal, mas no final da escuta até soa moderno.

NH: Acho que é por ter alguns elementos que as pessoas não estão à espera de ouvir. Se fores ver isso já foi feito nos últimos vinte anos ou mais, se calhar apenas mais desconhecido no espectro do underground. O Black Metal foi sempre experimental, na minha opinião, dentro do Metal é o estilo mais abrangente e que mais ideias podes usar. Posso fazer o que quero e me apetece. Por isso é que tens o Techno Black Metal, o Brutal Fast, o Folk Black. Há tanta coisa. Não é limitado, a cena de ser falso ou verdadeiro, tem a ver com as pessoas e não com a puta da música. 
V: Andamos a tocar Black Metal há vinte anos. Há gajos que dizem que têm uma banda de Black Metal e se calhar nunca tocaram, ou foram uma banda de Black durante dois ou três anos. Por causa disso ficaram associados a esse meio.
NH: Para estar no Black Metal é preciso ter a panache e depois ganhares a credencial. Depois tens as patentes e nós já estamos lá em cima.
V: Somos o underground.


M.I. - Essa música pode tornar-se uma espécie de hino.

V: Não se associa só a mim ou ao Nocturnus, se calhar a milhares de pessoas que andam aí há anos e anos.
NH: Conheço muito pouca banda de Black Metal que queira fazer carreira disto. Carreira no sentido de se tentar lançar, sobreviver e viver da música. Então sentem liberdade para manter as coisas mais reais, talvez. A maior parte das bandas, death e por aí, no fundo querem seguir carreira. Eu já estive nisso com Corpus, não foi propriamente planeado, aconteceu. Deixei de ter, voltou atrás no tempo e estou bem com isso. Se uma pessoa fizer como no início de uma banda, juntares-te e fazeres aquilo que tu gostas. Se fizeres a cena bem e profissional, ok. Quando MI começou, ao fim de dois ou três anos, estávamos a vender duas mil cópias. Hoje em dia para venderes isso tens de te promover um pouco mais, preocupar um pouco mais e uma série de merdas. Antigamente a música falava por si. 


M.I. - Não tens números de vendas, mas graças à internet, tens mais número de ouvintes.

V: Seguidores [risos]. Antigamente, havia o tape trading, programas de rádio, o dito underground. As pessoas ouviam três ou quatro músicas e apareciam no concerto. E compravam o disco. Hoje funciona de maneira diferente.
NH: Hoje em dia é mais exaustivo. Há muita coisa e é difícil acompanhar. O Vulturius sabe bem que eu já não falo com tantas pessoas do meio, já não tento procurar muita coisa. Não estou activo como antes. Cheguei a um ponto, algo em que eu e o Vulturius discordamos, em que há tanta coisa que começaram a sobrelotar o mercado. Não tenho falta de inspiração, podia fazer uma maqueta por semana. A qualidade tem de estar sempre ao máximo, mas fazer menos, não tenho aquela necessidade de estar sempre a gravar e fazer música. Tenho um objectivo real e sério, de estar a fazer isto quando tiver 50 e tal anos. Não quero estar a repetir merdas, a reciclar riffs.


M.I. - Isso também é ser o underground, mas no caso do Vulturius, ele pode olhar para a discografia e tocando dois discos por anos, vai demorar muito até se repetir.

V: As coisas são diferentes. Percebo perfeitamente o que ele quer dizer, mas tenho a necessidade de tocar, estar em casa e começar a gravar riffs. Gosto de estar na conversa com o pessoal, ir para um estúdio e gravar umas cenas. Às vezes sai bem, às vezes sai mal. O que não gosto, não edito. Tenho esse bichinho dentro de mim. Se um dia desaparecer, prefiro não fazer nada ou tocar cenas antigas.
NH: Estou a salvaguardar-me. Já tive um estúdio de gravação em casa e agora não tenho. Se o tivesse, ia ter o mesmo problema do Vulturius e sei que iria começar a fazer mais cenas.
Há bandas que estão quatro anos para lançar algo. Vocês, e mais três ou quatro músicos nacionais, fazem discos quase continuamente.
NH: Quando tens uma banda, tens de ensaiar, conversar, compor. Outros usam a fórmula que o Vulturius tem, a de MI, vai para estúdio, fazer qualquer cena e sais de lá com novo material.
V: Bebo um copito com o pessoal e bora aí tocar, nem que seja para a treta. Depois continuas isto ou aquilo.


M.I. - Quem vamos ver em palco.

NH: O J. Goat, tem sido sempre ele há bastante tempo. Outras vezes somos só dois, já aconteceu também.
V: Já está há dez ou nove anos, perto disso.
NH: Ainda pensei ir para o baixo e estar com ele à frente a cantar. Arranjar um novo baterista. Como há poucos bateristas, eu vou parar lá por necessidade, mas tenho saudades de tocar cordas. Precisava disso, de uma banda para tocar cordas, porque estou muito destreinado, já não me sinto confortável. Não falo de fazer outra banda, atenção, mas das que tenho. 


M.I. - Álbum cá fora, numa fase em que toda a gente está a reeditar, como estão a pensar gerir o vosso backcatalog que anda esgotado e é longo?

NH: Já está pensado e a desenrolar. Há coisas que estão dispersas e nunca saíram em CD e agora finalmente tivemos oportunidade para fazer isso. Gostávamos de também ter os álbuns em vinil. Vamos poder reeditar algumas coisas, não temos liberdade de dizer o quê, mas as pessoas sabem, pois é o que não saiu em CD, e o que não saiu em vinil, irá sair.

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Entrevista por Emanuel Ferreira