Passados oito anos desde o último álbum, os australianos The Amenta lançam o seu 4º longa-duração, Revelator. Uma obra desconcertante, negra, estranha e inquietante, com o tema da Transmutação como pano de fundo e que pouco tem a ver com os álbuns anteriores deste quinteto.
Timothy Pope (teclas) respondeu às nossas questões sobre o novo trabalho, sobre o facto de não quererem nem estarem rotulados a um género e o conceito artístico profundo que envolve a banda.
M.I.- Olá! Obrigado pelo teu tempo para responder às nossas perguntas! E parabéns pelo novo álbum! É uma besta! Pesado, emocional e multidimensional.
Obrigado pela entrevista! Estou muito feliz que gostes do álbum. Estamos contentes por, finalmente, ter sido lançado, depois de muitos anos de trabalho. Às vezes, parecia que nunca seria lançado. Por isso, agora que foi e as pessoas estão a responder tão bem, é uma sensação incrível.
M.I.- Para quem não conhece The Amenta deste lado do mundo, como descrevem a banda?
Descrever-nos-ia como uma banda de Metal Extremo. As nossas bases estão no Death e no Black Metal, mas gostamos de explorar diferentes sons e ideias que estão bem fora desses limites estreitos. Como resultado, muitas pessoas decidiram que somos uma banda industrial, mas esse não é um termo que realmente entendamos ou abracemos. No entanto, esse parece ser um termo que não podemos esquecer, não importa o quanto tentemos (mesmo lançando um álbum deliberadamente anti-industrial!). Então, talvez essa seja a maneira mais fácil de nos explicar para as pessoas. A nossa música tende a ser sombria e feia. Podemos ser rápidos e brutais, mas ultimamente temos gostado de recuar um pouco e deixar a tensão e o estranho escoar para fora da nossa música. Há muita atmosfera na nossa música e mesmo os momentos mais simples, são mutilados por eletrónica e efeitos. Em suma, fazemos música feia para tempos feios, usando qualquer instrumento ou ideia, se esta puder adicionar o elemento certo de escuridão.
M.I.- Amenta significa “Oração ou canto noturno com o qual as almas são amentadas”. Mas também pode ser o dinheiro que é dado ao padre. São religiosos? Ou veem-se como guias que devem mostrar o caminho ao rebanho? Até têm um Papa (Timothy “Pope”) na banda!
Até ler esta pergunta, não fazia ideia de que Amenta era uma palavra em português, muito menos uma que fosse tão apropriada! Isso é excelente. Escolhemos o nome Amenta por causa do seu uso na mitologia egípcia antiga, em que estávamos interessados na época, como uma metáfora para as relações senhor/escravo e declínio entrópico de civilizações mestras que víamos manifestar no mundo moderno. Em egípcio, referia-se ao submundo, onde as almas eram julgadas antes de passarem. É interessante que parece haver alguma relação entre o significado egípcio e o português.
Não sou religioso, de forma alguma, e não acho que alguém na banda seja. Não sou nem espiritual, pelo menos, não da maneira como normalmente consideramos essas coisas. Sou fascinado pela consciência e o seu mistério, mas não vejo isso, necessariamente, como uma preocupação espiritual, mais existencial. Como o Papa, um irreligioso e blasfemo, certamente não nos vejo, ou a mim, como guias. Não estamos a tentar mostrar um caminho. Estamos tentando nos entender. A arte é egoísta dessa forma. Não se trata de tornar a vida das outras pessoas melhor. É sobre o artista entender a sua própria vida. É um benefício secundário que outras pessoas possam encontrar significado nele. Por isso, não estamos a mostrar um caminho, estamos a encontrar um e todos são bem-vindos para nos seguir, se quiserem. Estamos a ir nessa direção de qualquer maneira.
M.I.- Falando agora em música… Oito anos desde o último álbum… Porquê o atraso?
Entre “Revelator” e o último álbum, “Flesh is Heir”, entramos num longo hiato longe dos olhos do público. O principal motivo foi que, após as intensas sessões de composição e gravação de “Flesh is Heir” e a digressão de promoção, estávamos completamente esgotados. Foi um processo tão árduo que, no final, estávamos completamente arrasados e sem inspiração. Resolvemos desaparecer por um tempo, para ver se a inspiração voltava. Se tivéssemos começado a trabalhar noutro álbum imediatamente, sem inspiração, teria sido uma pálida imitação dos nossos álbuns anteriores. Sempre fomos uma banda que gostou de ultrapassar os nossos limites e tentar encontrar algo novo para dizer. Repetir-nos parece barato e insatisfatório. Decidimos que preferiríamos nunca mais lançar nada novamente, a menos que encontrássemos algo que valesse a pena dizer. De seguida, desaparecemos, com o objetivo de esperar até que estivéssemos inspirados novamente.
Começámos a escrever rapidamente após decidirmos desaparecer, mas estávamos a escrever para um projeto completamente novo, ao invés de The Amenta. Por ser um projeto novo, não tinha a expetativa histórica de The Amenta e sentimo-nos muito livres. Conseguimos lançar qualquer ideia e não nos preocupar onde ela se encaixava. Como resultado, acabámos com cerca de dez músicas de coisas estranhas. Mas percebemos que parte desse material poderia representar uma direção nova e empolgante para The Amenta. Começámos a retrabalhar as músicas para encaixar com a instrumentação de The Amenta e logo as sementes de "Revelator" começaram a florescer. A demo e a gravação demoraram muito, como acontece sempre connosco, pelo fato de os elementos terem filhos ou terem mudado de país. Mas ao longo destes oito anos, estivemos sempre a trabalhar.
M.I.- Quanto tempo durou o álbum? Que restrições tiveram nas gravações, devido à pandemia e aos confinamentos?
O processo, das ideias iniciais ao produto acabado, durou, provavelmente, cerca de quatro anos. Mas, como mencionei, algumas coisas da vida atrapalharam e retardaram um pouco o processo. O processo final de gravação demorou cerca de um ano. Felizmente, a pandemia não afetou muito a escrita e gravação. Todos temos os nossos próprios estúdios e podemos gravar todas as nossas próprias partes. Todos moramos em diferentes estados da Austrália, por isso estamos muito acostumados a não poder estar na mesma sala. Onde os confinamentos e a pandemia nos afetaram, foi durante a mistura do álbum. Erik [Miehs, guitarras] começou a mistura em Londres, onde morava na altura. Quando a pandemia atingiu, teve que voltar para a Austrália pouco antes das fronteiras fecharem e teve que embalar o estúdio e enviar tudo de volta para a Austrália e instalá-lo novamente em Adelaide para tentar continuar a mistura num ambiente completamente novo. A coesão e clareza do som são um testemunho da sua habilidade e dedicação. Estou maravilhado com o que ele conquistou nessas circunstâncias malucas.
M.I.- Qual é o tema deste álbum? O que abordam? E o que significa a capa?
A chave do álbum é a ideia da interpretação subconsciente. Existem temas e ideias que estão embutidos no álbum, no entanto, não quero explicá-los, pois acredito que isso destrói a magia deles. Com os nossos álbuns anteriores, sempre escrevi letras para um tema. O tema vem primeiro e lentamente escrevo as letras para encaixar, mas o meu processo sempre foi permitir que minha mente vagueasse um pouco e sugerisse relações e temas alternativos. Como resultado, as minhas letras sempre tiveram muitas tendências e subtemas. No entanto, descobri que, quando falava sobre as letras e os temas nas entrevistas, falava sobre o tema principal e isso, gradualmente, eclipsa todos os outros temas e os subtemas desaparecem. Para mim, as letras começam em três dimensões mas, ao discuti-las, a magia perde-se e elas tornam-se planas. Desta vez, queria garantir que aquele aspeto tridimensional permanecesse, e também queria explorar mais o efeito do subconsciente.
A minha técnica desta vez, era escrever frases num livro à medida que me ocorriam. Fiz isso durante três ou quatro anos. E esse tempo permitiu-me esquecer parcialmente o significado original das frases. Frequentemente, as frases eram trocadilhos ou jogos de palavras que faziam referência aos temas e obsessões em que penso no meu dia-a-dia. Juntos, eles são um mapa de minhas obsessões subconscientes. Quando chegou a hora de colocar as letras, voltei a ler este livro para encontrar frases que pareciam encaixar-se e sugerir novos significados. Ao colocar essas frases juntas, muitas vezes escritas com anos de diferença, criei um significado “mestre”. Mas escondidos, estão todos os significados originais ocultos. Portanto, as letras apresentam uma colagem de imagens empilhadas que devem ser interpretadas. Para mim, isso significa que as letras mantiveram o seu efeito tridimensional. Para os ouvintes, espero que funcione como ver uma pintura abstrata, onde o significado não é dado, mas apenas sugerido. As pessoas são apresentadas a um caos de imagens e temas e devem permitir que as suas mentes encontrem algum tipo de ordem. Acho que a interpretação de outras pessoas sobre o significado do álbum é tão válida quanto a minha e não quero envenenar as ideias de outras pessoas sendo muito claro por conta própria.
M.I.- Porque escolheram Sere Money como primeiro single?
Sere Money era uma daquelas canções que, mesmo na fase de demonstração inicial, tinha um fogo que era imediatamente reconhecível. Nós, realmente, não partilhamos demos fora da banda, mas assim que o álbum ficou concluído, deixámos algumas pessoas ouvirem e todos eles aguçaram os ouvidos quando Sere Money começou. É uma música tão diferente para nós que sabíamos que iria surpreender as pessoas. O nosso pensamento era que se íamos voltar passados oito anos, precisavamos de voltar com uma surpresa. Se tivéssemos voltado com mais do mesmo, teria sido chato. Sere Money foi uma ótima canção para lançar porque as pessoas não tinham ideia de como o álbum seria. Se tivéssemos usado uma das faixas mais “metal” como a primeira faixa, as pessoas teriam pensado que entenderam o álbum e não haveria esse desejo de ir mais fundo. Além disso, acho que as ideias das pessoas sobre um álbum são emolduradas pelas primeiras músicas que ouvem. A primeira faixa lançada dá cor à experiência do público com o álbum. Queríamos confundir e enganar e Sere Money parecia ser a melhor música para fazer isso.
M.I.- O videoclipe desta música é sobre “transformação”. Transformação de quê?
Especificamente, o videoclipe trata da transmutação. Como mencionei anteriormente, o álbum é sustentado pela ideia de interpretação. Quando chegou a hora de fazer o clipe, o Cain [Cressall, vocais] e eu discutimos, brevemente, as ideias líricas, mas decidimos que a sua interpretação era mais interessante do que se ele tentasse criar um vídeo baseado nos meus significados. Pelo que entendi, o Cain inspirou-se na música e nas letras para examinar a ideia da transmutação pelo sofrimento. Este é um processo em que uma pessoa passa por uma provação esmagadora, que a rebaixa e desumaniza, e por isso, como resultado, ela transforma-se noutra coisa. Metaforicamente, é como o carvão sob pressão se transformando em diamante. Com os humanos, se os colocamos sob pressão, rebaixa-os, esmaga-os, o resultado é algo mais feio que o diamante. Mais uma vez, não quero revelar muito, ao invés disso, confio na interpretação, mas podem ver no clipe que os destroços do mesmo se transformaram em algo muito mais sinistro e, possivelmente, poderoso.
M.I.- Este álbum é muito atmosférico. Quem cria esses conceitos? Como é o processo de escrita? Pensam nas melodias primeiro e depois nas letras ou vice-versa?
O processo de composição dos nossos álbuns é um esforço muito colaborativo, por isso não é possível separar quem é responsável por qual parte. O núcleo criativo da banda é o Erik, o Cain e eu. Nunca fomos o tipo de banda que fica numa sala de ensaio para criar música. Vejo o nosso processo de criação quase como um lento círculo em direção a um objetivo. Cada vez que damos uma volta, chegamos um pouco mais perto. O nosso processo de escrita é escultural. Tendemos a começar escrevendo esqueletos básicos de canções. Eles serão apenas bateria eletrónica, guitarra e algumas teclas ou efeitos simples. Isso permite-nos obter uma estrutura e uma ideia básica. Então, começamos a demonstrar outras ideias, como vocais. As letras, geralmente, são escritas nesse momento e começamos a trabalhar nos vocais. Frequentemente, as ideias para vocais irão sugerir mudanças estruturais ou instrumentais, por isso, as músicas são, constantemente, separadas e reescritas. Quando os vocais são passados a demo e a estrutura das músicas é relativamente fixa, começamos a gravar, o que para nós é uma agregação lenta de sons, ao invés de todos virem gravar as suas partes. Do meu lado, sendo o tipo do teclado e das misturas, passo muito tempo construindo, testando, descartando e experimentando diferentes sons e ideias. Desta vez, usei muito menos sintetizadores e mais ruído do mundo real. Passei os pedais da guitarra por um loop de feedback, toquei uma ventoinha de metal com um arco de violino, toquei um violino através dos pedais da guitarra e todo tipo de absurdos.
Enquanto faço isso, o Erik grava as suas partes de guitarra. O Erik tem uma atração semelhante por alterar os sons do instrumento. Ele também passou a sua guitarra por uma grande quantidade de pedais. Quando se tratava da mistura do Erik, ele usou novamente todos esses pedais de guitarra em tudo, de guitarras a teclas, bateria e voz. Estamos constantemente a retrabalhar e a reutilizar as coisas uns dos outros. Por exemplo, uma das samples na introdução de Twined Towers que fiz, foi a partir de um loop da guitarra do Erik que tocava na demo. É difícil dizer quem fez o quê e quem é o responsável por cada coisa. Retrabalhamos tudo, embora seja o Erik quem deve juntar tudo no final.
M.I.- Essa atmosfera também está muito presente no visual. O videoclipe de Sere Money é um bom exemplo. Achas que essa parte é tão importante quanto a música ou é apenas um complemento para entender melhor as músicas?
Acho que os componentes visuais são inseparáveis da música. Ninguém ouve música no vácuo, todos nós usamos elementos externos para dar forma e contexto à música. Mesmo bandas que professam não se importar com o elemento visual, estão a tomar a decisão ponderada de projetar uma ideia de “anti-visual” que é uma identidade visual. É inevitável. Por isso, mais vale fazeres isso corretamente. A música é a base. É a obra de arte. Mas penso nisso como pensarias numa pintura. Um pintor pinta no seu estúdio, criando uma obra de arte que fala com ele, no momento. São tomadas decisões estéticas que definem como a obra de arte eventualmente ficará. Mas, uma vez que o ato de pintar está completo, mais decisões se apresentam. Se os artistas desejam apresentar a sua imagem ao espetador da melhor forma possível, eles devem encontrar uma moldura com uma cor e um material que complemente a imagem. De seguida, eles decidem onde pendurá-lo no estúdio ou na galeria. De que outras pinturas fica esta perto? Como é a luz? Todas essas coisas contribuem para a nossa apreciação da obra de arte e, talvez não para os artistas, mas para os espetadores, tornam-se inseparáveis da própria obra de arte. Com a música, é o mesmo. Escrevemos uma música, mas devemos pensar sobre como essa música é apresentada. Um ótimo elemento visual pode elevar uma música. Um pobre elemento visual pode manchá-la. Por isso, acho que para responder à questão de se isso é tão importante quanto a música, diria que para o ouvinte/espetador, sim, é tão importante. Para o artista, acho que é uma preocupação secundária, mas altamente necessária.
M.I.- De onde tiram as vossas influências?
Temos a tendência de falar sobre inspiração, em vez de influência. As pessoas que acho mais inspiradoras estão nesta banda. Estamos, constantemente, a tentar surpreender-nos com novas ideias. Nada é mais inspirador do que quando alguém surge com uma ideia que parece estar repleta de possibilidades. Acho que é o combustível subjacente para esta banda. É assim que podemos continuar a escrever músicas e garantir que nossos álbuns sejam todos interessantes e únicos. O porreiro sobre o Erik, o Cain e eu, é que todos temos gostos completamente diferentes quando se trata de arte e música. Existem diferentes cruzamentos de estilos muito fortes, mas estamos todos em busca de coisas novas para nos manter entretidos e tenho a certeza que algumas das músicas e artes que gosto seriam consideradas terríveis pelos outros e vice-versa. Mas quando nos reunimos para escrever, todas essas inspirações são internalizadas e alteradas por meio de alguma alquimia estranha. Por isso, quando escrevemos música, posso ficar maravilhado com as ideias deles. Mesmo que todos tenhamos diferentes esferas de inspiração, acho que estamos motivados para fazer música sombria e feia e essa parece ser a área comum de onde vem a nossa música, não importa onde a inspiração inicial tenha começado.
M.I.- Lançaram o vosso primeiro álbum em 2004 (embora tenham o EP de 2002). Isso significa que fazem isto há mais de 20 anos. Como foi a viagem até agora? Como foi a vossa evolução como banda?
É uma loucura para mim pensar que já passaram 20 anos. Ainda me sinto como o jovem de 17 anos que entrou para esta banda. Eu faço 40 anos, este ano. Conseguimos coisas incríveis com esta banda, coisas que nunca pensei que faria e acho que temos muito mais a fazer. Olhando para trás, de onde estávamos até onde estamos agora, é bastante surreal. Estranhamente, não acho que o nosso processo tenha, realmente, mudado. Sempre tentamos fazer exatamente a mesma coisa: criar música extrema e manter-nos entretidos e animados. Qualquer evolução que experimentamos é devido a esse impulso de nos mantermos entretidos. Nós - e acho que a maioria das pessoas, também - ficamos entediados por ficar no mesmo lugar. Por isso, a nossa evolução é algo que deve acontecer, se quisermos continuar. De contrário, separaríamos a banda e faríamos algo mais interessante.
M.I.- Vocês gostam de se reinventar a cada álbum. É algo natural ou querem afastar-se de rótulos e ligações com um estilo/género?
É um processo completamente natural, ligado ao que discuti antes. Quando escrevemos música, não estamos a tentar escrever uma música de death metal ou black metal. Acho que com a maioria dos artistas, provavelmente, é semelhantes. Se definires um limite para ti mesmo, dizendo que vais escrever um riff de death metal, então já estás a limitar a tua expressão. É melhor não pensar em termos de género. Quando escrevemos, pegamos numa guitarra ou outro instrumento e improvisamos e experimentamos. Quando descobrimos, por meio de um acidente feliz e de uma ideia interessante, isso torna-se a centelha que pode alimentar uma música inteira. Não pensamos sobre que "tipo" de música é, apenas que é emocionante. A forma como estamos programados significa que as coisas que consideramos interessantes são as novas ideias. Quando criamos um riff que soa muito como algo que já gravamos, ele não tem aquela centelha empolgante. Parece chato. Mas quando temos uma nova ideia, que soa diferente de tudo que já fizemos, é quando toda a banda fica animada. Ao perseguir essa emoção, naturalmente afastamo-nos da música que já fizémos e encontramos uma nova direção para cada álbum. Acho que é um aspeto fundamental desta banda. Sem esse impulso, não seríamos capazes de escrever nenhum álbum, pois ficaríamos muito entediados.
Quando escrevemos música, não lhe damos nenhum rótulo. Não pensamos numa música em termos de estilo e género. Elas apenas devem ter a sua própria lógica e soar “corretas”, que é o termo que usamos para decidir quando algo funciona bem. Os géneros não pertencem aos artistas; são termos usados por críticos e ouvintes para compreender e apresentar uma obra de arte a outras pessoas com um mínimo de explicação. Dá uma ideia aproximada de um som. Para um artista, um género é quase inútil. Fazemos música feia e sombria. Isso é tudo o que chamamos. Podes, então, decidir como lhe desejas chamar. Isso não muda nada.
M.I.- Ainda é cedo, mas ... Já pensam no próximo álbum?
Estamos sempre a pensar e a planear os próximos lançamentos. Temos alguns fragmentos de ideias que podem formar as sementes do próximo trabalho. Também estamos a trabalhar noutra coisa - não num novo álbum, mas em algo ligado ao “Revelator” que deve ser concluído nos próximos meses. Feito isso, entraremos nas ideias para o próximo álbum de maneira adequada. Estou animado para começar a escrever novamente. Normalmente, depois de um lançamento, há uma certa calmaria em que todos estão cansados e, por isso, leva um tempo para recuperar a inspiração, mas desta vez posso sentir que estamos todos prontos e animados para começar.
M.I.- Houve várias mudanças na formação ao longo dos anos. Nas vozes, o Cain já é o terceiro a ocupar o lugar. Isso, de alguma forma, limitou o vosso crescimento?
Às vezes, as mudanças na formação são por causa do crescimento. Precisamos de fazer certas coisas, seja em digressão ou composição musical, que os membros não se podem comprometer. Mas sempre inibe os planos quando procuramos novos elementos. Tivemos muita sorte em encontrar o Caim. Ele interveio para substituir o nosso segundo vocalista, Jarrod e saltou diretamente para uma intensa digressão pelos Estados Unidos, em 2009. Desde então, o Cain tornou-se um membro inestimável da banda. Ele juntou-se ao Erik e a mim como membro da equipa criativa principal. A sua contribuição artística ajudou a moldar os lançamentos dos quais ele fez parte. Sabiamos, desde a primeira vez que vimos o Cain tocar ao vivo, que precisávamos dele na banda. Fizemos um concerto em Perth, onde ele mora, e ficamos na casa dele porque era amigo de outros amigos nossos. Ele foi um ótimo anfitrião, demo-nos muito bem, mas o nosso amigo disse: “Vocês têm que ver esse tipo no palco. Ele é um animal ”. Não conseguiamos entender como esta pessoa educada e amigável podia ser tão louco no palco como o nosso amigo sugeriu. Fizemos o concerto em Perth e com a banda do Cain, Malignant Monster, como suporte. Ele subiu ao palco, todo sujo, a murmurar no microfone como um esquizofrénico e então gritou “CADA CÃO TEM O SEU DIA!” e começaram a primeira canção. O Erik e eu ficamos maravilhados e decidimos que teríamos de tê-lo em The Amenta, se algo acontecesse com o Jarrod. A sua entrada na banda foi um grande passo para nós e ao invés de limitar o nosso crescimento, permitiu-nos chegar mais perto da visão que tínhamos para a banda.
M.I.- É fácil ser uma banda de metal na Austrália? Como é a cena de Death Metal Industrial australiano? Que outras bandas, até mesmo de metal em geral, recomendas?
Acho que a Austrália é um dos lugares mais difíceis para se ter uma banda de metal (fora da Arábia Saudita ou um daqueles países onde podes ser preso por blasfémia, é claro). A Austrália é uma fina camada de civilização em torno de um enorme deserto. Há viagens de carro de 12 horas entre as grandes cidades e populações muito pequenas fora delas. Por isso, fazer uma digressão aqui é caro e difícil. Viajar internacionalmente também é seriamente caro, pois temos de voar do lado negro da lua para um país realmente civilizado.
Não conheço nenhuma cena de Death Metal Industrial da Austrália. Não nos consideramos uma banda industrial, por isso, não temos a ligação mais estreita com nenhuma cena. Obviamente, existem bandas como The Berzerker que são amigos e com as quais já fizemos digressões. Há um novo projeto porreiro de um amigo nosso chamado Monsters Around Us que é uma mistura interessante de sintetizadores e com Godflesh. Fora isso, gosto muito do novo álbum de Spire. Vale a pena aprofundarem os nossos amigos de Werewolves, Psycroptic e Ruins. E Nazxul mudaram, o que é muito emocionante.
M.I. - Mudaram, agora, de editora para a Debemur Morti Productions, encerrando o relacionamento que tinham há muitos anos com a anterior. Porquê?
Gostámos, realmente, de trabalhar com a Listenable Records. São uma excelente editora, ótimas pessoas e bons amigos. Quando lançámos “Flesh is Heir”, em 2013, esse foi o último álbum do nosso contrato de 3 álbuns, por isso, estávamos sem contrato. Ao mesmo tempo, entrámos num hiato para descobrir a nossa nova direção. Quando voltámos, falámos com a Listenable e eles estavam interessados no novo álbum, mas também queríamos ver se valeria a pena tentar algo diferente para essa nova fase da banda. Tinhamos uma lista muito curta de editoras que gostávamos e bem no topo da lista estava a Debemur Morti Productions. Adoramos o portfólios deles, lançaram algumas músicas com visão e o seu foco parecia ser muito artístico, ao invés de apenas descaradamente comercial, ao contrário de muitas outras casas. Também tinhamos alguns amigos que trabalharam com a editoras, como Ruins & Ulcerate e que todos disseram que foi um prazer trabalhar. Entrámos em contato com o Phil da editora e adoramos a sua atitude em relação à música e à arte. Embora tenha sido triste sair da Listenable, não poderiamos ter imaginado um parceiro melhor para esta fase da banda. A Debemur Morti tem sido incrível para nós e estamos ansiosos para trabalhar muito mais com eles.
M.I.- Já fizeram alguns na Europa. Conhecem Portugal?
Ainda não tivemos o prazer de tocar em Portugal, mas adoraríamos. Tenho amigos que tocaram aí e disseram que é incrível. Infelizmente, as nossas digressões ainda não chegaram aí. Espero que em breve aconteça. Eu nunca estive, mesmo fora da banda, por isso, adoraria ir até aí.
M.I.- E bandas portuguesas?
Obviamente, conheço Moonspell. Costumava ouvir muito “Under the Moonspell” e “Wolfheart”. Conheço Ava Inferi, mas fora isso, confesso que não sei muito. Envia-me algumas recomendações nas nossas contas de social media. Estou sempre atrás de uma boa música nova!
M.I.- Onde podemos encontrar a vossa música e comprar os vossos álbuns?
Podem encontrar a nossa música no nosso Bandcamp: theamenta1.bandcamp.com ou podem conferir a Debemur Morti Store para CDs, LPs, cassetes e t-shirts de “Revelator”. www.debemur-morti.com/en/512-the-a-a-shop.
Também podem encontrar lançamentos mais antigos na Listenable Records: www.shop-listenable.net/en/152_the-amenta
M.I.- Última pergunta e para ser um pouco diferente… Qual é a coisa menos metal que ouves?
Eu ouço muita música e uma grande parte dela não é metal. Gosto de todos os tipos de música, do jazz ao noise, do folk ao techno. Acho que se fosse pegar em algo de tudo isso que é “menos metal”, vou sugerir “Laughing Stock” do Talk Talk. É completamente não metálico... na verdade, trata-se mais do silêncio do que do som. É um álbum muito silencioso e hermético, que é o oposto das pontas mais extremas do espectro, onde eu gosto de ter o meu cérebro e orelhas abertas. É um banho quente em melancolia. Os últimos três álbuns de Talk Talk e o único álbum solo do seu vocalista, Mark Hollis, são brilhantes, de maneiras diferentes. Recomendo-os vivamente.
M.I.- Quase a acabar… Últimas palavras para os nossos leitores?
Obrigado por lerem esta entrevista! Ouçam o nosso novo álbum “Revelator” se gostam de música estranha e feia. É escura e desagradável e acho que vão gostar.
M.I.- Mais uma vez, obrigado pelo teu tempo. Espero ver-vos um dia nos palcos portugueses. Fiquem seguros.
Obrigado pela entrevista! Espero ir aí em breve.
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Entrevista por Ivan Santos