Certas críticas deviam começar pela informação, tal é necessário para localizar o leitor. Neste caso a introdução passa por uma declaração de “interesses”, ou melhor, um nome: Jim Martin. Ele foi o lado “Metal” no período mais criativo dos Faith No More e sem ele a reunião não está completa. Com ele, provavelmente ela não chegaria a acontecer.
Após o sucesso do tema “We Care A Lot”, e depois de uma troca de vocalistas, os californianos lançaram, em 1989, um daqueles discos que abala fundações musicais: “The Real Thing”. Com ele iniciam a forma de ver o Heavy Metal, antecipam a vaga de Seattle, lideram uma vaga de grupos californianos “alternativos” como Red Hot Chilli Pepers ou Offspring e, para alguns, antecipam o Nu Metal. Em 1992, com “Angel Dust” consolidam a posição. A partir daí a desagregação inicia-se, ao ritmo que o seu som começa a popularizar-se fora das fronteiras do Metal. Na digressão deste disco, o grupo entra em Alvalade pelo próprio pé e no palco inicia uma batalha épica de relva e garrafas de água e urina, para grande irritação de um Axl Rose a quem só resta escorregar no palco molhado.
Ainda sobra espaço para três discos, mas a qualidade vai desvanecendo-se. Mike Bordin, é reconhecido como um dos melhores da sua geração e ingressa na banda de Ozzy Osbourne, enquanto esse fabuloso crooner que é Mike Patton se desdobra em projectos musicais. Em Portugal pudemos ver todos e houve-os para todos os gostos. Ainda hoje ele é um dos mais versáteis vocalistas vivos. Cerca de uma década após o seu final, o colectivo ensaia o regresso e é curioso ver como a sua presença na Zambujeira – sim, noutros tempos havia música para essa zona – chama toda uma geração que os cultua. Quem anda nisto sabe, que o disco não iria demorar, por muitas resistências que existissem. E ele aí está, eventualmente preparado para disco do ano, desejado por muitos e embrulhadinho para agradar aos que cultuam o sebastianismo musical. Admito só ter adquirido a curiosidade depois de me aperceber do histerismo de alguma imprensa, e a primeira impressão passa pela voz, pelas letras. É um disco para Patton passear no palco, ar casual, a mostrar a sua voz. Uma segunda e terceira audições permitem perceber que Bordin também lá está e, claro, os arranjos de Roddy Bottum permanecem subjacentes a tudo, mantendo a coisa audível – quem conhece Patton sabe da sua veia para tornar inaudível qualquer ideia brilhante que possua. Pega-se de novo no disco e percebe-se que o intro é uma boa forma de revelar as estrelas da companhia: Patton, primeiro, e Bordin. Voz e bateria recebem-nos em “Sol Invictus”, um misto de primeiro tema e intro. Do outro lado, temos uma canção pop nostálgica, com um título que só pode fazer sorrir: “From The Dead” funciona como outro, com direito a coros que soam a despedida de festas de Verão. Entre estas composições, desfilam oito temas, oito pérolas, em que letras e vocais revelam o melhor de Faith No More. “Superhero” é o primeiro exemplo, começando com vocais guturais e um andamento de bateria simples, seguidos de um coro tão catchy quanto melódico e recheado de teclados (uma das marcas registadas do grupo), depois vem um crescendo rítmico e está pronta uma melodia para um qualquer festival de Verão que tanto serve para o mosh nas filas da frente como para cantarolar enquanto se enrola um charro nas filas de trás. Para recuperar o fôlego, o crooner Patton descola a pseudo balada “Sunny Side Up”, mas dura pouco pois bastam alguns versos para regressar a raiva, num tema perfeitamente bipolar. “Seperation Anxiety” traz Patton a relembrar a sua experiência de scatting enquanto ripa o clima de alguns temas de Massive Attack. A meio imaginamos no senhor a pegar num megafone… tudo para um tema memorável ao vivo. O tema menos memorável será “Cone Of Shame” , com a sua entrada de guitarra muito desert rock. Jim Martin? Podiam trazer o senhor? “Rise Of The Fall” é Pop com toada reggae, percebe-se que este disco é para ir a todos, agradar a muitos e fazer dele o disco do ano. Outros discos virão e tem de se guardar temas. “Black Friday” continua assim: boa q.b. e siga para a próxima. E quando se olha para o temporizador a ver o que falta, aparece um tema soturno, um instrumental dark e aquela voz que ordena “Get The Motherfucker On The Phone”/The Phone”! Mortal! Clássico! “Matador” já nos encontra de rastos, mas ainda chega a tempo de manter a média alta. Bem alta. Disco do ano? Não me apressaria, porque os Clutch ainda possuem uma palavra a dizer e porque é um disco mais Pop que Metal, mas isso já os FNM são há algum tempo… Enquanto o Jim Martin não chegar!
Nota: 9/10
Review por Emanuel Ferreira