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Reportagem: Alcest + Les Discrets + Soror Dolorosa @ Hard Club, Porto | 14/02/2012

Numa noite especial - quer pela data em si, quer pelo simples facto de ser noite de música -, o Porto recebeu, no Hard Club, a excelência da nova vaga do shoegaze. Este género musical esteve em voga no final dos 80's e início dos 90's, mas foi um fogo facilmente apagado pelo verdadeiro mainstream e, até, pelo fortíssimo movimento grunge. Se o estilo apareceu graças a bandas como My Bloody Valentine, Slowdive ou The Jesus And Mary Chain, podemos também agradecer o seu ressurgimento através de bandas como A Place To Bury Strangers ou Alcest, ambas numa vertente, digamos, mais moderna. Soror Dolorosa, Les Discrets e Alcest deram forma a mais um evento organizado pela SWR-inc que, além de continuarem a não mostrar falhas enquanto organizadores, continuam de igual forma a praticar bons preços numa época de crise.

Apesar da introdução relativa ao shoegaze, os espectáculos que se iriam seguir foram abertos através de uma outra roupagem musical: post-punk/gothrock. Estilos esses, claro está, relacionados com os openers Soror Dolorosa. Apesar da sua já longa carreira, uma vez que a banda foi fundada em 2001, os Soror Dolorosa contam apenas, na sua discografia, com o EP "Severance" (2009) e o longa-duração "Blind Scenes" (2011). Foi assim constituído o concerto destes franceses, com pontos altos nos temas "Autumn Wounds" e "Low End", possivelmente por serem as suas músicas mais conhecidas. Sem querer desfazer o talento da banda, é um grupo que rapidamente mostra a sua sonoridade e o público só tem duas saídas básicas e imediatas: ou se gosta ou não se gosta. Podem não trazer nada de novo, mas têm o poder de relembrar o movimento goth dos finais da década de 80 ou de praticar o revivalismo ao "ressuscitar", na nossa mente, bandas como Fields Of The Nephilim pela altura do álbum "The Nephilim", muito por força do guitarrista. Sem querer roçar o cliché, mas obrigado a passar por isso, numa banda como esta espera-nos um frontman teatral e excitante na forma como encara cada palavra cantada ou na forma como encara os seus movimentos em palco. Posso concluir que foi uma prestação bem conseguida e creio que, para quem gosta do estilo musical apresentado pelos Soror Dolorsa, ninguém saiu de todo desapontado.


Seguiram-se os Les Discrets, uma banda pela qual criei grandes expectativas pela simples razão de, na sua discografia, terem dois discos contagiantes: "Septembre Et Ses Dernières Pensées" (2010) e o novíssimo "Ariettes Oubliées..." (2012). Les Discrets são uma banda super ligada a Alcest, tanto pela editora - a Prophecy Productions - como pela própria formação em palco: Fursy Teyssier (guitarra/voz), Neige (baixo), Zero (guitarra/voz) e Winterhalter (bateria). Para os conhecedores, ou para os que não presenciaram o concerto, facilmente se percebe que os últimos três elementos referidos pertecem a Alcest (sendo que Zero é um live-member). Confesso sem rodeios que esperava mais de Teyssier na sua prestação vocal - talvez os ecos tivessem feito realmente falta ou, então, o senhor só se safa mesmo em estúdio. Nota-se claramente que o seu tom vocal ao vivo é bem mais baixo do que nos discos e o contraste com Zero é extremo. No entanto, nada disto mancha a performance desta banda de eleição para quem está integrado na ambiência actual do shoegaze. O concerto foi alternado entre os dois álbuns até agora lançados e ao vivo nota-se que as novas músicas não são tão negras como as anteriores de 2010, pois a aproximação ao shoegaze mais clássico é evidente. Apesar de o concerto não estar tão envolto em neblinas de som como estão os discos, a chamada wall of sound foi atingida num ou noutro momento distinto. Não direi que conseguirão tão cedo regressar a Portugal em nome próprio, mas pelos aplausos finais, acredito que o público ficou rendido a esta banda francesa. Conselho pessoal: ouçam os álbuns.


Como pré-definido, por volta da meia noite, os Alcest subiram palco e, mesmo que Neige já tenha sido visto anteriormente perto da mesa de som ou mesmo a actuar com Les Discrets, o êxtase foi geral! Como seria de imaginar, o concerto - que viria a tornar-se belíssimo - foi iniciado com o single "Autre Temps", seguido por "Là où Naissent Les Couleurs Nouvelles", dois temas que fazem parte do novo álbum "Les Voyages de l'Âme". Todos discos da banda foram relembrados, mas talvez destaque momentos como "Écailles de Lune (Part I)", "Sur L’Océan Couleur de Fer" - onde Neige fez questão de dizer que o dito tema era raramente executado - ou a, pessoalmente favorita, "Percées de Lumière". Os 90 minutos de concerto foram efusivamente encerrados com um encore constituído pelo passado personificado no tema "Souvenirs d'Un Autre Monde" e pelo presente através do tema "Summer’s Glory", que fecha com chave de ouro o novo trabalho de Alcest.
Neige está indubitavelmente a fugir dos growls e atrevo-me a dizer que a sua voz limpa está numa forma exemplar que se encaminhou suavemente até aos ouvidos do público que tão bem compôs a sala 2 do Hard Club. Zero é a continuação e a parte ainda mais melódica de Neige, tanto na voz como na própria guitarra. Notou-se por diversas vezes que Alcest estava em plena sintonia com o público e vice-versa, arrisco até a dizer que Neige estava feliz por estar a dar aquele concerto. Duvido que alguém tenha saído daquela sala com o mesmo estado de espírito com que tinha entrado pelas 22h. Dito por outras palavras, e focando a sensibilidade dos mais diversos presentes, creio que a visão perante a música e talvez perante o mundo se tenha modificado naqueles 90 minutos de exímia e envolvente perfeição sonora. Todo o mundo exterior foi esquecido e apenas existiu Alcest. Serão sempre bem-vindos.

Para visualizar mais fotografias do evento, clicar aqui.


Texto por Diogo Ferreira
Fotografia por Liliana Pinho

Agradecimentos: SWR Inc.