Desde a sua génese que o nome Mayhem é sinónimo de liberdade. Liberdade criativa, espiritual e acima de tudo de fazerem o que bem lhes “der na cabeça”, graças a um certo espírito anárquico e rebelde dos seus integrantes. Espírito esse que foi um dos grandes impulsionadores, se não o maior, da segunda vaga de black metal que assolou a Noruega, nos anos 90. Mas se é verdade que foram trabalhos como "Deathcrush" ou "De Mysteriis Dom Sathanas", que lhes permitiram ganhar uma assinalável legião de fãs, também é inegável que essa “bitola” condicionou todos os lançamentos seguintes do coletivo norueguês. Consequência disso, bons discos como "Esoteric Warfare" ou até mesmo "Grand Declaration of War" foram de certa forma renegados e postos de parte, apenas porque os Mayhem quiseram continuar a dar largas à sua criatividade, imprimindo outro tipo de influências no seu black metal.
Daí que ao escutar "Daemon", o novo disco dos Mayhem, fica a ideia que a banda finalmente sucumbiu aos desejos dos seus fãs mais saudosistas e, aproveitando a boleia da tournée de De Mysteriis Dom Sathanas, criou um álbum bem reminiscente desse icónico disco. Algo que seria bastante desapontante não fossem dois “pequenos pormenores”. Primeiro, segundo consta este regresso às bases foi feito também a nível mental pelos seus integrantes, tentando recuperar em estúdio, o mesmo mindset que lhes permitiu gravar o álbum de 1994. Segundo e mais importante… "Daemon" é um trabalho e tanto.
As semelhanças começam logo, nos primeiros segundos de "The Dying False King". Assalto de bateria, ambiência obscura, Attila a alternar as suas vozes ríspidas com cânticos demoníacos e o baixo a emitir uma sonoridade melódica, ao mesmo tempo que Teloch e Ghoul infestam a composição com os seus riffs infernais. No fundo, quase a fazer lembrar "Life Eternal" do supracitado De Mysteriis. Com isto o mote está dado, porém "Daemon" é também mais do que isso. Não sendo propriamente música catchy, existe de facto alguma melodia que emana das guitarras, que acaba por ser a grande base destas malhas, tornando temas como "Aeon Daemonium" ou "Worthless Abominations Destroyed" algo orelhudos, tendo este último sido mesmo escolhido para tema de apresentação do álbum.
Com uma banda em excelente forma, tanto a nível instrumental como vocal (talvez a melhor prestação de Attila, num disco de Mayhem), "Daemon" afigura-se como um dos grandes discos de 2019, invocando um passado já distante, sem que pareça de alguma forma datado. Poderá não ter uma "Freezing Moon", no entanto talvez os Mayhem tenham conseguido o tónico, para agradar tanto a novos fãs, como à velha guarda. Veremos.
Nota: 8.5/10
Review por António Salazar Antunes