Quando a organização do SWR Barroselas Metalfest divulgou o cartaz para a sua vigésima segunda edição, foram muitas as vozes que se ouviram sobre a alegada falta de qualidade do alinhamento, a ausência de nomes de topo nas diversas sub-categorias do heavy metal, que havia muito melhor escolha fora de portas, etc...
Mesmo apesar desta barragem de críticas, quando o festival abriu as suas portas, às 17 horas de dia 26 de Abril, a afluência de público era já interessante, e isso foi visível quando os Analepsy tomaram posição no palco principal. Regressados de uma mini-tournée pelo Japão, deram um excelente concerto nos 45 minutos que lhes foram atribuídos, contando, como tem sido hábito, com a ajuda de Sérgio Afonso, vocalista de Bleeding Display.
No palco secundário, o trio lisboeta Morte Incandescente trazia o seu black metal até Barroselas, com a tradicional presença de J. Goat no baixo, ele que acompanha a banda em concertos ao vivo. O som não ajudou uma das mais reconhecidas bandas portuguesas de black metal fora de portas, mas o público não se cansou de os apoiar.
Da Alemanha para o palco principal, os Venenum deram um excelente concerto, alicerçado no disco de 2017, "Trance of Death", cujas faixas de mais de 6 minutos permitiram a criação de uma espectacular atmosfera por toda a sala.
No palco secundário entravam em acção os italianos Grime, eles que tinham levantado muitas sobrancelhas aquando do Barroselas XVIII (2015). Mais uma vez, o sludge doom do trio liderado por Marco Matta encheu o recinto adjacente ao palco, com muita gente a reagir da melhor maneira aos temas do já velhinho "Circle of Molesters".
Mas a grande surpresa do primeiro dia viria à passagem das 22 horas, com a entrada em palco dos norte-americanos Midnight. Uma hora de concerto absolutamente devastadora, com um black speed metal de primeira água. O baixista Athenar é responsável por tudo o que tem a ver com a gravação dos discos da banda, mas ao vivo recebe a ajuda - e que ajuda! - do baterista SS e do guitarista Commandor Varik, e parece que o inferno subiu à superfície. Ainda em digressão a promover "Sweet Death and Ecstasy", foram os clássicos "Endless Slut" e "Black Rock'n'Roll" que fizeram com que o crowd surfing atingisse proporções até então nunca vistas.
Enquanto larga facção do público debandou para jantar, muitos decidiram ficar pelo palco secundário para assistir aos franceses Sublime Cadaveric Decomposition e o seu death grind, mas a verdade é que na cabeça de muitos, o que interessava era prepasrar corpo e espírito para as últimas três bandas do dia.
Os norte-americanos The Black Dahlia Murder começaram por ser um colectivo de deathcore, mas hoje em dia estão mais para os Cannibal Corpse do que para o universo hardcore. “Widowmaker” fez iniciar a festa, com um Trevor Strnad muito comunicativo, e de t-shirt dos Analepsy vestida, bastante contente com a reacção do público ao som da banda. Destaques para “Jars” e “Nightbringers”, com mosh gigantesco pela sala toda.
O encerramento do Palco 2 foi feito ao som dos Skull Fist e o seu speed metal. Os canadianos tinham muitos fãs na sala e a sua actuação foi bastante caótica, com muita gente a querer juntar-se a eles no palco e na zona a ele adjacente, enquanto acompanhavam cada riff com punhos no ar e muito encontrão.
Já a noite ia longa quando os Godflesh encerraram o primeiro dia do SWR Barroselas Metalfest 2019. Justin Broadrick e G. C. Green estiveram pouco comunicativos, como é seu apanágio, deixando faixas como “Post Self”, “Defeated” ou "Like Rats" falar por eles. O público aguentou estoicamente e no final despediu-se da banda de Birmingham com uma merecida e longa salva de palmas.
Dia 2
Sol e muito calor em Barroselas parece estranho mas foi o que tivemos este ano. A chuva esteve arredada do Minho e tornou a estadia muito mais agradável. O segundo dia começou no palco secundário com os ingleses Vacivus, que apresentaram um death metal clássico, lento e potente como convém. Com Nick Craggs a parecer uma fera enjaulada, foi um ponto de partida para um excelente dia para os amantes do metal mais pesado.
O palco principal abriu com as lendas do death grind nacional Namek. Ainda sem muita gente para os aplaudir, mesmo assim não deixaram de mostrar o que valem, e Barroselas acabou por testemunhar uma das poucas vezes que a banda decide sair do interregno que vivem de momento.
O black metal dos noe-zelandeses Barshasketh, que agora assentam arraiais na Escócia, foi recebido com alguma indiferença pelo público que teimava em aproveitar o sol fora do recinto, mas quem marcou presença teve como bónus um excepcional concerto, baseado quase inteiramente no seu novíssimo LP homónimo.
A tarefa seguinte afigurava-se difícil, pois os finlandeses Demilich actuavam no palco principal ao mesmo tempo que os nacionais Son of Cain faziam o mesmo na tenda à entrada do recinto. Banda de culto do death metal internacional, fruto da edição do único disco "Nespithe" e consequente término da banda, os Demilich deram um show em Barroselas, especialmente para quem decidiu ficar a ver a rara oportunidade de ter o quarteto em frente a si num palco.
Alexandre Mota e Hugo Conim tinham uma plateia repleta de amigos e conhecidos para os apoiar na promoção das músicas de "Closer to the Edge" e não se fizeram rogados. Excelente momento de rock'n'roll crú e duro, made in Portugal!
O stoner rock dos Dopelord pareceu encaixar perfeitamente em quem vinha de ver os Son of Cain, e a banda polaca mostrou a qualidade sónica dos seus três discos, «Magick Rites» de 2012, «Black Arts, Riff Worship; Weed Cult» de 2014, e o mais recente «Children Of The Haze». Ambientes a raiar o psicadélico e muita improvisação em palco, o que pareceu agradar a plateia presente.
Mal terminou o concerto no palco secundário foi possível assistir à primeira correria do festival até então, e o facto não era para menos: teríamos Benediction dentro de poucos minutos. A sala encheu num ápice e quando a banda de Dave Hunt iniciou “Divine Ultimatum”, não mais parou de se movimentar ao som dos britânicos, que celebram 30 anos de actividade este ano. Clássicos como “Nothing On The Inside” ou “The Dreams You Dread” tiveram sempre stage diving e mosh pits enormes a acompanhar, com muitos dos presentes a entoar as faixas a plenos pulmões. Simplesmente brilhante!
Os norte-americanos Imperial Triumphant impressionaram no palco secundário pelo uso das já tradicionais máscaras douradas, mas também pela maneira tão sui generis de fazer black metal, claramente a beber nas influências de jazz dos seus integrantes. Oriundos de Nova Iorque e com o novo disco "Vile Luxury" na bagagem, surpreenderam pela positiva.
O concerto de Benediction só não foi o melhor do segundo dia do Barroselas MetalFest porque ainda teríamos Saint Vitus no palco principal. Oriundos da Califórnia e a comemorarem 40 anos de actividade, os cabeças-de-cartaz do festival são considerados um dos pais do doom metal e criadores do som que degenerou hoje em sub-categorias como o sludge e o stoner. Desde 1981 que o guitarrista Dave Chandler tem guiado os norte-americanos pelo bom caminho, e desde quie em 2015 o vocalista original Scott Reagers regressou aos Vitus, parece que a banda está cada vez melhor. Com novo álbum "Saint Vitus" no horizonte, a performance foi simplesmente fantástica, passando em revista a carreira da mítica banda, com destaque para “WhiteMagic/Black Magic”, “One Mind” ou “Remains”. Barroselas agradeceu de pé aquele que foi, até então, o melhor concerto do evento.
DIA 3
O terceiro dia iniciou-se no palco secundário com os canadianos Auroch e o seu death metal claramente influenciado pelo som da Flórida. Pouca gente ainda no recinto mas que não deixcou de apoiar a banda.
O palco principal arrancou às 19 horas com os portugueses Martelo Negro, que fizeram uma excelente prestação, alicerçada em “Parthenogenesis”, o disco deste ano. Destaque ainda para a presença da Carina dos Disthrone para a vocalização de uma das malhas com que o público foi brindado.
No palco secundário foram poucos os que decidiram assistir ao noisecore das brasileiras Rakta. O duo paulista encheu a sala de temas experimentais, baseados na distorção de som e voz, que pareceu completamente desfazado do restante cartaz do festival. Mesmo assim, é sempre interessante ver a fusão de estilos que cabem dentro deste evento.
Pela quarta vez presentes em Barroselas, os madrilenos Wormed trouxeram para o palco principal o seu death metal melódico, para gáudio de muito público que atravessou a fronteira para apoiar os seus conterrâneos.
Difícil explicar a razão pela qual os Arkhon Infaustus actuaram no palco secundário, eles que assinaram um mini-CD que em 2018 ficou na retina de muita gente. Os franceses são impecáveis no black death metal e Barroselas teve 45 minutos de magia. DK Deviant é uma presença em palco a ter em conta e a performance da banda gaulesa foi acompanhada atentamente por uma sala secundária apinhada.
O palco principal continuou a receber death metal, desta vez pelos suecos Vomitory, eles que voltaram ao activo este ano, mas que por não ter ainda novidades discográficas, incidiram a sua actuação em “Opus Mortis VIII”, de 2011.
Se o som das paulistas Rakta parecera desadequado no sentido mais lato do festival, podemos dizer o mesmo dos seus conterâneos Deafkids. Com faixas experimentais a lembrar Ministry ou até Aphex Twin, não foi surpresa ver muita gente a preferir reabastecer o estômago enquanto se preparavam para o que ainda aí vinha.
E quem veio foram mesmo os Craft, que começaram a sua performance quando ainda ecoava som da sala secundária. A promover "White Noise And Black Metal", o seu primeiro disco nos últimos sete anos, os suecos liderados por um algo tímido Nox hipnotizou o público, que parecia mais em estado contemplativo pela rara oportunidade de ver esta excelente banda de black metal ao vivo do que se mexer na plateia. Um grande concerto ao nível sonoro, se bem que se notou a falta de palco da banda.
O encerramento do palco secundário para a edição deste ano do Barroselas Metal Fest teve o melhor concerto de todo o festival. As brasileiras Nervosa chegaram, viram, tocaram e levaram tudo à frente com um thrash metal feroz que levantou muita poeira. A promover pela Europa "Downfall of Mankind", Fernanda Lira e companhia estavam visivelmente agradadas com o efeito demolidor que estavam a causar na plateia, agarrando pelos colarinhos tudo e todos enquanto aceleravam em faixas como “Raise Your Fist!” ou “Masked Betrayer”.
Para fechar o festival só faltava mesmo a "Rave Party" dos Serrabulho, que fizeram exactamente aquilo que diz no rótulo! Festa ao máximo, com Zés Pereiras incluídos, invasões de palco, crfiaturas estranhas a dançar na plateia, etc etc etc...
Encerrado o festival fica uma palavra muito especial para a organização, que se esforçou ao máximo para cumprir horários, e que inclusivé inovou nesta edição do festival, com a colocação de chips nas pulseiras para controle de entradas e saídas, e compra de bebidas e seu posterior pagamento.
Texto e fotos: Vasco Rodrigues
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Agradecimentos: SWR