Com quase 30 anos de vida, os Gravewurm são um caso sério de longevidade do black metal underground, mantendo-se sempre fiéis às ideias que os fizeram fundar a banda, recusando ombrear com os outros grandes nomes do género, como Emperor, Burzum ou Dimmu Borgir. O mês passado, os Gravewurm lançaram Night Creatures, o seu 17º longa duração e... o 2º álbum este ano! Aliás, a facilidade de escrita de canções e o número elevado de lançamentos em quase 3 décadas, é uma das principais características da banda e, principalmente, do seu fundador.
Foi precisamente ele, Funeral Grave (Vocais e Guitarras), que nos falou destes 2 novos álbuns, da história do grupo e dos problemas com os inúmeros membros que passaram pela banda.
M.I.- Olá! Obrigado pela entrevista! É ótimo ter um dos maiores nomes do black metal americano a responder às nossas questões!
Obrigado pelo interesse em GRAVEWURM!
M.I. - Para os nossos leitores que não conhecem Gravewurm… Como caracterizas a banda e o que vos diferencia dos demais do black metal?
Temos mais influências do black metal da primeira onda nos anos 80 do que da segunda onda nos anos 90 e parte disso está presente em certas músicas. Raramente usamos blasts e os nossos vocais são bastante claros. As influências do heavy metal tradicional estão aqui e ali, também na estrutura da maioria das músicas, mas alteramos as coisas quando o sentimento pede.
M.I. - A banda começou como Dominion... Porque decidiram mudar de nome?
Em 1993, eu (Funeral Grave) tornei-me o principal compositor e sempre fui influenciado por temas fantásticos, mais malignos e sombrios. Isso, juntamente com a descoberta de bandas como Beherit, Goatlord, Funeral Nation, Burzum e Emperor, ajudou a inspirar o clima da música que criava. Achei que a mudança de nome foi apropriada, já que o tema principal da banda mudou o suficiente para não ser mais doom / death.
M.I. – Lançaram o primeiro álbum 8 anos após a primeira demo. Porque demorou tanto tempo?
A nossa música era extremamente primitiva e crua. Não havia nenhum interesse das editoras. Naquela época, quando uma banda underground tinha um contrato com uma editora, sabias que era algo muito bom e nós ainda não estávamos nesse ponto, no que toca a escrever músicas. No entanto, o primeiro álbum consiste em canções da demo de 1995/1996. Depois disso, só demorou mais alguns anos para encontrar uma editora disposta a arriscar na nossa música.
M.I. - Depois da primeira demo, alguma vez pensaste que continuarias a tocar passados 30 anos? Nessa altura, quais eram os sonhos daqueles jovens?
Sim, nunca pensei muito no futuro naquela época. Era só escrever, gravar, lançar outra demo / conjunto de músicas e tentar fazer alguns concertos. Havia troca de cassetes e entrevistas em zines eram um bónus. Realmente, nunca pensei no futuro e só comecei a planear as coisas em meados dos anos 2000.
M.I. – Vocês passaram por muitas mudanças na formação. Porquê? Diferenças criativas? Estilos e abordagens musicais diferentes? Ou algo mais profundo?
As pessoas mudam-se ou desinteressam-se em tocar ou em serem responsáveis por outras coisas além de apenas aparecer e tocar.
M.I. - As constantes mudanças na formação afetaram muito a vossa carreira?
Isso foi um grande problema para a banda e ainda é uma preocupação hoje em dia. Para uma banda que existe oficialmente sob o nome de Gravewurm, desde 1993, nós realmente não fizemos assim tantos concertos e apenas realizamos pequenas tours e alguns festivais.
M.I. - Sempre foram uma banda que lança muito material. Todos os anos, algo novo aparece. Este ano, voltaram a fazer algo que já tinham feito em 2010 e lançaram 2 álbuns! Para vocês, é assim tão fácil criar música?
Estou sempre a escrever e a gravar. Mas diminui a velocidade nos últimos anos. O álbum Funeral Rites foi escrito nos primeiros meses de 2019, mas só consegui reservar o estúdio no final do ano e nessa altura, já tinha planeado um novo álbum a ser lançado em janeiro de cada ano (nos últimos anos).
M.I. - Qual foi a razão de ter dois lançamentos este ano em vez de os distribuir em momentos mais espaçados?
Por causa do bloqueio do Covid-19 e da falta de concertos, houve mais tempo para escrever. Decidi quebrar o ciclo de lançamentos de janeiro e lançar Night Creatures em julho, uma vez que estava pronto.
M.I. - Qual é a diferença entre os dois álbuns?
Funeral Rites é black thrash agressivo, mais direto e influenciado pelo doom. Night Creatures tem uma atmosfera mais black metal e influência do metal do início dos anos 80. Mas, no fundo, Gravewurm é Gravewurm. Nunca nos afastamos muito do som e dos conceitos criados para a banda há tantos anos.
M.I. - Como foi a receção aos dois álbuns?
Aqueles que os compraram, gostaram muito deles.
M.I. - Com as restrições impostas pela pandemia, o processo de gravação sofreu alguma alteração? Como gravaram Night Creatures?
Night Creatures foi gravado DIY (Do It Yourself, ou Faça Você Mesmo) com o meu equipamento doméstico. Gosto do processo e de poder levar o meu tempo para fazer as coisas exatamente da forma que quero, sem me preocupar com o custo de um grande estúdio.
M.I. - Como irão promover o álbum? Planos?
A promoção é feita, principalmente, online. Facebook e webzines são as principais fontes.
M.I. - Com tanto material (álbuns, splits, compilações, EP`s... 30 em 20 anos!) a sair em tão pouco tempo, não têm medo de cansar os fãs? Ou pior, negligenciar a qualidade das músicas em detrimento da quantidade?
Não tenho a certeza se as pessoas estão cansadas de nós, mas recebemos ofertas de outras editoras para fazer relançamentos. Por isso, é bom que haja outros que acreditem na nossa música.
M.I. - Em 2006 e 2007, os Gravewurm lançaram uma série de splits com outras bandas como Suicidal Winds, Hekseri ou Nunslaughter. Como é que isso aconteceu? Qual foi o teu preferido?
As canções escritas nessa altura eram, especificamente, para lançamentos separados. Já havíamos lançado vários álbuns completos, mas queríamos partilhar algumas coisas com bandas de quem gostávamos. Acho que o split com Nunslaughter foi muito especial, já que eu sou amigo deles desde 1993 e porque foi um pacote de luxo, desenhado, especialmente, para o Halloween. E foi lançado no 30º aniversário de Nunslaughter. Também foi reimpresso como Picture Disc (disco de vinyl, com imagens impressas na sua superfície).
M.I. - De onde vem a tua inspiração e quais bandas mais ouves?
Ainda sou influenciado pelas mesmas bandas que amo e que ouvi pela primeira vez nos anos 90: Goatlord, Beherit, Venom, Sodom, Hellhammer, Cathedral, Asphyx.
M.I. - A banda começou em 1992 e lançou o primeiro album em 2000. Nesses quase 30 anos, certamente houve muitos altos e baixos. Quais foram os maiores pontos altos e baixos da vossa carreira?
Alguns destaques incluem digressões na Finlândia e Itália, dando concertos com Angelcorpse e Negative Plane. Tocar no festival Hells Headbash 2 em 2015.
Os pontos mais baixos foram quando tivemos que cancelar concertos por causa de ex-membros que tiveram problemas com a lei e foram para a cadeia.
M.I. - Com tantas músicas, como fazem a seleção para os concertos?
A lista tem cerca de metade das canções que são habituais desde meados dos anos 2000, quando o número de concertos começaram a aumentar e a outra metade muda, dependendo dos álbuns / lançamentos que estamos a promover nessa digressão.
M.I. Vocês fazem parte daquela segunda geração que contribuiu para o black metal moderno, como Burzum, Emperor, Mayhem, Immortal Dimmu Borgir... O que faltou para aparecer ao lado desses nomes? Não era falta de qualidade com certeza. Ou nunca sair do underground foi sempre o plano?
Nunca usámos pinturas corporais ou "armaduras de batalha" e tínhamos um som mais dos anos 80 do que aquelas bandas da segunda onda já mencionadas. Nunca estivemos ombro a ombro com os nossos colegas dessa época ou até de hoje. A influência de bandas como Goatlord e Hellhammer foi mais do que apenas musicalmente. Foi também uma sensação geral de ser. Não nos importamos em abandonar o underground, nem nos esforçamos para fazê-lo. Queríamos apenas criar músicas de que gostássemos e se outros também gostassem, isso era porreiro.
M.I. – Sempre foram uma banda underground. Como é que esse cenário mudou nas últimas 3 décadas?
Parece que a maioria das coisas funciona em ciclos. O DIY era a norma nos primeiros tempos. Depois, as bandas começaram a querer ser mais profissionais e agora parece que o DIY está de volta, com equipamentos de gravação doméstica, usados por muitas bandas underground.
M.I. - Dentro do género, achas que o fato de serem americanos é, de alguma forma, uma desvantagem? Porque quando pensamos em black metal, geralmente pensamos na Escandinávia. Acha que é porque eles são mais dogmáticos, por exemplo? Porque, além da música, trabalham mais a imagem e "levam mais a sério o anticristianismo"?
Nos anos 90, isso poderia ser considerado uma desvantagem, mas acho que o black metal americano já percorreu um longo caminho desde então. Há bandas excelentes e boas inovações e criações.
M.I. – Vocês têm a vossa própria editora – a Funeral Empire Records. Isso certamente dá-vos mais liberdade. Algum plano para expandir esse negócio e assinar outras bandas?
Talvez, no futuro. Eu fico sempre de olho nalguma banda nova de que eu goste, mas a maioria dos meus interesses está no passado.
M.I. - Toda esta história da Covid-19 atingiu-vos forte? A vossa vida mudou muito? Ou estão apenas à espera, com calma, que tudo isto passe?
Desde que me mudei para Cleveland, Ohio, há 6 anos, que o trabalho tem vindo e ido. Estou ansioso para ver bandas locais e ir em digressão quando tudo isso tiver passado.
M.I. – Têm concertos planeados para este ano? Ou, com o estado de pandemia, já só pensam apenas em 2021?
Todos os nossos planos estão em espera até 2021.
M.I. - Estamos quase a terminar… Últimas palavras para os nossos leitores?
Muito obrigado por esta entrevista. As pessoas interessadas no nosso estilo do velho black metal podem-nos seguir no Facebook e na página da banda. Em https://gravewurm.bandcamp.com.
M.I. - Mais uma vez, obrigado pelo teu tempo. Mantenham-se fortes por mais 3 décadas!
Felicidades!
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Entrevista por Ivan Santos