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Reportagem: Batushka e Gaerea @ RCA Club, Lisboa - 24/09/2018


O RCA Club estava lotado para ver os polacos Batushka levar a cabo o seu ritual, assim como os nossos estimados Gaerea a abrir as hostilidades.

3 anos após o lançamento do seu muitíssimo aclamado álbum de estreia, “Litourgiya”, a controversa banda polaca chega-nos a Portugal pela segunda vez pela “End of Litourgiya European Pilgrimage”, naquela que será provavelmente a última tour da banda em suporte do álbum antes de se confinar para preparar um novo lançamento. Esta data não foi no entanto menos marcante para os Gaerea, em promoção do seu álbum de estreia “Unsettling Whispers” que já conta também com ótimas críticas a nível internacional.

Entram os Gaerea com a sua, já habitual, ausência total de cor e positivismo. Apresentam-nos um set composto por faixa,s tanto do seu EP homónimo, como do “Unsettling Whispers” e é com uma faixa deste último que abrem a noite. Logo de início o vocalista traz-nos a sua característica teatralidade, tanto vocal como em termos de expressão corporal, muito genuína que é apenas equiparada à intensidade dos seus ásperos vocais tingidos de hardcore.

Se ao início se apresentaram um tanto quanto tímidos, quando entram para a terceira música os Gaerea já enchem o palco e mergulham a plateia na penumbra. Tocam “Whispers”, uma das faixas mais marcantes do novo álbum, fazendo o riff de entrada ressoar por toda a venue. A esquizofrenia do vocalista aumenta gradualmente com os murmúrios da sua desesperante misantropia e toda a banda, em sintonia, aumenta a intensidade. Segue-se a faixa “Void of Numbness”, que entra com o poderoso riff de Atmospheric Sludge (género que está muito presente no som dos Gaerea) e que é ainda mais imponente quando ouvido ao vivo. Esta faixa termina no clímax, com uma soberba execução do catártico solo de guitarra, há aqui que louvar a excelente mixagem e qualidade do som no set dos Gaerea.

Depois de mais duas faixas brilhantemente executadas e sem diminuir nunca a intensidade, o set dos portugueses é concluído, terminando muito pouco acima da marca da meia hora. Foi um espetáculo muito curto, ficámos a desejar mais, mas foi soberbo na sua execução, intenso e muito satisfatório.

Finalmente, depois de uma hora de espera temos os Batushka. A casa, que já estava bem preenchida para os Gaerea, enche agora totalmente mostrando o porquê dos bilhetes terem esgotado para ver a enigmática banda polaca.

Os membros entram, tapados nas suas belas e enigmáticas túnicas, lenta e misteriosamente à medida que tenebrosos cânticos ortodoxos vão soando no fundo enquanto um membro da banda, o vocalista, vai acendendo as imensas velas do ritual. Este começa depois a espalhar o incenso pela sala no momento em que um riff de introdução começa a tocar, excelente para pôr o público no espírito daquilo que os espera.

Quando a primeira faixa do “Litourgiya” começa a ressoar já a sala foi inundada pelo agradável cheiro do incenso e os membros estão envoltos numa misteriosa penumbra. E assim se seguem mais de 40 minutos de Black Metal de alta qualidade com a performance por inteiro do opus que é o “Litourgya”.

Desde caóticos e intensos momentos, como a entrada de rompante em blast beats da segunda faixa, a momentos mais austeros e ritualescos, como o caso da sexta faixa (marcha fúnebre desta críptica “missa”, que abre com os assombrosos cânticos ortodoxos em sintonia com o arrastado riff de Doom) todo o set foi executado com pura excelência. Tirando pequenos pormenores, como a dificuldade que por vezes se sentia a distinguir os cânticos corais por entre a barragem de som das guitarras (defeito causado pela natureza do som dos Batushka que é difícil de trazer a um palco) pudemos assistir a um set impecável.


Os guitarristas e o baixista efetuaram tudo com uma tremenda proficiência, encarando o público, de início ao fim, por trás das suas máscaras, contribuindo para o formalismo deste negro ritual e arrepiando qualquer fã com o gume afiado das melodias dos seus riffs. O baterista, invisível para a maioria da plateia, atrás do seu biombo, demonstrou-se uma tremenda máquina percursora, não falhando nas partes mais aceleradas nem nos tempos lentos em que é um elemento fulcral no enquadramento de toda a banda e para ampliar a densidade do som dos Batushka.
Quanto à gigante figura central que é o vocalista, este foi exímio na sua prestação vocal, com os seus rasgados gritos que inundavam o RCA que, ao contrastar com os graves e calmos cânticos das suas “rezas”, provocavam bizarros arrepios na plateia. Para além disto, foi também o vocalista a realizar todo o ritual e espetáculo de palco ao evocar o público com as suas mãos, público que se mostrou bastante participativo não só ao aclamar a banda como, na terceira música, ao bater palmas em sintonia com a percussão inicial. Contribuiu também para toda a estética na banda ao erguer velas debaixo do véu de nevoeiro que os cobria e, no início da última faixa, erguer uma bela moldura em que estava a peça que serve como capa ao álbum.

Esta foi certamente uma noite de excelência de Black Metal que ficará na memória de muitos fãs do género.

Texto por Filipe Mendes
Fotografias por Ana Carvalho
Agradecimentos: Amazing Events