Os Guns N’ Roses do século XXI têm sido considerados por muitos como “a banda de Axl Rose e companhia”. Ver, em simultâneo, os músicos Axl Rose, Slash e Duff McKagan em palco parecia uma miragem. Com a “Not In This Lifetime Tour”, estão a provar o contrário – e só esperamos que venham para ficar.
O espetáculo começou com os norte-americanos Tyler Bryant & the Shakedown, que há um ano atrás tiveram como missão, naquele mesmo espaço, aquecer para o concerto dos AC/DC. Em 2016 foram brindados com chuva, mas este ano entraram em palco com o sol ainda bastante visível. A banda de Nashville criou, de imediato, empatia com o público. Logo nos primeiros temas, uma imensidão de braços levantava-se para aplaudir a banda. “Come on, come on!”, entoava a plateia, aquando do tema “House On Fire”. Depois de meia hora de atuação, a banda despede-se dos portugueses com a promessa de que vão regressar ainda este ano. Cá estaremos para ver!
Mark Lanegan também esteve no nosso país há um ano, mas num ambiente completamente diferente (dois concertos intimistas no Theatro Circo, em Braga, e no Cinema São Jorge, em Lisboa). O músico é conhecido pela sua voz grave e por uma presença bastante forte em palco. Porém, depois da energia que Tyler Bryant & the Shakedown trouxeram, o ambiente esmoreceu. Decididamente, o ambiente intimista será o que mais favorece a sonoridade que Lanegan nos traz. E aproveitando o facto de ter lançado um álbum recentemente, “Gargoyle”, ficamos a aguardar novamente por uma data em nome próprio. Os seguidores de Lanegan merecem-no.
Com lotação esgotada, víamos um público bastante ansioso por colocar os olhos nos Guns N’ Roses. Miúdos e graúdos, portugueses e estrangeiros, bandanas e cabeleiras, imitando o cabelo de Axl nos seus tempos áureos…viu-se de tudo um pouco. O que é certo é que esta foi a primeira vez que as gerações mais novas tiveram a oportunidade de presenciar, quase na totalidade, a formação clássica da banda (faltando Izzy Stradlin e Steven Adler para completar a equação), 25 anos volvidos sobre a estreia da banda em Portugal, no Estádio José de Alvalade. Então, quem esteve presente nesta noite? Axl Rose, Slash e Duff McKagan foram as estrelas do espetáculo (não há forma de o evitar), mas não teria sido igual sem os restantes músicos, que foram, sem dúvida, cativantes: Dizzy Reed e Melissa Reese nas teclas/backing vocals, Richard Fortus na guitarra e Frank Ferrer na bateria.
Quando começamos a ouvir um dos famosos genéricos dos desenhos animados Looney Tunes, sabemos que o início está para breve. A banda entra em palco pelas 21h00, ao som do clássico “It’s So Easy”, e o público fica ao rubro. Imediatamente, surge a sensação de que um terço da plateia pega nos telemóveis para captar o momento em que a banda se apresenta ao público (algo que, felizmente, não durou muito tempo). O espaço torna-se pequeno para ver algo de tão grande dimensão, mesmo num recinto como o Passeio Marítimo: basta pensar que eram 57 000 espectadores a querer não apenas ouvir, mas também seguir cada passo dos músicos em palco. Como se não bastasse a sua presença, tivemos também direito pontualmente a pirotecnia, labaredas de fogo e efeitos visuais nos ecrãs gigantes (estes, por vezes, algo cheesy, que rapidamente nos transportavam para os fins da década de 80…e talvez fosse esse o objetivo!).
Depois de “It’s So Easy”, segue-se “Mr. Brownstone” (com aquele olhar malandro de Axl – recorde-se a temática desta faixa, o vício da heroína) e “Chinese Democracy” (tema-título do tão aguardado álbum, mas não tão apreciado). Segue-se “Welcome To The Jungle” e, sim, entrámos na selva. Assim que se ouvem os primeiros acordes deste tema, os pés levantam-se do chão e o público fica eufórico (não se esperava outra coisa, na realidade). Continuamos com “Double Talkin’ Jive”, e os espectadores a renderem-se a Slash, que continua igual a si mesmo: estilo despretensioso, cartola na cabeça, óculos escuros e cabelo que quase lhe tapa a cara por completo. O mais importante: sim, continua a tocar. Muito. Nos ecrãs gigantes podíamos ver as suas mãos a moverem-se com uma agilidade incrível. Axl, por outro lado, corria de um lado para o outro. É incrível como a sua voz não falha perante tanto movimento (e tantos anos passados). Já no ano passado, com os AC/DC, provou que ainda tinha cartas para dar. Axl também continua igual a si próprio. Não se limita a cantar – é fã do verdadeiro espetáculo. Sim, trocou de roupa muitas, muitas vezes. Também não se esperava outra coisa.
Segue-se “Better”, que surpreendeu pela positiva (principalmente com a voz de Melissa) e “Estranged”. Novamente, assim que começa “Live And Let Die” (tema composto pelo casal McCartney e tocado por Paul McCartney nos Wings), o público não descansa um segundo e canta em uníssono. No fundo, este tema também já pertence aos Guns N’ Roses. Depois de “Rocket Queen” e “You Could Be Mine”, Duff McKagan destacou-se ao interpretar “New Rose”, dos The Damned. Duff é mais discreto que os seus colegas, mas mostra-se tão seguro na música que nos apresenta. E foi dessa forma que acabou por prestar tributo a Prince (no seu baixo, tem um símbolo púrpura em homenagem ao cantor, que já anteriormente referiu como um ídolo) e a Lemmy Kilmister, dos Motörhead (era preciso dizer?), vestindo uma t-shirt com a sua imagem.
“This I Love” era, talvez, dispensável (perdão aos fãs mais acérrimos), “Civil War” foi bastante aplaudida e eis que surge mais uma homenagem: a banda toca “Black Hole Sun”, dos Soundgarden, sendo impossível não recordar o falecimento recente de Chris Cornell.
“Coma” foi bom, o solo de Slash foi óptimo. Tivemos direito a uma versão do tema “Speak Softly Love”, do filme O Padrinho, e “Sweet Child O’Mine” foi o que se esperava: mais um êxito da noite, ao qual se seguiu “Out Ta Get Me”. Seguiu-se um desfilar de emoções: primeiro, com a versão instrumental de “Wish You Were Here”, dos Pink Floyd; depois, a emblemática November Rain, que não podia deixar de ter Axl ao piano; “Knockin' on Heaven's Door”, de Bob Dylan (outro daqueles temas que também já não conseguimos dissociar dos Guns N’ Roses) e, por último, a brilhante “Nightrain”.
O encore trouxe-nos “Patience” (para muito agrado do público), “Whole Lotta Rosie”, dos AC/DC (parece que Axl tomou gosto pelos temas da banda australiana) e, por fim, a previsível (que, sim, tem de ser contemplada em todos os concertos!) Paradise City, que veio encerrar uma noite memorável. Oh…Sweet Guns’ Of Ours. Voltem, estão mais que perdoados!
Texto por Sara Delgado
Agradecimentos: Everything Is New