Depois de três longos meses a percorrer a Europa de uma ponta a outra (literalmente), os Eyehategod, conjunto muitas vezes mencionado como um dos “pais” do Sludge Metal, decidiu acabar a tour e festejar o dia da independência da sua nação, no nosso extremo ocidental da Europa, num concerto memorável, no RCA. A partilhar o palco com a lendária banda norte-americana estiveram os nacionais Crossed Fire e a Besta!
Fomos brindados com um início bruto, por parte da banda algarvia Crossed Fire que deu tudo o que tinha e o que não tinham para agradar ao público já minimamente presente no RCA. Logo aqui se pôde saborear um pouco da mítica vertente Southern da música pesada, com muito Groove e energia, invocada pelos pulos do vocalista David Rosa. A representar os temas do seu álbum de estreia “Life’s a Gamble”, a banda lusa teve uma presença de palco admirável e ainda contaram com a presença de Carlitos, o vocalista de Mindlock, para ajudar no tema “Drinking Club”. Infelizmente, as pessoas no RCA estavam a guardar-se para o ambiente mais sujo do que viria a seguir e tirando algumas almas que absorviam um pouco de toda aquela energia radiante que vinha de palco, a maior parte manteve-se inerte. Mas mesmo assim, os Crossed Fire nunca desistiram e tentaram puxar pelo público até ao final, o que é só mais uma coisa a louvar na fantástica performance do quinteto.
Depois disto………….era altura de soltar a BESTA! Este monstro já não tem nada a provar a ninguém, se é que alguma vez teve. O seu Black ‘n Roll com muito grind à mistura e cantado na língua mãe da sua proveniência, a Besta deixou logo a sua enorme pegada no seio dos amantes da música pesada nacional e continua a deixar, proliferando a sua descendência com bastante rapidez e afinco. Com essa discografia cada vez mais desumana no pouco espaço de tempo em que a Besta respira, os seus concertos estão sempre a ser alimentados com temas quentinhos do fundo infernal da sua sonoridade. Com já a sua presença sarcástica e raivosa habitual, a besta mostrou a garra e rasgou entre os seus temas, como por exemplo “Império do ódio”, “Profunda Heresia” ou “Misantropo”. No entanto, sentiu-se exactamente o mesmo estado de incompreensível inércia do público, embora em menor escala, que na actuação de Crossed Fire. A Besta despediu-se dos aplausos das vivas almas que estavam a devorar a sua carne e depois, veio a decadência.
Muita gente sabe que os EyeHateGod são um espelho da decadente sujidade tanto sonora como lírica do seu trabalho e nunca o tentaram esconder, mas antes partilhá-lo com quem a consome diariamente e com os fãs que partilham a sua vivência atribulada e auto-destrutiva. Mas essa vida paga-se e bem, espelho disso era a total alienação narcótica de um esquelético Mike Williams que mal se aguentava em pé, tendo apenas como suporte o microfone e a raiva de querer soltar cá para fora o que o come por dentro. Também Jimmy Bower não foge aos anos e à sobrecarga de uma intensa maratona europeia de 3 meses, estando sempre parado no seu cantinho. E aqui se nota o profissionalismo de uma banda que com uma presença desgastada e alterada não pecou na actuação, nem em termos técnicos, nem em termos de interação com o público. Depois de um começo bem acelerado com “Agitation! Propaganda!”, o tema de abertura, Mike dirigiu-se ao público luso com um “gracias!” bem apupado, virado gargalhada com a fantástica resposta do vocalista: “I don’t fucking know man, I’m na American”…..priceless! Entre as coisas aleatórias que o moribundo Mike ia balbuciando entre temas, desfilaram pérolas como “30$ Bag”, “Take as Needed for Pain”, “White Nigger” ou “Nobody Told Me”. Foi um concerto atípico e muito menos rasgado que a actuação no Milhões de Festa há um par de anos, mas foi muito mais sentida e intimista pela presença mais assídua dos seus fãs, que ainda agradeceram a banda norte-americana com um belo mosh pit à frente do palco, durante a maior parte das quase duas horas de concerto.
Texto por Bruno Farinha
Fotografias por Igor Ferreira
Agradecimentos: Amazing Events